Zona Curva

Search Results for: 50 anos do golpe militar

Here are the search results for your search.

50 anos do golpe militar: Instituto Moreira Salles revive o clima cultural de 64

O Instituto Moreira Salles (IMS) do Rio de Janeiro dedica boa parte de sua programação deste ano a eventos relacionados ao clima cultural de 1964, ano do golpe militar, que completa 50 anos no próximo mês. O projeto denominado Em 1964 conta com uma exposição que faz o visitante reviver o momento do golpe militar de 1964. Com base em seu extenso arquivo fotográfico e documental, o instituto criou um site especialmente para o evento, acesse! Imagens, textos e crônicas, trechos de filmes, depoimentos da época, entre outros, e mais material produzido hoje completarão a experiência numa espécie de túnel do tempo para o ano do golpe. Leia mais sobre os 50 anos do golpe militar Em 1964 propõe uma imersão neste momento decisivo para o país a partir do ponto de vista de artistas e intelectuais cujos acervos estão sob a guarda do IMS ou que têm vínculos diretos com suas atividades. O instituto irá organizar outros shows ao longo do ano (um deles dedicado à obra de Baden Powell), além de debates e encontros. Como parte do evento, o instituto pretende lançar em março o DVD do filme Cabra Marcado Para Morrer, de Eduardo Coutinho (1933-2014), com material inédito produzido pelo documentarista nos últimos anos. Serviço Em 1964 Instituto Moreira Salles (Rua Marquês de São Vicente, 476, Gávea). Entrada franca. Visitação de terça a domingo, das 11h às 20h. Até novembro de 2014.

Dois toques sobre a eleição no Brasil

Eleições 2022 – Antes da eleição eu estava sentada lá no Elias, comendo um pastel. Sentou ao meu lado um homem e logo puxou conversa perguntando em quem eu iria votar. Não era um homem sem cultura formal, era um brasileiro médio, pequeno empresário e bem articulado. Respondi que não sabia ainda, para dar corda. Ele então começou a falar sobre as propostas da “esquerda”. Uma delas era que o Lula, se eleito, iria transformar os banheiros das escolas em banheiros conjuntos, meninos e meninas junto. E que aquilo era um absurdo. Também que nas escolas iriam ensinar como ser gay e puta, estragando a família brasileira. Disse ainda que as vacinas que as pessoas tinham tomado eram feitas de placenta humana e que causavam câncer em massa. Que o Bolsonaro estava certo em não querer que a população se vacinasse, que ele salvou vidas. Falou da ministra Damares e no quanto ela estava trabalhando para proteger as meninas de tanto pecado. Sobrou até para o Papa Francisco, que, segundo o cara, era um pedófilo convicto e que, unido com a esquerda, iria perverter todas as crianças. Disse ainda que o comunismo era a coisa mais horrível do mundo, embora não conseguisse me explicar em que exatamente consistia. O que ele sabia era que destruía a família. Por isso a necessidade de escolas militares. Além disso, falou do quanto o Lula era ladrão e do tanto que tinha roubado o país. Por isso era fundamental que a população estivesse armada, para se proteger da violência e dos ladrões. Também afirmou convicto que as queimadas na Amazônia e no Pantanal tinham sido provocadas por esquerdistas aliados ao Leonardo DiCaprio, para manchar o nome de Bolsonaro. Por fim, para salvar a família, só mesmo o Bolsonaro. Estas são algumas das verdades que estão firmes na cabeça de um número expressivo de brasileiros. São ideias que cruzam o éter nos grupos de família, de amigos, na igreja, nas conversas de bar. O comunismo é do diabo, torna as pessoas marginais e por isso é preciso acabar com essa ideologia satânica. Se precisar, para dar fim no comunismo é preciso acabar fisicamente com os comunistas. Eles são a maçã podre que está enfraquecendo a nação e a família. Eles são monstros que realizam sacrifícios humanos para se manter no poder no mundo. Tudo o que dá errado no país é culpa deles. Eles causam os problemas para incriminar Bolsonaro. Por isso a cruzada do presidente e de sua religiosa esposa. Eliminar os comunistas é salvar a nação. E as pessoas falam isso sem qualquer pejo. Porque para elas matar um comunista não é crime, é ajudar na missão de deus para criar um país seguro para seus filhos. Por isso acreditam na ideia de que os militares, quando deram o golpe em 1964, estavam corretíssimos em perseguir, torturar e matar os comunistas. Porque eles são a causa de todo o mal. Esse tipo de discursos não está apenas no âmbito das pessoas mais simples e religiosas. Ele circula velozmente mesmo entre os letrados. Tem se transformado numa espécie de monstro que carrega todo mal do mundo. E não adianta querer argumentar, trazer elementos da história. Não. É crença. Não está no campo da razão. Qualquer tentativa de debate é rechaçada com um olhar estranho de reconhecimento: ela é o diabo. Já ouvi isso até mesmo de pessoas da família, pessoas muito próximas. E esse reconhecimento implica em uma ação imediata de rechaço e de necessidade de eliminação. Assim que não adianta trazer números sobre o quanto a ditadura matou e torturou. Para essa gente, os milicos fizeram o que tinham de fazer e, se precisar, eles mesmos o fazem agora. Tudo para salvar a família. Não há argumento que penetre esse muro criado pela fé cega. É nesse mundo que estamos agora. E, de certa forma, perdidos. Porque o que se vê no campo da esquerda é uma incapacidade teórica e prática de atuar nesse universo. Primeiro que há uma negação sobre esse discurso e uma desqualificação das pessoas que o disseminam. Não sei se é o caminho. A política está atravessada pela moral, sempre esteve de algum modo quando definimos o que é bom ou o que é ruim. Mas, agora, nesses tempos, a moral se sobrepõe porque a política – tal como aparece – tem se mostrado incapaz de dar respostas aos problemas cotidianos. Geralmente quem tem feito isso – dar respostas e caminhos – é a igreja. As neopentecostais estão em cada esquina, como as farmácias. E elas são espaços onde as pessoas se sentem seguras para sonhar com a resolução dos problemas. Então, entregar a vida nas mãos de deus parece ser o mais seguro. E quem é o homem de deus? Bolsonaro. Então, quem está com ele, está com deus. Por isso, um completo desconhecido, com uma arma na mão, pode virar o senador eleito de um estado, como aconteceu em Santa Catarina, porque ele é um soldado de deus para acabar com os bandidos e defender a família. Esse é o mantra. “Deus no controle”, e não um deus qualquer, mas um deus vingador, sedento de sangue. E os comunistas é que são os satânicos. Ah, mas claro. Eles estão a serviço do diabo. Por isso devem ser eliminados. Simples assim. Elementos da realidade do governo de Bolsonaro tais como a compra de imóveis de luxo com dinheiro vivo, corte de 92% da verba para Ciência e Tecnologia, aumento dos salários do presidente, do vice e dos generais em 69%, mais de trinta bilhões de orçamento secreto, cinco bilhões para o Fundão eleitoral, cinco milhões para os desfiles de moto, pior Índice de Desenvolvimento Humano (IDH), desvio de verbas de combate à Covid, retirada de recursos das Universidades, fim de direitos trabalhistas, invasão das terras indígenas, e outros tantos, não são considerados. Isso não é considerado problema pela maioria da população. E é nesse ritmo que a realidade perde força diante da fé. Se os preços dos

A terceira etapa do nazi-fascismo no Brasil não poderá ser derrotada somente nas urnas

O recente surto de crimes de apologia ao nazi-fascismo por parte do governo Bolsonaro e seguidores, a existência de células neonazistas, o crescimento do discurso de ódio e da intolerância através do “comitê do ódio do Planalto”, o crescimento de milícias armadas com participação de policiais e até mesmo de militares, o massacre de negros e pobres de periferias, todos estes fatos têm uma relação direta com a existência e as práticas que antecederam o surgimento do Nazismo Alemão e até mesmo dos Partidos Nazista e Fascistas no Brasil do século passado e nos anos pós-ditadura militar de 1964. A primeira etapa O partido de Hitler no Brasil chegou a ser o maior Partido Nazista fora da Alemanha! Foi fundado em Santa Catarina, na cidade de Timbó, em julho de 1928, sendo o primeiro Partido Nazista a ser reconhecido pelas lideranças do partido em Munique, que já haviam realizado a fracassada tentativa de golpe de estado de 1925. E o Partido Nazista aqui formado se expandiu enormemente e por todo nosso país. Chegou a se estabelecer em 17 Estados, contando com mais de 100 células formadas exclusivamente por alemães. Frise-se que por ordem expressa do Partido Alemão e, posteriormente, do governo nazista da Alemanha, só era permitida a inscrição de alemães natos, excluindo até mesmo descendentes nascidos aqui. E nas décadas de 1930 e 1940, ademais dos membros partidários de origem germânica, os simpatizantes do nazismo espalharam-se por todo o Brasil! Fotos de alemães e simpatizantes brasileiros ostentando a suástica em bandeiras e faixas, reportagens racistas sobre o “perigo judeu” e a respeito das maravilhas dos “campos de trabalhos forçados” estabelecidos nos países invadidos, como Auschwitz na Polônia, constituem provas incontestes. O jornal nazista “Deutscher Morgen” (“Aurora Alemã”) se encarregou de apregoar por todos os cantos a exclusão de raças “inferiores” e grupos sociais como judeus, ciganos, homossexuais, comunistas e portadores de deficiência. Grande parte da repulsa do Partido Nazista se direcionava também a negros e miscigenados, que compunham nossa própria identidade nacional. O sucesso do partido em solo brasileiro ocorreu justamente por conta do pensamento racista da elite e da classe média, herança do escravagismo. A vinda de europeus da Itália e Alemanha fora incentivada, desde meados do século XIX, não só para fornecer mão-de-obra barata na agricultura, mas também como uma forma de “branquear” a identidade brasileira. Textos eugenistas apareciam não somente em publicações ligadas ao Partido Nazista, mas também na quase totalidade da imprensa brasileira dependente da publicidade estatal. De todo modo, a nomeação de Hans Heinnig von Cossel como chefe do Partido Nazista no Brasil, em 1934, aumentou a adesão dos entusiastas da cruz gamada. Sua estratégia era conseguir unir toda a colônia alemã em torno do hitlerismo, evitando manifestações sobre questões políticas brasileiras. Afinal, o nazismo já contava com inúmeros simpatizantes no próprio governo e na posterior ditadura Vargas, assim como em nossas Forças Armadas. Surge um irmão ideológico. Na década de 1930, outro movimento estava em crescimento no país, especialmente nas regiões sul e sudeste. Fortemente inspirado pelo fascismo italiano, o jornalista paulista Plínio Salgado fundou a Ação Integralista Brasileira, organização política que compartilhava os mesmos preceitos do nazi-fascismo: nacionalismo, antissemitismo, racismo e combate ao comunismo e ao liberalismo. “Sim, podemos dizer que são nossos irmãos fascistas”, dizia Cossel. Na década de 1930 e princípios da de 1940, os governos de Brasil e Alemanha eram mais que amigos. Até a entrada forçada na Segunda Guerra Mundial em 1942, ao lado dos Aliados, o Brasil manteve boas relações com a Alemanha. Consequentemente, a existência do Partido Nazista em solo brasileiro foi não apenas tolerada, mas muito bem-vista, inclusive por Getúlio Vargas. “Até 1938, o partido não era proibido no país.  O próprio Vargas, ao se corresponder oficialmente com Hitler em novembro de 1937 por conta da troca de embaixadores, chamou o ditador alemão de “grande bom amigo” e afirmou esperar um estreitamento de relações. O filho de Getúlio, Lutero Vargas, casou-se com a artista plástica alemã nazista Ingeborg ten Haeff, simbolizando o relacionamento estreito entre os países. As polícias secretas do Brasil e Gestapo da Alemanha estabeleceram vínculos de cooperação fortíssimos, o que incluiu treinamento de policiais brasileiros pelas SS nazistas. A preterida expansão do imperialismo da Alemanha em países subdesenvolvidos como o Brasil tornava-se mais do que evidente. Foram realizadas expedições nazistas à Amazônia para coletar informações sobre a fauna, flora e cultura indígenas da região, pois um dos objetivos do governo alemão era implantar colônias estratégicas na região. No entanto, quando o Brasil é forçado pelos Estados Unidos a entrar na Segunda Guerra Mundial, empresas alemãs foram fechadas, bancos alemães pediram liquidação e lojas alemãs foram saqueadas. Em resposta às proibições e hostilidades, parte da comunidade alemã-nazista deixou o Brasil e foi repatriada, recebendo até mesmo compensações financeiras do III Reich. E desta forma, o primeiro surto nazi-fascista foi rompido em nosso país.   O nazi fascismo estrutural, numa segunda etapa, foi uma das bases da Ditadura Militar de 1964 O Brasil se tornou o lugar de refúgio de diversos criminosos nazistas, que sempre buscaram refúgio em grupelhos nazi-fascistas do interior de São Paulo ( Atibaia, por exemplo) e Santa Catarina. Entretanto, somente após a redemocratização, em 1988, o neonazismo tentou se reestruturar no Brasil através do Partido Nacional Socialista Brasileiro (PNSB), fundado por Armando Zanine Júnior, em 1988. A Justiça Eleitoral não o aprovou, afinal, nosso país vivia uma efervescência política de liberdade e reconstrução pós-ditadura militar. Na busca por alguma relevância política, o PNSB se aproximou publicamente do seu “irmão” ideológico, o movimento integralista representado pela Ação Integralista Brasileira. Nas eleições de 1994, Zanine declarou apoio a Éneas Carneiro, do PRONA, mas Carneiro, democrata, rejeitou publicamente o apoio. “Não me alio a nazistas e fascistas”, disse. E o segundo surto da peste se auto-afogou.   O terceiro surto nazifascista, o Bolsonarismo O Brasil vive hoje uma escalada no aumento do número de células neonazistas, explosão de discursos que exaltam a ideologia de ultradireita nos meios digitais, um desrespeito crescente aos

Filme Marighella mobiliza a esquerda na volta do cinema

Marighella – Nesta quinta  (dia 4 de novembro) estreia o aguardado filme Marighella, dirigido por Wagner Moura. O filme autobiográfico do inimigo número 1 da ditadura militar, apesar de ter sido aplaudido em pé no festival de cinema de Berlim em fevereiro de 2019, foi censurado pela Ancine (sua estreia foi cancelada pela agência em setembro de 2019 pela recusa da verba que possibilitaria a distribuição do longa), e assim penou uma via-crúcis de dois anos até sua exibição nas telonas brasileiras. O filme já foi exibido inúmeras vezes em festivais de cinema nas cidades de Berlim, Seattle, Hong Kong, Sydney, Santiago, Havana, Istambul, Atenas, Estocolmo e Cairo. A previsão da segunda data estreia ficou para novembro de 2019, mas segundo a Ancine, a produção do longa não cumpriu a tempo os trâmites para a liberação da verba que já havia sido usada e precisava ser ressarcida.  A estreia então foi adiada para maio de 2020, e depois para abril deste ano, por conta da pandemia. Já em agosto deste ano, o setor de análise técnica do órgão federal, encaminhou o lançamento comercial de Marighella para arquivamento. Em ritmo frenético de lançamento, Wagner Moura tem sido entrevistado por vários veículos de comunicação. Em duas entrevistas, tanto no Roda Viva, da TV Cultura, na última segunda, e no podcast Lado B do Rio, ele afirmou que o governo federal se utilizou de trâmites burocráticos para censurar o filme.  Inspirado na obra “Marighella: O guerrilheiro que incendiou o mundo” do jornalista Mário Magalhães, o filme traz a história de Carlos Marighella (interpretado por Seu Jorge) entre o início do período da ditadura até sua morte em novembro de 1969. Em entrevista ao Brasil de Fato , Moura conta que quis trazer o momento em que o militante decide entrar na luta armada. O guerrilheiro ingressou no movimento estudantil aos 23 anos na Escola Politécnica da Bahia. Em 1937, foi preso e torturado por fazer oposição a Getúlio Vargas e depois de atuar por pouco tempo na clandestinidade, foi preso novamente, mas agora por seis anos.  Com o fim do Estado Novo em 1945, foi anistiado e, no mesmo ano, eleito deputado federal pelo PCB. O clima polarizado da guerra fria colocou o partido comunista na ilegalidade e Marighella perdeu seu mandato, voltando assim para a clandestinidade. Mas em 1967, após três anos do golpe militar, o baiano resolveu romper com o PCB, que não concordava com a luta armada, e fundou a Ação Libertadora Nacional (ALN). Antes da escolha de Seu Jorge para interpretar Marighella, o cantor Mano Brown foi o primeiro cotado para o papel, o que não aconteceu pela agenda atribulada de shows dos Racionais MC’s,  banda de Brown. Participam do filme também atores como Bruno Gagliasso como o delegado Lúcio, Luiz Carlos Vasconcellos dando vida ao militante Almir, Herson Capri interpretando o jornalista Jorge Salles, Adriana Esteves como Carla e a neta de Carlos e vereadora em Salvador Maria Marighella (entrevistada pelo Zonacurva). A ANL foi inspirada na vitoriosa revolução cubana e na guerrilha anticolonial que lutou pela independência argelina, explica Magalhães em live no canal Tutaméia . O grupo rompeu com a hierarquia vertical e tradicional dos demais grupos militantes. Um exemplo disso foi o sequestro do embaixador americano Charles Elbrick, em que os membros da ANL não avisaram Marighella da ação. Essa estrutura horizontal inspira até hoje movimentos atuais como o Passe Livre. https://urutaurpg.com.br/siteluis/acao-mais-ousada-contra-o-regime-militar/ Em entrevista ao Brasil de fato, Moura conta que Marighella tentou não entrar na luta armada, o militante foi congressista enquanto põde, esteve no PCB durante anos, mas para ele a resposta para mudar a realidade do Brasil naquele momento era a Aliança  Libertadora Nacional.  E completa que o filme vem para disputar narrativa com o governo, a história de que ditadura militar foi uma “revolução” não pode ser aceita e o longa vem para mostrar a realidade da época.  Já Magalhães comentou na live no canal Tutaméia que, a identidade de Bolsonaro com a ditadura militar não é da boca para fora ,e tem consequências concretas para o país. O revisionismo histórico do presidente enfraquece a memória e a luta de pessoas que deram suas vidas pela democracia. Além disso, confunde algumas pessoas quando propaga que apenas “bandidos” foram mortos durante o regime.  Apesar da censura que sofreu, o diretor alertou em entrevista ao Canal Brasil do perigo da autocensura nesse período tão sombrio para a cultura brasileira, pois é isso é exatamente o que o governo deseja. Segundo Moura, a arte é uma das formas de resistência ao governo brasileiro. Ainda para o Brasil de Fato, o diretor contou que as produtoras ficaram receosas com o longa já no início na produção e que ele sabia que não seria fácil, ”é um filme do petralha falando de terrorista”, brinca. Ele completa que o período em que o país vive influencia na percepção do público e que esse aspecto é primordial para a obra. Em meio a tudo que o filme já passou mesmo sem ainda ter sido lançado, Moura diz estar “preparado para a porrada” e que sabe que sofrerá ataques após todos assistirem ao longa e relata que o set de filmagem sofreu ameaça de invasão.  O primeiro pedido de liberação feito à Ancine em setembro de 2019, veio após o discurso de Jair Bolsonaro em julho do mesmo ano em que o presidente transferiu o Conselho Superior de Cinema da pasta do Ministério da Cidadania para a Casa Civil. Nesta data, Bolsonaro alegou que o financiamento federal para filmes não poderia ser destinado para filmes de “ativismo” ou como o da “Bruna Surfistinha”. Mas o diretor do filme admitiu para o Brasil de Fato que não tem medo dos “trolls” da internet, e nem das possíveis ameaças.  A estreia do filme será em mais de 300 salas de cinema em todo o Brasil no dia 4 de novembro, no 52° aniversário de morte do militante. Na semana passada, algumas capitais já contaram com a pré-estreia do longa, começando pela

Haiti, esse desconhecido

A notícia do assassinato do presidente do Haiti, Jovenel Moïse, levantou uma série de dúvidas por parte dos brasileiros. Quem era esse presidente? Era de esquerda? O que houve foi um golpe? Vamos apontar aqui alguns elementos para tentar compreender o que se passa no Haiti. Primeiro sempre é bom lembrar que o Haiti foi a primeira nação negra da história nessa região de Abya Yala (as três Américas), conquistada dos invasores franceses em 1804. Esse feito foi protagonizado por uma revolução dos negros escravizados que viviam na ilha, sob a liderança de Toussaint Loverture e Jean Jacques Dessalines. Os haitianos colocaram para correr o exército de Napoleão, então considerado imbatível, uma humilhação para  os franceses. Naqueles dias, o país também ficou sob a mira dos Estados Unidos que o via como um câncer na região, tanto que a partir de 1804 foi decretado um bloqueio comercial contra a ilha, que durou 60 anos. Ou seja, essa já é uma prática velha por parte dos EUA. Depois da vitoriosa revolução, o Haiti foi um dos países mais importantes da região do Caribe, e tanto que em 1815 o então presidente Alexandre Petion recebeu Simón Bolivar e deu a ele os barcos, homens e armas que iriam garantir o retorno de Bolívar à Venezuela para a vitória da independência de quase toda a América do Sul. Sua condição era de que, libertada a América, Bolívar libertasse os escravizados. Sem o Haiti, toda a história teria sido outra. Desde aí o Haiti virou um inimigo a ser combatido pelos países dominantes. E, em 1825, o então presidente Jean-Pierre Boyer se rendeu a uma imposição da França que exigia pagamento como indenização aos ex-colonos mortos ou expulsos pela revolução. Com medo de ser invadido, Boyer assinou o documento que deu início à cobrança de uma dívida exorbitante, na verdade, nunca quitada, visto que somava juros sobre juros. Boyer defraudava a luta dos haitianos e vem daí a gênese da pobreza estrutural do país. Depois dessa capitulação, a vida dos haitianos nunca mais foi a a mesma, com a sucessão de governos títeres, até que. em 1915. os Estados Unidos invadiram o país sob o pretexto de preservar os seus interesses. Essa tutela se estendeu por anos até que chegou a ditadura dos Duvallier, pai e filho, que mergulhou o país em violência e terror. Importante registrar que essas ditaduras foram apoiadas pelos EUA. Em 1990, um padre, ligado à teologia da libertação, Jean Bertrand Aristide, é eleito presidente, prometendo colocar fim no tempo de turbulência, mas não conseguiu. Foi deposto por um golpe e procurou ajuda dos Estados Unidos. Depois de vários acordos, ele retorna sob a proteção dos marines. Outros governos passam e, em 2000, quando há nova eleição, Jean Aristide vence, mas começam a denunciar que a vitória foi fraude. A crise se aprofundou e, em 2004,  Aristide é deposto e sequestrado do Haiti por militares estadunidenses. O padre já não era mais considerado um bom aliado pelos EUA. E foi aí que começou mais uma invasão ao país, desta vez sob o manto das “tropas de paz”, inclusive comandadas pelo Brasil. A população do Haiti iria mais uma vez viver sob o signo da violência e do terror. As eleições foram retomadas em 2010, mas sempre com a supervisão dos Estados Unidos, para evitar que qualquer força antimperialista pudesse assomar. E assim, de chefe em chefe de governo chegamos a Jovenel Moïse, um representante da ultradireita. Eleito em 2016, assumiu em 2017, e fez um governo conturbado tanto quanto seus antecessores. Agora, em fevereiro de 2021, seu mandato estava terminado. Mas ele já havia movido os pauzinhos para ficar no poder. Em 2020, dissolveu o Congresso e, desde aí, governava por decreto. Não cumpriu com a Constituição que o obrigava a chamar eleições. Prorrogou seu mandato e governava com mão dura usando diversos grupos armados – milicianos  – como apoiadores. Esses grupos promoveram massacres e expulsões de famílias em vários bairros bem como assassinatos cirúrgicos dos chamados inimigos de Jovenel. Apesar de tudo isso, os Estados Unidos seguiam apoiando seu governo e nenhuma campanha midiática foi criada para dizer que ele era um ditador ou criminoso. Isso porque ele atendia aos interesses dos EUA, principalmente no que diz respeito a manter a vigilância sobre a Venezuela, cujo território fica em frente ao Haiti. Geopoliticamente o país é estratégico para o império. O crime que tirou a vida de Jovenel, claramente uma ação de profissionais da morte, ainda está por se esclarecer. Quem afinal organizou o atentado e qual a intenção? Os EUA ou algum inimigo interno?  O primeiro-ministro Claude Joseph, que rapidamente se colocou como um possível presidente interino, já de saída está burlando a Constituição. O certo seria imediatamente chamar eleições gerais para que a população pudesse se organizar e se manifestar. Ainda que o tecido político esteja totalmente roto, justamente por conta das ações autocráticas do presidente morto, há forças internas capazes de atuar. De qualquer forma, o que já se configura é mais uma vez a velha política de intervenção por parte dos Estados Unidos, que obviamente não quer perder o controle do país. Aliado a isso pode começar nova onda de “campanhas humanitárias” que, como sabemos, desde 2004, só tem feito enriquecer os empresários de ONGs fajutas e políticos corruptos, mantendo a população em situação de miséria e desespero. Se fosse feita uma conta para somar toda a ajuda que tem sido canalizada para o Haiti desde a invasão do seu território em 2004, certamente daria para construir uns 10 Haitis e ainda sobraria. Onde foi parar esse dinheiro? Por que os países que sustentaram a Minustah nunca prestaram contas dessas doações e nunca a mídia comercial burguesa questionou isso? São perguntas retóricas, claro. A guerra ou a tática do desastre serve para isso mesmo: para engordar a conta dos senhores da guerra. Nada mais. Se para isso for necessário destruir um país e um povo inteiro, que seja. Assim que o assassinato de Jovenel

FARC, um novo partido na Colômbia

por Elaine Tavares Foram 53 anos de luta armada nas montanhas colombianas, a guerrilha mais antiga da América Latina. Primeiro, chegou como defesa mesmo das famílias e das comunidades num país devastado pelo caos político iniciado com o assassinato de Jorge Gaitán. Um exército popular nascido em 1964, em resposta à violência desatada pelo governo sobre a região de Marquetalia. Um grupo que, atuando de maneira mais sistemática, foi então se articulando como uma proposta de libertação, marxista. Mais de meio século enfrentando o poder de um estado militarizado e também de paramilitares e narcotraficantes. A Colômbia e seu caldeirão, recheado de mortes, desaparições, desalojamento de gente. Um país marcado pela proximidade política com os Estados Unidos, parceiro na luta contra qualquer possibilidade de vitória de uma proposta socialista. Era preciso varrer do mapa as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia, e muito foi investido nisso. Mas, apesar de toda a ajuda dos EUA e da ação permanente do paramilitarismo, o mercenarismo e o narcotráfico, as FARCs resistiram. E ao longo de quase meio século nunca faltou gente para engrossar as fileiras do sonho da liberdade e da soberania. Só que mais de 50 anos de guerra civil também conseguiram esgotar a população. Era tempo demais vivendo sob o medo e o terror de estado. Por isso, a proposta de um cessar fogo e de consolidação da paz começou a ganhar músculo. Várias tentativas já tinham sido feitas, todas infrutíferas, mas dessa vez, com a mediação de Cuba, as partes se entenderam. Não sem conflito. A ponto de, depois de assinada a paz, no final de 2016, um plebiscito realizado no país decidiu pelo não ao acordo, fruto de campanha massiva das forças mais reacionárias, comandadas por Álvaro Uribe, ex-presidente com ligações próximas ao narcotráfico. O fato é que, acertados alguns interesses, o acordo vingou e as armas da guerrilha começaram a ser entregues. A paz começou a tecer seus primeiros arranjos numa caminhada que não será curta nem fácil. E uma dessas tessituras foi a possibilidade de transformar toda aquela organização popular nascida na guerrilha em uma instituição partidária capaz de atuar na vida cotidiana, às claras, amarrando os laços construídos por todo o país. Assim, foi-se costurando a organização do Primeiro Congresso das Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia – Exército do Povo. E o congresso aconteceu agora em agosto de 2017, na capital do país, reunindo mais de 1.200 delegados de praticamente todas as regiões da Colômbia. Vieram os combatentes das montanhas e os milicianos da cidade. Vieram ainda delegações de movimentos revolucionários de mais de 20 países. Foram cinco dias de acaloradas discussões e ao fim, ali estava um novo partido político, uma organização fora da clandestinidade, pronta para disputar o jogo político na Colômbia da paz. Assim, o que eram as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (FARC) se transmudaram em Força Alternativa Revolucionária do Comum (FARC). Um nome e tanto, capaz de plasmar na mesma sigla os desejos de meio século: um país no qual os bens comuns pudessem ser desfrutados por todos e não apenas por uma elite. A voz da montanha pode soar sem medo, e da junção dos caminhos da luta armada com a paz, pode nascer a rosa vermelha que, a partir de agora, anunciará a luta da FARC partidária, civil. Já na abertura do histórico congresso, a fala de Rodrigo Londoño, o Timochenko, então dirigente máximo das FARC, deixava claro que entrar para a legalidade não significava abandonar os pressupostos que levaram tantos colombianos às armas: “não renunciamos aos nossos fundamentos ideológicos, nem ao projeto de sociedade. Seguiremos sendo revolucionários. Nossa missão fundamental será ganhar as massas, sem as quais o adversário fará o que quiser conosco”. Durante os cinco dias de congresso os delegados construíram o estatuto e o programa do partido, elegendo também a primeira diretoria, com 111 membros. Dentro desse grupo ficaram incluídos os antigos componentes do Estado Maior das FARCs, bem como aqueles que representarão o partido como senadores e deputados, cinco em cada casa, conforme garantiu o acordo. Para aqueles que durante anos viveram no terror da guerra, agora está colocada a possibilidade de construir uma alternativa que expresse a construção do mundo sonhado, de justiça, de terras repartidas, de cuidado com as gentes, de democracia real. Um grande desafio, como afirma o relatório do congresso fundacional: “Pedimos perdão às vítimas do conflito, fizemos ações de reparação e continuaremos a fazê-lo. Acreditamos que a reconciliação é possível, ainda num contexto político de polarização instigada por aqueles que a repudiam, sim, persistimos na necessidade de estabelecer diálogos e outras ações que permitam compreender que a construção da paz é um propósito coletivo. A paz tem que ver com todos: com os partidos políticos, com os governantes, com os diversos ramos do sector público, com os ex-contendores, com os empresários e os povos indígenas, os grandes meios de comunicação e as comunidades afro, com os habitantes das cidades e os camponeses, com os jovens e as mulheres, enfim com as pessoas comuns, com o povo. Chegar ao coração da população também significa compreender como, de facto, já o fizemos, que a solução dos problemas lancinantes da população não se encontra, exclusivamente, na implementação dos acordos e que estes, se bem que representam um indiscutível avanço democrático, têm que dialogar com o conjunto de iniciativas e propostas surgidas das mais variadas expressões organizativas políticas e sociais do campo popular”.  E esse caminho para o coração dos colombianos já se mostrou fecundo no grande ato de lançamento do partido que aconteceu ao final do congresso, na Praça Bolívar, em Bogotá, ao qual compareceram mais de 15 mil pessoas, para ouvir as decisões do encontro, cantar, dançar e compartilhar do ritual sagrado oferecido pelos povos originários, no simbólico cachimbo da paz. Agora, a luta seguirá por outras vias. Existem ainda muitas pontas soltas para serem amarradas. Afinal, é uma mudança radical a que milhares de pessoas estão vivendo, saindo da guerrilha para a vida civil. A rotina na montanha não encontra similaridade

O fim do estado de direito, ou quando a ditadura do capital mostra sua cara

por Elaine Tavares Houve um tempo em que pareceu possível acreditar que no capitalismo haveria a possibilidade de existir um “estado de direito”. Ou seja, uma organização da vida amparada em leis e direitos, valendo para todos. O tal do contrato social. E assim, os estados garantiram leis de amparo ao trabalhador, benefícios para os velhos, as viúvas, as crianças e os doentes, regras de convívio social. Alguns países até conseguiram chegar a algum nível dessa proposta, mas todos do centro do sistema. Até porque quem estuda sabe que, no capitalismo, o centro só é rico justamente porque tem uma periferia empobrecida da qual ele tira tudo o que pode. Mas, como a ideologia e a propaganda sempre foram fortes, houve muita gente que acreditou na falácia de que se trabalhassem muito, também chegariam a ter as maravilhas que se apresentavam na velha Europa ou nos Estados Unidos. Riqueza, consumo desenfreado, amparo, saúde. Uma bobagem. Isso nunca seria possível num país dependente. Poderia chegar para um grupo bem pequeno de pessoas, pois como diz o teórico Gunder Frank, os países dependentes também conseguem algum nível de desenvolvimento, ainda que seja o desenvolvimento do subdesenvolvimento. E é só. Não há como garantir direitos para todos, pois assim o capitalismo deixa ser o que é: um sistema de exploração. Assim, na América Latina, quando a revolução cubana iluminou todo o continente com uma proposta diferente da do capitalismo, os que estavam no controle do mundo trataram logo de abafar o perigo. Foi assim que se impôs a ditadura cívico/militar em todo o continente, de cima abaixo. O único direito que tinham os latino-americanos era o de ficarem calados, senão a morte vinha a galope, ceifando a vida dos que se insurgiam. Nos anos 80 do século passado veio a tal da “democratização”, que foi uma distensão lenta da mão dura militar, passando o comando apenas para o braço civil. A ditadura já não era necessária, o tempo havia passado, Cuba seguia isolada e o sistema capitalista havia desenvolvido mecanismos de sedução que encantavam as pessoas, atraindo-as, sem a necessidade de um governo tão opressor. A liberdade raiou na América baixa, trouxe de volta os exilados, e abriu um tempo de eleições diretas. Votar era possível de novo. Voltava o direito. As pessoas podiam se expressar, fazer oposição, lutar por direitos trabalhistas, aposentadoria, moradia, transporte. Parecia que o “bem-estar” teria uma chance por aqui. Veio uma nova Constituição. A lei haveria de garantir o direito de todos. Mas, que engano. A lei não vale para todos. Ela é uma construção histórica de uma determinada classe. É a classe dominante que elege seus representantes, e estes fazem as leis. É também a classe dominante que escolhe os juízes das cortes que julgam com base numa lei que sua própria classe fez.  E se a lei é um feito da classe dominante, o que podem os trabalhadores esperar? Que ela sempre se volte contra eles. Sempre. Mas, na euforia da democracia, as pessoas preferem se enfeitiçar pela ideologia do direito para todos. A vida real nos mostra que não há direitos para os pobres. Eles não têm moradia, nem saúde, nem educação, nem amparo, nem previdência. Tudo é aparência de direito. A lei só existe para ser usada contra os pobres. São eles os que enchem o sistema prisional a partir de condenações por “crimes” tão prosaicos como ser companheira de um traficante e estar com ele na hora da prisão, roubar um pão, passar um cigarro de maconha para o marido na cadeia, carregar vinagre durante uma manifestação. Coisas assim. Claro que bandidos há, mas eles são a minoria. Aí estão as pesquisas para provar. A lei é feroz contra os pobres. Já os ricos, bem, esses têm bons advogados que torcem e distorcem a lei. Que o diga o jovem Thor, que não é um deus, mas filho de um que era: Eike, o superempresário. Matou um homem e saiu de boa. Pois o sistema capitalista agora está tão seguro de si que já começa a pouco se importar com manter a aparência de um estado de direito. O poder está nas grandes corporações, que são transnacionais. Não estão nem aí para parecerem boazinhas. Querem tomar a vida dos trabalhadores até a última gota e arreganham os dentes. O direito? Ah, que se lasque. As leis? Que se mudem ao nosso bel prazer. É a ditadura do capital em sua meridiana clareza. Em nível internacional isso começou devagar, com o império estadunidense afogando o direito, ainda meio tímido, escondendo-se por trás de mentiras. Foi assim na invasão do Afeganistão, feita a partir da queda das duas torres gêmeas. Era o terrorismo e tinha de ser combatido. Onde estavam os barbudos? No Afeganistão. Então borá lá, vamos pegá-los. O mundo inteiro caiu nessa mentira deslavada e o Afeganistão foi destruído para alegria da indústria militar.  Depois foi a vez do Iraque, e a mentira das armas químicas. Em nome da salvação dos iraquianos, borá lá destruir as armas químicas que podem ser ameaça ao mundo. Mas, pera aí, não há provas! E quem precisa de provas? Basta que alguém – do centro – grite que tem armas, e tem. E lá foram os países centrais ocupar o Iraque, provocando destruição e morticínio. Dane-se o direito internacional. Afinal, quem decide o que é direito são os grandes.   A América Latina volta ao foco A América Latina pós ditadura parecia não fazer parte dos planos dos EUA. Mas, na verdade, fazia sim, só que com as coisas acontecendo de outra forma, no modo “suave”. Os primeiros sintomas de que a parte baixa da América sofreria outra vez o peso do império apareceram em 2002, quando a Venezuela viveu um golpe de estado. Hugo Chávez comandava o país fazendo coisas incríveis, como eleições gerais, plebiscitos, Constituinte, falando em socialismo. Deu o alerta vermelho. Era preciso parar o caudilho. Então, veio o golpe, desta vez sem canhões, mas com a mídia. Através da televisão se formou

Thomas Sankara lutou contra o fardo colonial na África

Bem-vindo ao Fatos da Zona, onde adaptamos os textos mais acessados do site do Zonacurva Mídia Livre. Este vídeo mergulha na vida extraordinária de Thomas Sankara, um líder revolucionário que desafiou o imperialismo e o colonialismo no Burkina Faso. Sankara é frequentemente chamado de ‘Che Guevara da África’ por sua visão progressista. Ele liderou uma revolução socialista que buscava justiça social, igualdade de gênero e independência econômica para seu país.   por Fernando do Valle Sankara -Alto Volta, pequeno e pobre país colonizado pelos franceses, sem acesso ao mar e fronteiriço a seis países (entre eles, Mali, Níger e Costa de Marfim) sofreu em 1983 um golpe de Estado, infelizmente comum nos países africanos. Mas dessa vez quem assumiu não foi mais um corrupto ditador defensor dos interesses das antigas metrópoles. Quem passou a comandar o país foi Thomas Sankara, jovem capitão do exército de apenas 34 anos, que rebatizou o país como Burkina Faso, a Terra dos Homens Íntegros, e se tornou figura emblemática no combate à pesada herança de séculos de colonização. Fortemente influenciado pelos ideais socialistas e anti-imperialistas, Sankara pregava que seu país não necessitava de ajuda humanitária como a doação de alimentos dos países ricos, que utilizavam esse método falsamente generoso para manter os africanos na miséria, como verdadeiros “pedintes”. Sankara afirmava que Burkina Faso produzia alimento suficiente para alimentar sua população e isso não acontecia devido à desigualdade, como sempre, e a desorganização do país. Em alguns anos de governo, Sankara realmente alcançou a autossuficiência alimentar do país. Thomas Isidore Noel Sankara nasceu em 21 de dezembro de 1949 e foi assassinado em 15 de outubro de 1987. Emiliano Zapata cumpriu a promessa que fez ao pai Acusado por um funcionário francês das Nações Unidas de militarizar o país, Sankara respondeu que tinha consciência das forças contrárias ao seu projeto político e que seus soldados eram treinados dentro do projeto político e ideológico para conscientizar a população do país. Sem essa consciência, afirmava Sankara, todo soldado é um potencial criminoso. É lógico que a teoria não funcionava com perfeição na prática. Segundo os ditames da revolução de Sankara, os soldados dos exércitos africanos deveriam libertar o povos reprimidos por regimes reacionários e opressores. Para isso, ele criou em Burkina Faso “Os Pioneiros”, grupo de meninos de até 12 anos educados dentro dos ideais do anti-imperialismo e do anticolonialismo. Se Sankara conseguiu feitos notáveis na área social, também tratava com mão de ferro sindicatos que se opunham ao seu governo. Durante uma greve, chegou a prender 1400 professores. Muitos desses professores passaram a ser substituídos por “professores da revolução” que passaram por breve treinamento de 10 dias. O autoritarismo e intolerância com os opositores era o traço que jogava a figura de Sankara na vala comum de dezenas de líderes e ditadores africanos. Além disso, Sankara chegou a criar tribunais revolucionários onde opositores do regime eram julgados com severidade. Por outro lado, algumas decisões de Sankara modificaram a dura realidade de Burkina Faso. Entre elas: ampla campanha de vacinação que praticamente erradicou doenças como poliomielite e sarampo, criação de programa de reflorestamento no país que sofria com a desertificação de boa parte de seu território, duro combate à corrupção, programa de mutirão que construiu centenas de casas retirando grande parte da população de barracos precários, reforma agrária e programa de irrigação que praticamente dobrou a produção de trigo por hectare no país, além da construção de estradas de ferro. Mesmo em um país pobre e com poucos recursos, o forte carisma de Sankara conseguiu mobilizar os burquinenses nessas empreitadas. O líder burquinês também reconheceu o direito das mulheres e incentivou a emancipação feminina na forte cultura machista africana indicando mulheres como ministras e na formação militar. Vídeo produzido por “Media Alien” reúne alguns trechos de discursos de Sankara: Adepto do pan-africanismo, Sankara aproveitou uma conferência em Adis Abeba, na Etiópia, que reuniu vários líderes africanos, para questionar a imoralidade da dívida externa contraída por governos africanos submissos aos antigos colonizadores. O líder burquinês enxergava na dívida externa a perpetuação do poder dos países europeus sobre o continente africano. Ainda dentro dos ideais da união africana, Sankara fez um duro discurso em que colocou o presidente francês François Mitterrand contra a parede quando o recebeu em Burkina Faso em 1986 ao questionar a recepção em solo francês do líder sul-africano Pieter Botha. Sankara afirmou que Botha passeou com suas “mãos e pés cheios de sangue” tranquilamente em Paris. Botha reprimia com violência a luta contra o apartheid na África do Sul. Para escapar da saia justa, Mitterrand falou que o discurso do presidente de Burkina Faso era fruto da “juventude e do amor por seu povo”. Sankara também tomou fortes medidas de austeridade nos gastos públicos: diminuiu seu salário e de seus ministros, substituiu a frota oficial de Mercedes pelo carro mais barato vendido no país, o modelo 5s da Renault, cancelou viagens de primeira classe de funcionários públicos e acelerou o julgamento de ex-membros do governo anterior por corrupção.   O assassinato de Sankara Em 15 de outubro de 1987, Sankara foi fuzilado por opositores, em seu corpo foram encontrados balas de armas como a russa Kalashnikov e até estilhaços de granadas. Essa foi a conclusão de uma autópsia realizada somente em 2015. Centenas de pessoas choraram a morte de Sankara nas ruas da capital Uagadugu. Na época do golpe de Estado que colocou Blaise Comparoé no poder (braço direito de Sankara), o laudo indicava morte natural como causa mortis do revolucionário burquinês. Oito pessoas foram acusadas em 2015 pelo crime. Tudo indica que o governo francês e a CIA tiveram participação no crime como também Compaoré. Quando o fiel amigo Compaoré assumiu a presidência (poucos dias após o assassinato de Sankara), ele comprometeu-se a ratificar as conquistas revolucionárias, mas o que se viu foi mais do mesmo, o retorno à conhecida política de alinhamento aos interesses das potências europeias e dos Estados Unidos. Compaoré governou Burkina até 2014 quando também foi deposto e refugiou-se

Independência ou golpe!

por Marceu Vieira  Como muitos amigos que se posicionaram no Twitter ou no Facebook, ou nas conversas da vida real no botequim, eu também não comemorei nem achei engraçada a cena do Garotinho se debatendo numa maca de hospital público, resistindo a entrar na ambulância rumo ao presídio Bangu 8, enquanto a filha Clarissa, desesperada, gritava: “Meu pai não é bandido! Meu pai não é bandido!” O que eu senti foi tristeza. Senti também, confesso, um certo temor pela normalidade institucional destes trópicos, que andam tão tristes, com o desemprego deixando sem renda e sem sustento quase 13 milhões de famílias. Esta terra adorada, pátria amada, idolatrada, salve, salve, onde ainda me sinto responsável pelo futuro de três filhos e de uma “linda Rosa juvenil”, cujo nascimento está previsto pra 2017. O que será 2017? Garotinho, ao contrário do Cabral Filho, não enriqueceu na política e teve emprego formal antes do seu primeiro mandato como vereador de Campos. Foi preso agora porque distribuiu cheque-cidadão a miseráveis em troca de voto. Mas já poderia ter ido pra cadeia antes. Porque, desde a primeira eleição pra vereador de Campos, quando era radialista, é assim que ele opera. Dava dentaduras e cadeiras de rodas em troca de voto. Quem não sabe disso? Talvez só a Rosa, que ainda não nasceu. Se desde Cabral, não o político, mas o navegante, os valores universais de Justiça fossem tomados à risca no Brasil, é possível que não houvesse cadeia suficiente pra prender tanto político desonesto. Aliás, Cabral nem eleito teria sido – agora não o navegante, mas o político mesmo. Em Brasília, talvez não houvesse tantos camburões pra conduzir do Congresso Nacional até a prisão todos os deputados e senadores com contenciosos na Justiça. Nem vaga de estacionamento bastante haveria no entorno da Câmara e do Senado pra tanta viatura da Polícia Federal. Por que não se prendeu o Garotinho já na sua primeira campanha, se trocar voto por esmola sempre foi a prática de políticos miúdos como ele? Por que não se prendeu antes o graúdo Cabral, se até a vendedora da joalheria onde o empreiteiro Cavendish comprou o anel de R$ 800 mil pra primeira-dama e até os operários que demoliram e reconstruíram o Maracanã, o nosso Maracanã, já sabiam das suas “tenebrosas transações” (com a licença do Chico Buarque)? Por que se demorou tanto pra prender o Eduardo Cunha? Talvez a Dilma não caísse, e o Brasil só estaria ruim, como já estava, e não insondável como agora. Movido por sua pequenez vingativa, e pra satisfazer a histeria de uma elite apodrecida e de uma classe média ressentida e egoísta, um deputado que hoje está preso pelos mais bárbaros crimes de corrupção jogou o Brasil nesta crise – ajudado, claro, pelas fanfarronices de alguns petistas. Ele, o deputado, comandou um processo quase sumário de impeachment e pôs no lugar de uma presidente legitimamente eleita por 54,5 milhões de brasileiros, e até prova em contrário honesta, um vice sem recheio e sem voto e também com muitas explicações a dar à Justiça. Este vice é do partido do deputado preso. É do partido do Cabral. Do partido que, até outro dia, era também o do Garotinho – que, aliás, não faz muito, era amigo de todos eles. Sobretudo, do deputado preso. Este partido, se ainda não é possível ligar o nome à pessoa, é o PMDB – e é nele que, segundo a papelada do próprio juiz Moro, está o ninho principal dos cupins demolidores do Brasil. E, assim, desde Cabral (mais uma vez o navegante, não o político), o país do Garotinho, do Eduardo Cunha, do Temer e do outro Cabral (agora de novo o político, não o descobridor), o país do PMDB, enfim, este país segue movido a golpes – o golpe genocida na identidade indígena, dizimada pelos colonizadores; o golpe na índole africana com a escravidão de sua gente, trazida pra cá acorrentada pra ser olhada até hoje de modo diferente pelos descendentes do branco europeu; o golpe de Pedro I ao dissolver a Assembleia Constituinte em 1824 e outorgar uma Constituição preparada por dez servos das vontades dele; o golpe civil da maioridade incauta de Pedro II, aos 14 de idade, em 1840; o golpe militar do marechal Deodoro, que derrubou o mesmo Pedro II, ali já idoso e democrata, ele, um carioca de nascimento arremessado ao exílio aos 64 anos, em 1889, quando se instalaram no Brasil as ditas e as desditas da república em vigor até hoje. Os golpes contemporâneos, de lá pra cá, estão mais fixados na memória coletiva – e o último, aquele que pra uma metade do Brasil não foi, enquanto pra outra foi, este ainda está em curso e vai nos levar aonde já não sabemos. O surto do Garotinho na ambulância e os gritos desesperados da filha dele não dão a resposta. Os milhões tungados e a falta de reação do Cabral, não o descobridor do Brasil, mas o quebrador do Rio, empanam a vista pro futuro. Dá saudade, se é este mesmo o nome do sentimento, do que teria sido o Brasil sem o golpe original da República contra Pedro II. Dá saudade de sei lá. Dos discursos do Brizola, quem sabe. Da vitória do Lula em 2002. Da esperança que venceria o medo. Dos comícios de antigamente com o velho Prestes na Cinelândia – e antigamente foi outro dia. Faz lembrar um quadro do programa “Tá no ar”, do Marcelo Adnet e do Marcius Melhem, em que o primeiro, caracterizado como Pedro I, cavalgando num descampado, para com seu cavalo ao encontrar o segundo, no papel daquele personagem do comercial dos Postos Ipiranga, e pergunta: – Ô, amigo! Sabe onde eu posso declarar a Independência do Brasil por aqui?! E o personagem do Melhem, depois de uma pausa, responde: – Sei não… Mió cê perguntar ali nas margens do Ipiranga. Publicado originalmente no Blog do Marceu Vieira. Nada como um dia após o outro O Brasil vai vivendo o golpe

Brizola ‘fala’ do pedido de impeachment de Dilma

por Marceu Vieira O cronista digital revisitou o arquivo particular do tempo em que atuava como repórter político, sobretudo no “Jornal do Brasil”, e, levado por uma alucinação, reentrevistou Leonel Brizola (1922-2004), o velho trabalhista gaúcho, governador do Rio Grande do Sul uma vez, do Rio de Janeiro duas. No armário reaberto de sua memória, Brizola disse a ele o que pensa do pedido de impeachment de Dilma, das infelicidades do PT, do protagonismo de Eduardo Cunha, de Michel Temer, de Aécio Neves, do juiz Sérgio Moro, do PMDB, da TV Globo, da imprensa em geral, das manifestações pró e contra o governo, do “Big Brother Brasil”, da seleção do Dunga, da novela das oito e de mais um pouco de um pouco mais.   Governador, o senhor tem acompanhado o atual momento do Brasil? Veja. Devo te dizer que tenho acompanhado com muita preocupação tudo isso que aí está. A rigor, o que se está tentando construir, hoje, no Brasil, é um golpe.   Juristas renomados têm lembrado que o impeachment é previsto na Constituição. Por que, então, seria um golpe? São vozes contaminadas por conveniências de certos grupos políticos. Pergunte a esses juristas em quem eles votaram em 2014. Veja bem. A presidente Dilma foi eleita com 54,5 milhões de votos. Tirá-la do poder só porque não gostam dela, isso não é um golpe? Aí vem a TV Globo com seus porta-vozes e diz: “Ah, não, não é golpe, não, porque o impeachment está previsto na Constituição.” Mas o que há, de fato, contra Dilma? A rigor, francamente, não há nada! Então, tirá-la é golpe.   O senhor continua em combate com a TV Globo, mesmo daí? Não diria isso. Depois da minha morte, eles lá me deram uma trégua. Já haviam me dado antes um pouco. Os velhos e os mortos costumam ser contemplados com esses favores, não é verdade? São os favores da idade e, agora eu sei, também os da morte. Mas compreendo que este momento vivido pela presidente Dilma é muito parecido com aqueles dias de perseguição implacável que sofri deste império Globo. A Globo, honestamente, com todos os seus tentáculos, parece cumprir o último quarto de hora de seu domínio. Daqui onde estou, vejo grandes mudanças à vista. Grandes mudanças. Os impérios, todos eles, nascem, prosperam e fenecem. A História tem muitos exemplos.   O senhor não acha que… Deixe-me concluir. Então, se a Globo diz que não é golpe, só porque ela diz, o povo brasileiro deve acreditar? É como eu sempre disse. Tem rabo de jacaré, tem dente de jacaré, olho de jacaré, cabeça de jacaré, couro de jacaré… mas não é jacaré?! Veja, não conversei com o Roberto Marinho. Porque, também aqui, procuramos nos evitar. É ele lá e eu cá. Mas posso assegurar que nem o Roberto Marinho, nem ele deixaria de classificar este ajuntamento de forças contra um governo democraticamente eleito como uma tentativa de golpe. Digo mais. O Roberto Marinho deve estar descontente com os filhos dele. Como condenar uma pessoa se não há um crime? É como eu vejo.   Qual a sua análise do papel da imprensa neste momento? Tu sabes do apreço que tenho pelos jornalistas. Minhas batalhas sempre se deram em outra esfera, em outro plano. Tu sabes também o quanto a Globo e seus satélites, como o seu jornal e suas rádios, me perseguiram. As rádios, menos, é verdade. Mas estas costas aqui ainda me doem de vez em quando por causa das chibatadas que recebi das Organizações Globo. Sobretudo da TV e do jornal, que cresceram e prosperaram e se tornaram um império na ditadura. A Globo, sobretudo, é filhote da ditadura! Mas, sabes?, nem disso guardo mágoa. O que se vê hoje, creia, é menos cruel do que eu suportei. Tudo que o Leonel Brizola fazia… e… tiscs… até o que o Leonel Brizola não fazia… tudo era motivo de contestação desse império. A meu ver, Perseu…   Marceu, governador… A meu ver, o papel da imprensa é fiscalizar, denunciar. E creia que a História só é escrita porque existem contemporâneos que a relatam. Estes contemporâneos são tu e teus iguais, jornalistas, e eu os respeito. Agora, a manipulação, ou o destaque sem medida e sem propósito que se dá a determinados fatos, isso, francamente, a História trata de dissipar e de dissolver no seu grande caldo. De modo que respeito os jornalistas, mas sempre tive graves ressalvas com seus patrões.   E o papel do juiz Moro? Veja. Este rapaz, o juiz Moro, é um jovem magistrado, voluntarioso, que tem lá suas boas intenções e as suas convicções. Daqui o assisto. Mas, francamente, percebo algum deslumbramento nos seus procedimentos. Não quero desagradá-lo nem desrespeitá-lo. Mas a divulgação da conversa do Lula com a presidente Dilma, olha, francamente, aquilo foi um inominável excesso. Com todo o respeito ao magistrado Moro, foi sim. Lula, em conversas privadas, é desabrido, não resiste a um k-7. A mim mesmo já me disse coisas que eu não ousaria repetir. Mas, honestamente, na minha convicção, divulgar aquela conversa, olha, foi um sinal de perigo para o que ainda pode vir.   Que coisas foram essas que o Lula disse ao senhor em caráter privado? Dirceu, veja, ele jamais me disse nada que fizesse uma vaca dar mais leite no pasto, como se dizia lá no campo, ou um cusco caído de mudança se achar. São coisas que morreram comigo. Não tive tempo de acompanhar aí esse programa da Globo, o “Big Brother”. Mas creio que o juiz Moro cedeu à tentação do “Big Brother” ao expor uma conversa sem consequências da presidente Dilma com o Lula.     O senhor concorda que os pecados do PT comprometeram o governo Dilma? A rigor, o PT, por si só, já é fruto de um pecado. O PT foi gestado na ditadura com a permissão dos militares para diminuir a nossa força. Nós temos essa compreensão. Nós, que estávamos no exílio, deveríamos ser aniquilados. O plano era