Zona Curva

Easy Rider às avessas

Pelas estradas, a geração beatnik buscava liberdade. Nos road movies, é na velocidade da viagem que os protagonistas encontram novas perspectivas para a solução dos dilemas de suas vidas. Nas estradas paulistas no último feriado, milhões vivenciaram o inverso dessas experiências: a paralisia total em gigantescos e caóticos estacionamentos, principalmente, no caminho da almejada praia.

Em piada conhecida, diz que o paulistano gosta tanto de trânsito que sempre o leva para onde vai. Foi o que aconteceu na enésima potência. A saída de Sampa na quinta (dia 14) à tarde, que levou o tráfego da capital a novo recorde (309 quilômetros), indicava mais uma vez como o sistema de transporte baseado em carros entrou em total colapso.

Nas estradas, a situação foi ainda pior. A demora de 13 horas entre São Paulo e Caraguatatuba (mais que o tempo do voo São Paulo-Paris, de 12 horas) levou à revolta alguns motoristas na estrada Oswaldo Cruz, que liga Taubaté a Ubatuba. Eles tomaram a pista no sentido contrário, inclusive o acostamento, na desesperada tentativa de desafogar o trânsito. Na Baixada Santista, alguns motoristas demoraram 8 horas para percorrer os 77 quilômetros que separam São Paulo de Santos.

'Saludo' para as estradas paulistas
‘Saludo’ para as estradas paulistas

A cobertura da TV, invariavelmente, supera o patético. Entrevista motoristas conformados e transforma tudo em frases do tipo: “no final, vale o esforço”. Lembro sempre de repórter descerebrada da TV Tribuna, retransmissora da TV Globo na Baixada Santista, que sempre perguntava para os banhistas que enfrentaram séculos na estrada: “mas esse congestionamento aqui na areia você gosta, né?” Surreal.

Na capital paulista, ainda existem insuficientes e lentos esforços para melhorar o transporte coletivo como a construção do monotrilho, de novas estações de metrô e de mais corredores de ônibus. Já no caminho para as praias, não há nem projetos de iniciativas semelhantes. A opção de transporte coletivo resume-se ao ônibus, que mistura-se aos milhares de veículos particulares.

Um pequeno e seleto grupo permanece imune ao caos. Do alto, em reluzentes helicópteros, enxerga a serpente de luzes vermelhas dos carros financiados envolvendo a serra do Mar. Ao seu lado, o político que pegou uma carona (de última hora) brinda com um bom uísque importado já que ninguém é de ferro.

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