Zona Curva

#antiracismo

O fascista mora ao lado

COLABOROU ISABELA GAMA   A LIVE POLÍTICA ZONACURVA do último dia 10 de fevereiro (quinta) contou com a presença do editor Zonacurva Fernando do Valle, Luís Lopes do Portal VISHOW e o advogado Roberto Lamari. O debate foi acerca dos recentes acontecimentos envolvendo falas fascistas e neonazistas. No último dia 7 de fevereiro, o apresentador Bruno Aiub, conhecido como Monark, defendeu a criação de um partido nazista no Brasil durante o Flow Podcast. Presente no programa, o deputado federal Kim Kataguiri fez coro e criticou a criminalização do partido na Alemanha. Lamari relembra durante a live que, não é de hoje, que o apresentador Monark mostra sua ignorância nesse podcast muito popular entre os jovens, o irresponsável já defendeu o “direito de ser racista”. Para ele, parece que ser racista e agora nazista são garantidos por um conceito equivocado de “liberdade de expressão”. Insano. Um dia após o caso de Monark, Adrilles Jorge, até então comentarista da Jovem Pan News, defendeu as falas do podcaster e se despediu de seu programa com uma saudação nazista. Para Lamari, a fala de Kim e Monark se assemelham a tantas outras da internet, sem fundamento ou análise. Para Luis Lopes, atos como esses funcionam como um chamado para quem concorda com os regimes da extrema direita, dando visibilidade a eles. Fernando expõe que atualmente existem 530 grupos neonazistas no Brasil, e relembra que ainda em 2004, antes mesmo de Bolsonaro ser cogitado como candidato a presidente, manifestações desses grupos já faziam menções ao então deputado. Além disso, é importante ressaltar que David Duke, ex-líder do grupo supremacista norte-americano Ku Klux Klan, já elogiou Bolsonaro e afirmou que o presidente “soa como nós”. Apesar da fala de Monark abrir brechas para que haja novos discursos como o dele, Fernando alerta que o maior perigo para o Brasil são os nazistas que se encontram no poder atualmente. É necessário relembrar que membros do governo como o ex-secretário de Cultura Roberto Alvim e o assessor da presidência da república Filipe Martins agiram como nazista (o primeiro) e supremacista (o segundo). Além disso, o próprio presidente Jair Bolsonaro recebeu a deputada alemã Beatrix von Storch, neta de Lutz Graf Schwerin von Krosigk, ministro de finanças de Adolf Hitler., e uma das principais expoentes do partido nacionalista-conservador Alternativa para a Alemanha (AfD, na sigla em alemão). https://urutaurpg.com.br/siteluis/nazi-fascismo-no-brasil/ https://urutaurpg.com.br/siteluis/monark-o-radical-da-praca-de-alimentacao/ 5 perguntas sobre o conflito Rússia x Ucrânia  

A terceira etapa do nazi-fascismo no Brasil não poderá ser derrotada somente nas urnas

O recente surto de crimes de apologia ao nazi-fascismo por parte do governo Bolsonaro e seguidores, a existência de células neonazistas, o crescimento do discurso de ódio e da intolerância através do “comitê do ódio do Planalto”, o crescimento de milícias armadas com participação de policiais e até mesmo de militares, o massacre de negros e pobres de periferias, todos estes fatos têm uma relação direta com a existência e as práticas que antecederam o surgimento do Nazismo Alemão e até mesmo dos Partidos Nazista e Fascistas no Brasil do século passado e nos anos pós-ditadura militar de 1964. A primeira etapa O partido de Hitler no Brasil chegou a ser o maior Partido Nazista fora da Alemanha! Foi fundado em Santa Catarina, na cidade de Timbó, em julho de 1928, sendo o primeiro Partido Nazista a ser reconhecido pelas lideranças do partido em Munique, que já haviam realizado a fracassada tentativa de golpe de estado de 1925. E o Partido Nazista aqui formado se expandiu enormemente e por todo nosso país. Chegou a se estabelecer em 17 Estados, contando com mais de 100 células formadas exclusivamente por alemães. Frise-se que por ordem expressa do Partido Alemão e, posteriormente, do governo nazista da Alemanha, só era permitida a inscrição de alemães natos, excluindo até mesmo descendentes nascidos aqui. E nas décadas de 1930 e 1940, ademais dos membros partidários de origem germânica, os simpatizantes do nazismo espalharam-se por todo o Brasil! Fotos de alemães e simpatizantes brasileiros ostentando a suástica em bandeiras e faixas, reportagens racistas sobre o “perigo judeu” e a respeito das maravilhas dos “campos de trabalhos forçados” estabelecidos nos países invadidos, como Auschwitz na Polônia, constituem provas incontestes. O jornal nazista “Deutscher Morgen” (“Aurora Alemã”) se encarregou de apregoar por todos os cantos a exclusão de raças “inferiores” e grupos sociais como judeus, ciganos, homossexuais, comunistas e portadores de deficiência. Grande parte da repulsa do Partido Nazista se direcionava também a negros e miscigenados, que compunham nossa própria identidade nacional. O sucesso do partido em solo brasileiro ocorreu justamente por conta do pensamento racista da elite e da classe média, herança do escravagismo. A vinda de europeus da Itália e Alemanha fora incentivada, desde meados do século XIX, não só para fornecer mão-de-obra barata na agricultura, mas também como uma forma de “branquear” a identidade brasileira. Textos eugenistas apareciam não somente em publicações ligadas ao Partido Nazista, mas também na quase totalidade da imprensa brasileira dependente da publicidade estatal. De todo modo, a nomeação de Hans Heinnig von Cossel como chefe do Partido Nazista no Brasil, em 1934, aumentou a adesão dos entusiastas da cruz gamada. Sua estratégia era conseguir unir toda a colônia alemã em torno do hitlerismo, evitando manifestações sobre questões políticas brasileiras. Afinal, o nazismo já contava com inúmeros simpatizantes no próprio governo e na posterior ditadura Vargas, assim como em nossas Forças Armadas. Surge um irmão ideológico. Na década de 1930, outro movimento estava em crescimento no país, especialmente nas regiões sul e sudeste. Fortemente inspirado pelo fascismo italiano, o jornalista paulista Plínio Salgado fundou a Ação Integralista Brasileira, organização política que compartilhava os mesmos preceitos do nazi-fascismo: nacionalismo, antissemitismo, racismo e combate ao comunismo e ao liberalismo. “Sim, podemos dizer que são nossos irmãos fascistas”, dizia Cossel. Na década de 1930 e princípios da de 1940, os governos de Brasil e Alemanha eram mais que amigos. Até a entrada forçada na Segunda Guerra Mundial em 1942, ao lado dos Aliados, o Brasil manteve boas relações com a Alemanha. Consequentemente, a existência do Partido Nazista em solo brasileiro foi não apenas tolerada, mas muito bem-vista, inclusive por Getúlio Vargas. “Até 1938, o partido não era proibido no país.  O próprio Vargas, ao se corresponder oficialmente com Hitler em novembro de 1937 por conta da troca de embaixadores, chamou o ditador alemão de “grande bom amigo” e afirmou esperar um estreitamento de relações. O filho de Getúlio, Lutero Vargas, casou-se com a artista plástica alemã nazista Ingeborg ten Haeff, simbolizando o relacionamento estreito entre os países. As polícias secretas do Brasil e Gestapo da Alemanha estabeleceram vínculos de cooperação fortíssimos, o que incluiu treinamento de policiais brasileiros pelas SS nazistas. A preterida expansão do imperialismo da Alemanha em países subdesenvolvidos como o Brasil tornava-se mais do que evidente. Foram realizadas expedições nazistas à Amazônia para coletar informações sobre a fauna, flora e cultura indígenas da região, pois um dos objetivos do governo alemão era implantar colônias estratégicas na região. No entanto, quando o Brasil é forçado pelos Estados Unidos a entrar na Segunda Guerra Mundial, empresas alemãs foram fechadas, bancos alemães pediram liquidação e lojas alemãs foram saqueadas. Em resposta às proibições e hostilidades, parte da comunidade alemã-nazista deixou o Brasil e foi repatriada, recebendo até mesmo compensações financeiras do III Reich. E desta forma, o primeiro surto nazi-fascista foi rompido em nosso país.   O nazi fascismo estrutural, numa segunda etapa, foi uma das bases da Ditadura Militar de 1964 O Brasil se tornou o lugar de refúgio de diversos criminosos nazistas, que sempre buscaram refúgio em grupelhos nazi-fascistas do interior de São Paulo ( Atibaia, por exemplo) e Santa Catarina. Entretanto, somente após a redemocratização, em 1988, o neonazismo tentou se reestruturar no Brasil através do Partido Nacional Socialista Brasileiro (PNSB), fundado por Armando Zanine Júnior, em 1988. A Justiça Eleitoral não o aprovou, afinal, nosso país vivia uma efervescência política de liberdade e reconstrução pós-ditadura militar. Na busca por alguma relevância política, o PNSB se aproximou publicamente do seu “irmão” ideológico, o movimento integralista representado pela Ação Integralista Brasileira. Nas eleições de 1994, Zanine declarou apoio a Éneas Carneiro, do PRONA, mas Carneiro, democrata, rejeitou publicamente o apoio. “Não me alio a nazistas e fascistas”, disse. E o segundo surto da peste se auto-afogou.   O terceiro surto nazifascista, o Bolsonarismo O Brasil vive hoje uma escalada no aumento do número de células neonazistas, explosão de discursos que exaltam a ideologia de ultradireita nos meios digitais, um desrespeito crescente aos

Monark, o radical da praça de alimentação

Monark, o youtuber, é a efígie de uma geração idiotizada, escrava das métricas, e vazia. Uma geração que tem opinião formada a partir de mesa de bar e corrente de WhatsApp. Descrentes de qualquer fonte científica por que tem um brother do amigo dele do outro condomínio ou por que a mãe trabalha na área, que garantiu “não ser assim não”. Extremamente carentes, fúteis e ansiosos e em busca de algum reconhecimento mesmo não tendo nenhum serviço prestado. Monark não merece nem que eu escreva um texto inteiro. E nós, que viemos antes dele, mais rodados, compreendemos que se simplificarmos o absurdo como apenas “liberdade de expressão”, perdemos o filé mignon do debate. E o cerne é: qual ‘expressão’ tem visibilidade?  Principalmente quando são os algoritmos que ditam as regras do jogo.  O que pudemos ver nesse episódio é o capital imprimindo práticas antigas de financiar estéticas ignóbeis, figuras caricatas, personalidades exóticas que pouco ou nada agregam na compreensão da sociedade com o objetivo nítido de afastar a sociedade do verdadeiro debate, daquilo do que realmente importa.  Por isso que é mais fácil o Flow (podcast super acessado do comunicador) ou outro podcast qualquer conseguir patrocínio de inúmeras marcas do que Rita Von Hunty, a persona drag queen criada pelo professor Guilherme Terreri Lima Pereira no canal Tempero Drag, que aborda de forma pedagógica conceitos sociológicos para usarmos na vida prática, ajudando a compreender inclusive fenômenos como esse em que Monark defende a criação de um partido nazista no Brasil.. Nesses termos, a rede social virou reduto de tudólogos, de egos inflados que não contribuem de forma concreta para melhorar a sociedade, e que são a isca perfeita para apreender a mente e o tempo, daqueles que não se percebem nesse tempo-espaço, sendo induzidos a uma mecanização, consumindo um “conteúdo” pasteurizado, e reproduzindo bobagens. E isso monetiza. Rende lucro.  E o que se paga a Monark é pouco ou nada perto do prejuízo que todos nós temos com esse tipo de “corta-luz”. Uma mão entretém a nossa visão e a outra opera, se aproveitando da nossa atenção dispersa. A sociedade pós-industrial está dependente da rede social, inclusive, já há patologia para isso, e o que antes era visto como um avanço na vida do homem moderno, tem se mostrado uma péssima muleta. Mas pior que isso é o uso político e ideológico que está no background desse modus operandi, formando um exército de fantoches que não tem qualquer pensamento crítico da realidade em que vivem.  Monark que presta é mesmo a bicicleta. A terceira etapa do nazi-fascismo no Brasil não poderá ser derrotada somente nas urnas A conciliação perpetuará o fascismo Fascistas, no pasarán

Não existem raças, existe racismo

Racismo Brasil – Não existem raças, afirma o antropólogo italiano Marino Niola. Elas existem apenas como “mito político”. É preciso excluir a palavra raça dos vocabulários da ciência, do marketing e da Constituição brasileira, cujo artigo 3, inciso XLI, reza: “Constituem objetivos fundamentais da República Federativa do Brasil promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação”. Raça é uma palavra maldita, uma patologia da linguagem. Existem apenas duas “raças”: a dos que têm e a dos que não têm. No capítulo VIII do clássico “Dom Quixote”, o herói alerta seu fiel escudeiro: “vê ali, amigo Sancho Pança, onde se descobrem trinta ou mais desaforados gigantes, com quem penso fazer batalha, e tirar-lhes a todos a vida, e com cujos despojos começaremos a enriquecer; esta é boa guerra, e bom serviço faz a Deus quem tira tão má raça da face da Terra.” Cético, Sancho Pança questiona: “quais gigantes?”, o escudeiro se esforça por trazer Quixote à realidade: “quais raças?” A resiliência do termo “raça” em nossa cultura, a ponto de um governo progressista como o do PT criar a Secretaria de Políticas de Promoção da Igualdade Racial, se deve ao fato de o racismo pretender atribuir bases científicas a sua postura execrável. As nossas diferenças de atitudes nada têm a ver com a Mãe Natureza; são filhas da Mãe Cultura. Nossos preconceitos e comportamentos discriminatórios resultam da educação que recebemos, das influências que tivemos, das experiências que vivemos. Minha geração, nascida na década de 1940, é tributária dos filmes de Hollywood, nos quais os mocinhos eram sempre homens louros, de olhos claros, e os bandidos se assemelhavam a latino-americanos ou indígenas. O mesmo nas HQs da Disney, como o Pato Donald, nos quais os aborígenes figuravam como inferiores e ignorantes. A “bíblia” dos racistas é o livro do francês J.A. Gobineau, lançado em 1853, “Ensaio sobre a desigualdade das raças humanas”. Ali o filósofo francês aplica aos povos os parâmetros usados na zoologia para classificar espécies animais. O primeiro a denunciar essa falácia foi outro francês, Claude Lévi-Strauss, em 1952, em seu livro “Raça e história”, uma reação ao uso e abuso do termo pelos nazistas. O antropólogo francês retomou o assunto em “A cor das ideias”, de 1971, no qual desmascara os silogismos raciais com base na ciência. A genética comprova que o DNA é comum a todos os seres humanos. E as diferenças não derivam dos genes, e sim da convivência com outras pessoas que nos transmitem o patrimônio imaterial – idiomas, tradições, costumes, valores, gostos. Somos de diferentes etnias, que resultam da cultura, não raças, que supostamente resultariam da constituição biológica. Vale lembrar que não há ninguém mais culto do que outro. Há distintas culturas socialmente complementares. É um erro confundir níveis de escolaridade com níveis de cultura. O físico nuclear que não sabe cozinhar depende, para sobreviver, da cultura culinária de sua cozinheira. A humanidade sempre se dividiu entre seres “superiores” e seres “inferiores”. A suposta superioridade não deriva da cor da pele, como alegam brancos racistas. Deriva das ferramentas empoderadoras, como o dinheiro e os recursos bélicos, que forjam a ideologia de que as características do dominador legitimam a sua superioridade em relação ao dominado. Assim, os romanos da época do império tratavam os estrangeiros como “bárbaros” e os colonizadores europeus se atribuíam direitos e privilégios negados aos povos colonizados. Para os espanhóis e portugueses que invadiram a América Latina, os povos originários eram ignorantes. Os ibéricos jamais tiveram olhos para reconhecer a imensa riqueza cultural das nações indígenas, como os maias, que utilizaram o zero antes dos europeus e faziam previsões meteorológicas tão acertadas que, ainda hoje, intrigam os cientistas. Jorge Luis Borges, no conto “O idioma analítico de John Wilkins” escreve que “não há classificação do Universo que não seja arbitrária e conjectural”. E cita como exemplo a enciclopédia chinesa intitulada “Empório Celestial de Conhecimento Benevolente”, onde consta que os animais se dividem em 14 categorias. A última é a dos que “de longe parecem moscas.” Vistos à distância, do alto da arrogância e prepotência, os demais seres humanos “parecem moscas”. Isso vale para o olhar do estadunidense preconceituoso frente aos africanos; do branco frente aos negros; do cristão frente ao muçulmano; do homem frente à mulher; do habitante da cidade frente aos indígenas. Por isso, a categoria “raça” é tão conveniente para legitimar preconceitos e discriminações. Sabemos todos que os recursos do planeta se aproximam do limite. Exceto um: o ser humano. Somos o único recurso abundante na face da Terra, até mesmo porque nossa reprodução exige poucas calorias e nos dá imenso prazer. Daí o esforço de tentar naturalizar as diferenças, de modo a justificar a exploração, a submissão e a exclusão. Admitir que somos todos dotados das mesmas características biológicas e da mesma dignidade significa uma ameaça aos que detêm os meios de controle de uns sobre os outros, da riqueza da elite em relação aos pobres, e até da força física do homem em relação à mulher. Certas palavras devem ser definitivamente eliminadas do vocabulário. Não existe raça, existe sim racismo, que do mesmo modo deve ser banido da convivência humana. Publicado originalmente no Correio da Cidadania. Modos de acabar com uma raça A revolta do escritor Lima Barreto contra o racismo