Zona Curva

Balanço do golpe I

por Guilherme Scalzilli

Os equívocos administrativos dos governos Dilma Rousseff são insuficientes para explicar o sucesso do golpe. Os péssimos índices socioeconômicos, a corrupção e a impopularidade não abreviaram os mandatos de José Sarney e FHC, por exemplo.

A associação dos fracassos gerenciais de Dilma com a queda visa dar a esta um verniz meritório, criando pretextos para a negociata que os golpistas apelidaram “julgamento político”. A responsabilização da vítima esconde suas tentativas de resistência e, acima de tudo, os esforços sistemáticos da mídia, do Judiciário e do Congresso para sabotá-las.

balanço do golpe
A ex-presidenta Dilma Rousseff fala no Senado no dia de seu impeachment (foto de Marcos Oliveira da Agência Senado)

A viabilização do golpe se deu no âmbito estratégico. O impeachment representou uma confluência de elementos que foram se articulando ao longo dos últimos três ou quatro anos, nem sempre de forma planejada, mas partindo de setores com o mesmo interesse.

Nesse sentido o governo petista contribuiu com a própria tragédia, como um jogador que planeja mal seus movimentos e subestima as manobras adversárias. Isso diz respeito a uma esfera pragmática da atividade política, onde ideais, plataformas e mesmo realizações ocupam lugar lamentavelmente secundário.

Por ingenuidade, cinismo ou pura preguiça, os comentaristas midiáticos ignoram esse ambiente. Mas evitar a face espinhosa do impeachment leva a um idealismo alienante, que enxerga pressupostos no lugar de fatos, pessoas e instituições. Eis porque alguns progressistas e conservadores parecem ter visões tão semelhantes sobre o fenômeno.

Nas próximas semanas abordarei a consecução do golpe sob as óticas político-partidária, social, jurídica, econômica e midiática, com um epílogo perspectivo. Não pretendo esgotar os assuntos, nem mesmo desenvolvê-los, e sim propor um rol de questões que julgo merecerem figurar nos futuros debates historiográficos.

 Publicado originalmente no Blog do Guilherme Scalzilli.

A escandalosa isenção do Judiciário brasileiro

 

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