Zona Curva

aumento da desigualdade

O maior condomínio de luxo do mundo

Não sei quantos amigos meus têm contato direto com os pobres, além de faxineiras, cozinheiras, garagistas etc. Mas quase todos sabem que faço ponte entre pessoas muito pobres e/ou excluídas e o mundo dos remediados e ricos. Com frequência, promovo campanhas, como a de Quaresma, e coleto cestas básicas, medicamentos e outros bens imprescindíveis. A pobreza é aterradora e humilhante. Ninguém a escolhe. A rigor, o que existem são empobrecidos. Pessoas que foram levadas pelas estruturas de nossa sociedade a ficarem privadas de direitos básicos, como alimentação, saúde e educação. Morei cinco anos em uma favela, em Vitória. E há décadas assessoro movimentos populares. Por isso, conheço casos como o de dona Rosa, que nunca teve oportunidade de passar do segundo ano do ensino fundamental. Empregada doméstica (sem carteira assinada), casou e teve cinco filhos. O marido, desempregado, deu pra beber. E espancá-la. Rosa se separou e foi despedida do emprego porque passou a levar o filho mais novo, de dois anos, por não ter com quem deixá-lo. Agora sobrevive da solidariedade de vizinhos e amigos. Em novembro de 1989 caiu o Muro de Berlim. Em outubro, estive em Berlim Oriental. Vi a muralha desabar. E brotou a grande esperança de que, a partir de então, o mundo não mais teria muros segregadores. Vã expectativa. Dois acontecimentos fizeram surgir novos muros: a queda das torres gêmeas, nos EUA, a 11 de setembro de 2001, e a crise dos refugiados em 2015, quando um milhão deles ocuparam a Europa. Como estrutura física dois muros se destacam: o erguido por Israel para segregar os palestinos, e o que a Casa Branca estende na fronteira dos EUA com o México (3.145 km) para tentar conter a onda migratória. Segundo Frank Jacobs, atualmente há pelo menos 70 fronteiras muradas em todo o mundo. A União Europeia é, hoje, o maior condomínio fechado do mundo. Outros países também trancam as portas, como Japão, Austrália, Nova Zelândia e Coreia do Sul. Esse seleto grupo de países, incluídos EUA e Canadá, abriga apenas 14% da população mundial e, em 2009, possuía 73% da riqueza global. Os 86% da população mundial extramuros sobrevivem com apenas 27% da renda total. Dentro do condomínio, a renda média mensal é de 2.500 euros. Fora, apenas 150 euros. As 50 melhores cidades do mundo em qualidade de vida estão dentro do condomínio. A guerra da Coréia, na década de 1950, rachou a península coreana em duas. A zona desmilitarizada, que separa a Coréia do Sul da Coréia do Norte, e serve de “muro”, se estende por 248 km. É considerada intransponível, a ponto de os desertores do Norte preferirem escapar pela fronteira com a China. No norte da África, se destaca a cerca de fronteira que separa as cidades espanholas de Ceuta e Melilla do território de Marrocos. Toda em arame farpado e construída em 1993, a cerca, equipada com sofisticados sensores, tenta deter o fluxo de migrantes da África subsaariana. O Muro de Evros, edificado em 2012, separa a Turquia da Grécia e impede que imigrantes ilegais acessem por ali a União Europeia. A Índia constrói, atualmente, a cerca de 4.000 km – o Muro de Bengala – que a separa de Bangladesh, sob a alegação de evitar a entrada de contrabandistas e terroristas. Na realidade, ali o fluxo migratório se caracteriza por fuga da pobreza e das mudanças climáticas. Algumas barreiras são entre bairros, como os Muros de Paz que, em Belfast, na Irlanda do Norte, separa as comunidades católicas/nacionalistas das comunidades protestantes/loyalistas. O maior deles, com 1 milhão de tijolos, divide a propriedade protestante Springmartin do Parque Católico de Springfield. No Brasil, proliferam condomínios fechados, como Alphaville, em São Paulo, e o AlphaVilla, em Belo Horizonte. No Rio, eles se multiplicam sobretudo na Barra da Tijuca, onde se ergue uma réplica da Estátua da Liberdade. Um dos projetos dos bilionários para desfrutarem com tranquilidade seus excessivos luxos é construir ilhas móveis, nas quais teriam seus condomínios privados. Com a vantagem de se moverem pelos mares do mundo, escaparem das leis e se protegerem de qualquer risco de assaltos ou sequestros. Isso enquanto não conseguem colonizar o planeta Marte e transferir para lá suas utopias paradisíacas. Contudo, o muro mais maciço e intransponível se situa no coração humano. É o preconceito, o fundamentalismo, a discriminação e a arrogância que mais criam barreiras entre os seres humanos e cimentam as gritantes desigualdades sociais. Retratos do Brasil e da América Latina Ricos pagam menos impostos

Combater a fome e o veneno na alimentação

Fome – A alimentação é o direito humano número 1. No Brasil, 19 milhões de pessoas (9% da população) padecem de fome crônica, agravada pela pandemia, o desemprego, o aumento dos preços dos alimentos (o maior desde 2003) e, sobretudo, o desgoverno Bolsonaro. A insegurança alimentar moderada e grave afetou 21,5% da população em 2004; 10,3% em 2013; e em 2020 chegou a 20,5% (Rede Penssan – Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania Alimentar e Nutricional). Hoje, 116 milhões de pessoas no Brasil se encontram em insegurança alimentar, ou seja, não sabem o que haverão de comer no dia seguinte ou não têm acesso a uma alimentação que contenha nutrientes essenciais. Em 2004, a pobreza atingia 21,5% da população brasileira. Dez anos depois (2014) foi reduzida para 8,4%. Subiu para 11% na recessão de 2015-2016, e para 16% no primeiro semestre de 2021. A Ação Coletiva Comida de Verdade, rede integrada por 13 movimentos comprometidos em promover segurança alimentar, identifica 310 iniciativas de sistemas alimentares inclusivos e sustentáveis no Brasil, de hortas comunitárias a cooperativas e campanhas de financiamento coletivo. Dessas 310, 58,9% se dedicam à comercialização, como feiras agroecológicas e distribuição de cestas da agricultura familiar. E 31% são ações solidárias destinadas a facilitar o acesso a alimentos de grupos vulneráveis; e 7,5% resultam de políticas públicas. Desde o lançamento do programa Fome Zero, no governo Lula, se propõe às prefeituras cancelar o IPTU de lotes e terrenos baldios que forem cedidos por seus proprietários ao cultivo de hortas comunitárias. Em 1950, segundo censo do IBGE, 2/3 da população brasileira (64%) viviam na zona rural. No último censo, de 2010, eram 84% nas cidades e 16% na zona rural. Isso se traduz em favelas, desemprego, violência e, sobretudo, consumo de alimentos industrializados de pouco valor nutricional. O MST é, hoje, o maior produtor de arroz orgânico da América Latina, isto é, sem insumos como adubo químico e agrotóxico. Aliás, esses produtos encareceram na pandemia, afetando o preço dos alimentos. No MST, o pacote de 1kg de arroz custa de R$ 7 a 8. No Rio Grande do Sul, o movimento espera colher, para a safra de 2022, 300 mil sacas. No início de 2021, foram 248 mil sacas, no valor de R$ 20 milhões, e 130 mil continuam em estoque, pois a maior dificuldade é escoar a produção, já que o principal comprador é o governo, a Conab e o Programa Nacional de Alimentação Escolar. E em se tratando de produtos do MST… a Conab não tem aberto leilões para adquirir produtos da agricultura familiar. Nem o governo federal se mostra interessado em manter estoques reguladores. O Brasil é o terceiro país do mundo a utilizar agrotóxicos, atrás da China e dos EUA (FAO). Em 2019, foram vendidas no Brasil 620 mil toneladas de agrotóxicos (Ibama). Desse total, 38,3% são “altamente ou muito perigosos”, 59,3% “perigosos” e apenas 2,4% “pouco perigosos”. O governo Bolsonaro flexibilizou o registro dos agrotóxicos. Desde a lei de 1989, se evitava aprovar qualquer um que contivesse substâncias que causam distúrbios respiratórios graves, câncer, mutação genética, má formação fetal, Parkinson, além de alterações hormonais e reprodutivas. O decreto de 7 de outubro deste ano (10.833/2021) aprovou o “pacote de veneno”. Reduz o prazo de aprovação dos agrotóxicos, aumenta a participação do Ministério da Agricultura e cria “limites seguros” para que substâncias antes proibidas sejam aprovadas. As entidades contrárias à medida dizem que o Brasil tem grande potencial de produzir biodefensivos, mas o governo as ignora. De janeiro a setembro de 2021 foram liberados no Brasil 1.215 agrotóxicos (Diário Oficial). Entre 2005 e 2015 o ritmo de aprovação era cerca de 140 por ano. Este ano já foram liberados 345. Dos produtos usados no Brasil, 30% possuem substâncias ativas proibidas em países europeus, como atrazina, acefato e paraquate. Este último herbicida, utilizado em plantios de algodão, milho e soja, foi vetado em 2017, mas se permitiu usar o estoque até julho deste ano. Está proibido em 37 países. Provoca Parkinson nos agricultores. Desde 1997, os agrotóxicos recebem incentivos fiscais do governo. Ao permitir a desoneração de até 60% do ICMS no comércio dos venenos, os estados deixam de arrecadar R$ 6 bilhões por ano! Uma das principais fontes de venenos na alimentação são os ultraprocessados. O governo deveria regular a publicidade, elevar os impostos e obrigá-los a estampar rótulos de advertência, como no cigarro. A partir de outubro de 2022, produtos com alta concentração de sódio, açúcar e gorduras saturadas deverão expor os índices em suas embalagens. A dieta in natura é mais cara que consumir ultraprocessados, cujo maior custo decorre de embalagem, transporte e propaganda. Os ultraprocessados são feitos, não para alimentar, e sim para incentivar o consumo excessivo. Refrigerantes, por exemplo, não se destinam a matar a sede, e sim viciar o consumidor. Favorecem a obesidade, a hipertensão e o diabetes. E o pior: aqui são incentivados pelo governo. Refrigerantes fabricados na Zona Franca de Manaus recebem subsídios na forma de créditos tributários. Em setembro, o Idec denunciou que 59,3% dos produtos ultraprocessados apresentam resíduos de agrotóxicos. Entre 27 produtos, mais da metade continha resíduos de glifosato ou glufosinato – dois herbicidas muito usados em plantações de soja, milho e algodão. Segundo a Agência Internacional de Pesquisa em Câncer, ligada à Organização Mundial de Saúde (OMS), o glisofato causa câncer. Aparece em salgadinhos, bisnaguinhas, biscoitos de água e sal, bolachas recheadas, cereais, pães de trigo e bebidas de soja, itens muito consumidos por crianças e adolescentes. A Anvisa, que controla o índice de agrotóxicos em produtos orgânicos, não o faz quando se trata de industrializados. O agronegócio reconhece que, nos últimos 30 anos, a área de plantio no Brasil cresceu apenas 50% e, graças ao uso de agrotóxicos, a produção de grãos aumentou em 360%! (CropLife Brasil). Salva-se a bolsa, danam-se as vidas! Publicado originalmente no Correio da Cidadania. Tá osso! Norte e Nordeste voltam a ser esquecidos no faminto Brasil de Bolsonaro

Norte e Nordeste voltam a ser esquecidos no faminto Brasil de Bolsonaro

    Fome – A intensificação da crise econômica durante o governo Bolsonaro fez o Brasil retornar aos patamares de insegurança alimentar obtidos em 2004, ano em que o programa “Fome Zero” começou a vigorar. A segurança alimentar apresenta níveis caóticos em todo o país e as desigualdades regionais intensificam ainda mais a situação da fome. Segundo o Inquérito Nacional Sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, realizado pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional (Rede Penssan), as regiões Norte e Nordeste apresentaram queda de 40% e 30% respectivamente, na segurança alimentar das famílias, isso ocorre quando a família tem alimentos garantidos para suas refeições. Já a insegurança alimentar grave, a fome propriamente dita, cresceu 18,1% na região Norte e 13,8% no Nordeste. Juntamente a esses números, a inflação, a crise sanitária e um governo relapso em políticas públicas contribuem para a intensificação da fome no Brasil. Jair Bolsonaro ignora os 19 milhões de brasileiros que passam por essa situação quando declara aos seus fiéis eleitores do cercadinho  que “a esquerda fala que a gente não come arma, come feijão, quando alguém invadir a tua casa, você dá tiro de feijão nele”.   Enquanto sua gestão extingue ferramentas importantes para o combate à fome no Brasil como o Consea (Conselho Nacional de Segurança Alimentar) e o Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome, ela sugere a compra de armas de guerra para uma população onde cerca de 14% dos domicílios vivem com uma renda per capita de até meio salário mínimo, o equivalente a 596 reais por pessoa.  Segundo um estudo da Fundação Getúlio Vargas ,itens básicos para o dia a dia como o arroz e o feijão, alimento principal no prato dos brasileiros, tiveram alta de mais de 60%, até mesmo o café, que foi o carro chefe da exportação durante décadas, está mais caro. A desigualdade social é um mal que assola o Brasil desde sua colonização, mas a fome e a extrema pobreza eram assuntos prioritários das políticas governamentais até o final do primeiro governo Dilma em 2014, ano em que o país deixou o Mapa da Fome da ONU.  A ascensão da extrema direita e seu descaso com os pobres deixaram pautas importantes para o Brasil como o combate à fome e a desigualdade social em alguma gaveta perdida do Ministério da Economia, Por outro lado, houve crescimento dos bilionários no país, conforme pode ser lido no texto abaixo. Governo Bolsonaro agrava o fosso da desigualdade A disparidade regional, que vinha sendo combatida com programas como o Bolsa Família e a transposição do rio São Francisco, se intensificou desde então. O acesso restrito à água e a densidade domiciliar auxiliaram na transmissão da Covid-19 nas regiões mais carentes do país. De acordo com o relatório da Rede Penssan, o fornecimento irregular de água ou a falta de água potável atinge cerca de 40% dos domicílios da região norte. Além disso, o mesmo percentual de moradias na região conta com um cômodo per capita, o que dificulta o isolamento social. O desemprego também é maior nessas mesmas localidades. Na região norte, 20% dos entrevistados pelo estudo tiveram um membro do lar dispensado de suas ocupações, e cerca de 55,3% tiveram que realizar cortes em despesas essenciais. Quando olhamos para a região nordeste, os dados são mais assustadores, apesar do número de desempregados ser quase o mesmo (20,4%), 61,4% dos entrevistados pelo estudo tiveram que reduzir gastos vitais. Em meio ao caos em que vivem milhões de brasileiros por incompetência do governo federal, coube à sociedade civil se organizar para combater a fome. O Movimento dos Trabalhadores sem Teto (MTST) construiu 16 cozinhas solidárias em 10 estados, incluindo Alagoas, Sergipe, Ceará, Rondônia e Sergipe, com o objetivo de servir ao menos uma refeição gratuita por dia. Já o Movimento dos Trabalhadores Sem Terra (MST) doou mais de 5 mil toneladas de alimento para as populações mais carentes, além de um milhão de marmitas. Fonte: Inquérito Nacional Sobre Insegurança Alimentar no Contexto da Pandemia da Covid-19 no Brasil, realizado pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar e Nutricional   Fome per capita do Brasil e Jonathan Swift Fome, outra pandemia Desigualdade social: Ricos ganham 36 vezes mais que os pobres no Brasil, segundo IBGE

Tá osso!

“Coitado, morrera na areia do rio, onde haviam descansado, à beira de uma poça: a fome apertara demais os retirantes e por ali não existia sinal de comida” (Graciliano Ramos em Vidas Secas)   A fome não é um evento natural, um lance do acaso, não é incidental, alhures: a fome é um projeto de governo, uma estratégia propositada de poder, de aprofundamento das desigualdades sociais, pelas classes dominantes (empresariais, políticas, jus-midiáticas) para dominação, contenção e controle social privilegiando um sistema/modelo de uma economia agroexportadora, exploratória, offshore. É a mesma simetria do planejamento oitocentista reservado aos escravos e imigrantes pela mercantilização coagida e exploração da força de trabalho. A alimentação está diretamente relacionada à qualidade de vida, ao direito básico elementar de bem-estar de todo cidadão, como a saúde, trabalho, moradia, liberdade, segurança em caso de invalidez, velhice etc., enfim, tantos outros direitos e garantias sociais retirados do dia a dia dos trabalhadores. A ponte para o atraso – As políticas de segurança alimentar vêm sofrendo um gravíssimo desmantelamento a partir da austeridade fiscal clientelista e o descaso das políticas de combate à fome a partir da gestão de Michel Temer, que assumiu a presidência após a articulação de um golpe, intensificado pelo execrável governo Bolsonaro. Hoje cerca de 20 milhões de brasileiros passam fome e 120 milhões convivem com alguma insegurança alimentar. Segundo recente relatório da ONU para a Agricultura e Alimentação aponta que, de 2018 a 2020, mais de 23% da população brasileira tiveram “falta moderada ou severa” de alimentos. Com isso, 49,6 milhões de pessoas, incluídas as crianças, deixaram de comer por falta de dinheiro ou reduziram de forma relevante a quantidade e qualidade de alimentos ingeridos. Os cortes orçamentários na Segurança Alimentar e Nutricional do Plano Plurianual (PPA) em 2017 durante o governo Temer (em comparação com 2014) foi de 76%, valores que diminuíram de R$ 478 milhões para R$ 294 milhões. Já o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), uma das principais políticas públicas de fortalecimento da agricultura familiar no Brasil, sofreu uma redução de 40% no orçamento. De acordo com a Articulação no Semiárido Brasileiro (ASA) o número de pessoas atendidas diminuiu de 91,7 mil para 41,3 mil, uma redução de 55% no número de famílias alcançadas. É criminosa a redução orçamentária de programas e metas do Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PLANSAN) 2014/2018, senão vejamos:   Programas e metas, com base em dados do Conselho Nacional de Segurança Alimentar (CONSEA)    Ano 2014 (R$) Ano 2018(R$) Redução(%) Distribuição de alimentos para grupos populacionais tradicionais (cestas básicas) 82 milhões 27,4 milhões 67% Apoio ao desenvolvimento sustentável das comunidades quilombolas, povos               indígenas, povos e comunidades tradicionais 6 milhões 0  (zero) 100% Assistência Técnica e Extensão Rural para famílias assentadas e extrativistas (ATES) 357 milhões 19,7 milhões 94% Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) 1,3 bilhões 431 milhões 67% Programa ‘Água para Todos” (cisternas) 248,8 milhões 40,8 milhões 94% Assistência Técnica e Extensão Rural para famílias assentadas e extrativistas (ATES) 357 milhões 19,7 milhões 94%   A ponte para a tragédia  –  Em seu primeiro dia de governo, o presidente Jair Bolsonaro já demonstrava as atrocidades e violências pretendidas ao  editar a Medida Provisória 870, alterando as atribuições e a estrutura dos ministérios e dos órgãos ligados à Presidência da República. Por meio dela, a Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (Losan, Lei 11.346/2006) sofreu alterações profundas, tendo como consequência prática a extinção do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA – órgão de assessoramento com a competência institucional de apresentar proposições e exercer o controle social na formulação, execução e monitoramento das políticas de segurança alimentar e nutricional). O atual governo de ocupação militar tem seguido a mesma orientação de desmonte e entrega do Estado pela especulação, agiotagem e favorecimento do mercado financeiro rentista através de nítida configuração fascista de destruição de direitos trabalhistas e previdenciários, aniquilamento das garantias sociais, precarização das relações de trabalho, com impactos diretos na renda de famílias, onde a perversidade, a morte e o desamparo são a tônica deste nefasto governo. É uma política de Estado criminoso onde a ausência de vontade política e vagabundagem explícita levam à indexação da economia ao dólar, decorrente dos privilégios ofertados à agroexportação e ao mercado financeiro, determinando a inflação de alimentos. Com isso, milhões de brasileiros deixam de se alimentar, comprometendo, sobretudo, a vida de milhões de crianças. A insegurança alimentar atinge hoje um quarto (1/4) dos brasileiros. O Brasil ainda enfrentou no ano de 2020 o aumento de 14,09% no preço dos alimentos, 10 (dez) pontos percentuais acima da inflação no período, conforme o Índice de Preços ao Consumidor. Segundo estudos do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), a desvalorização do real é decorrente do fomento, dos privilégios à exportação e das indústrias de ultraprocessados, criando uma economia voltada ao mercado e ao lucro, em detrimento da geração de empregos, renda e do combate ao aumento da pobreza. Tais medidas, além de incentivarem o desmatamento e a contaminação por agrotóxicos, criam um ambiente favorável a conflitos pela terra e ataques às populações tradicionais e aos agricultores familiares. Durante a pandemia, enquanto inúmeros países seguraram os estoques de suas produções, o Brasil continuou exportando, colocando em riscos seus trabalhadores e não fazendo um estoque regulatório. Somente no período de abril/2020 a abril/2021, o preço das commodities agrícolas utilizadas na indústria de alimentos variou de 20% a 100%, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia). De acordo com o levantamento, insumos como milho, soja e arroz subiram 84%, 79% e 59%, respectivamente, ao longo do período analisado. Já o trigo e o leite tiveram alta de 37%, enquanto o café 36% e o açúcar 40%. Hoje temos um governo inepto e irresponsável que extinguiu o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA) e não promove as reuniões da Câmara Interministerial de Segurança Alimentar (CAISAN), órgão que tem a responsabilidade de atuar na elaboração de políticas, planos e monitoramentos alimentar. A fome e o morticínio são uma política macabra de Estado criminoso, infame e

Governo Bolsonaro agrava o fosso da desigualdade

Desigualdade social – O compromisso do governo federal com o 1% dos brasileiros mais ricos e o desprezo pela vida intensificaram nosso crônico problema da desigualdade social. Levantamento publicado no ano passado pelo banco suíço UBS mostra que o aumento da riqueza acumulada por bilionários foi de 99%, em comparação com 2009. A desigualdade se reflete no prato vazio do brasileiro. Segundo o estudo “Efeitos da Pandemia na Alimentação e na Situação da Segurança Alimentar no Brasil”, coordenado por pesquisadores da Universidade Livre de Berlim e colaboração da Universidade Federal de Minas Gerais e Universidade de Brasília, cerca de 59% da população brasileira vive em situação de insegurança alimentar. Esse termo abrange desde casos de fome extrema até insuficiência nutricional, causadas pelo baixo poder de compra. A extinção do Consea (Conselho Nacional de Segurança Alimentar) e do Ministério de Desenvolvimento Social e Combate à Fome, ambos em 2019, demonstra a falta de compromisso do governo Bolsonaro com os mais pobres. Com o aumento dos preços de itens básicos do dia a dia, a população mais carente enfrenta, todos os dias, dificuldade para manter o padrão de vida conquistado no governo Lula. Os gastos com os combustíveis estão pesando ainda mais no bolso do brasileiro durante a pandemia. De acordo com o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), só em 2021, houve nove aumentos no preço da gasolina, com acúmulo de 27% no preço de janeiro a julho. Em algumas regiões do país, o litro já ultrapassou R$7,00. Em recente live, o presidente Jair Bolsonaro relacionou os aumentos ao ICMS (Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços), mas, segundo a ANP (Agência Nacional do Petróleo), o valor administrado pelos estados se manteve na média dos últimos anos, não contribuindo significativamente para alteração do valor dos combustíveis. Além do preço da comida e da gasolina, outra conta aumentou e tem preocupado grande parte dos brasileiros: a da energia elétrica. A Aneel (Agência Nacional de Energia Elétrica) definiu o novo valor da tarifa extra que será cobrada. A bandeira vermelha, que definia R$9,49 a cada 100KWh, chegará a R$14,20 a partir desse mês. Esse aumento, segundo a Agência, está relacionado à crise hídrica que acomete o país. O vice-presidente Hamilton Mourão declarou que medidas de racionamento estão sendo cogitadas. Um estudo feito pela organização Oxfam Brasil mostrou que, em 2018, a distribuição de renda estacionou pela primeira vez no país desde 2000. A grave crise econômica que estamos mergulhados desde 2015 atinge os brasileiros de diferentes formas, conforme o gênero, a cor e a classe social. Segundo o estudo, entre 2016 e 2017, os brancos mais ricos tiveram ganhos de rendimentos de 17,35%, enquanto os negros obtiveram menos que a metade, apenas 8,1%. De acordo com o pesquisador do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), Pedro Herculano de Souza, a concentração de renda no topo da pirâmide é quase constante, e as pioras mais profundas no grau de desigualdade econômica acontecem em momentos de graves crises. A crise sanitária e a inação do governo federal estão proporcionando o aumento da inflação que não foi acompanhado por um proporcional reajuste no valor do salário-mínimo. Só em julho, por exemplo, o IPCA mostrou que a inflação teve seu maior avanço no mês desde 2002, chegando a 0,96%. Desde o ano passado, mais 67,7 milhões de brasileiros buscam se manter com o auxílio emergencial, enquanto isso, cerca de 42 pessoas lucraram mais que todo o valor destinado à população em maior situação de vulnerabilidade econômica no país durante a pandemia de Covid-19, segundo o relatório “Quem Paga a Conta? – Taxar a Riqueza para Enfrentar a Crise da Covid na América Latina e Caribe”, da Oxfam. Souza identifica três períodos de agravamento da desigualdade do país: o fim da República Velha e o Estado Novo (em primeiro), entre 1926 e 1945, o início da ditadura de 1964, e a crise econômica e política dos anos 1980, período marcado pela hiperinflação. Conforme a análise de Souza, entre 1942 e 1943, o 1% mais rico da população pulou de 20% para 30% da arrecadação de toda a renda nacional. Isso ocorreu principalmente porque a elite pouco se opôs ao governo autoritário de Getúlio Vargas, ampliando seus privilégios durante o regime vigente. Dessa forma, houve maior enriquecimento dos que se encontravam no topo da pirâmide, enquanto a população mais pobre perdia direitos e vivia em condições ainda mais difíceis. Ainda segundo o pesquisador, durante a ditadura militar (1964-1985), foi rompida a tendência de queda na concentração de renda que estava acontecendo nas duas décadas anteriores. Norte e Nordeste voltam a ser esquecidos no faminto Brasil de Bolsonaro Essa evolução na distribuição que estava em curso foi fruto de políticas como a do aumento do salário-mínimo em 100%, proposta pelo então ministro João Goulart, em 1953 (leia mais sobre o mandato de Jango como ministro de Vargas no texto de Fernando do Valle aqui no Zonacurva). Com condições trabalhistas mais favoráveis, os proletários passaram a viver um momento de maior participação econômica, o que diminuiu o déficit em relação aos mais ricos. Já nos primeiros anos da segunda metade da década de 1960, o 1% mais rico da população passou de 17% a 26% no acúmulo de renda nacional. Esse aumento é consequência de uma das medidas econômicas vigentes no período: a redução de 30% no valor do salário mínimo. Essa diminuição deixou a classe trabalhadora em situação desfavorável, deixando-os mais pobres e impedindo a evolução da distribuição de renda. Além disso, a repressão a sindicatos e atividades de mobilização popular impossibilitou a classe mais pobre de reivindicar seus próprios direitos e lutar por melhoria na qualidade de vida. Depois disso, no período de transição democrática dos anos 1980, que ficou conhecido como “década perdida”, 30% da renda nacional ficou concentrada no 1% mais rico do país. Uma pesquisa mostrada no artigo “A history of inequality: Top incomes in Brazil, 1926–2015”, publicada pelo pesquisador Pedro Herculano Souza, compara a concentração de renda do topo da pirâmide socioeconômica,