Zona Curva

Aumento da fome no Brasil

Aumentam os casos de furtos famélicos no Brasil

Pesquisa realizada pela Rede Brasileira de Pesquisa em Soberania e Segurança Alimentar (Rede PENSSAN) mostrou que 19 milhões de brasileiros se encontram em estado de insegurança alimentar grave no país. O desespero que abate essa parte da população tem levado ao surgimento de vários casos de furtos famélicos.  Basicamente, o furto famélico ocorre quando se rouba comida, medicamento ou outro item fundamental à existência humana e não há nenhum tipo de violência. Geralmente, a punição é branda, mas, em alguns casos, juízes que não se sensibilizam com a pobreza dessas pessoas, insistem em condenar a pessoa em situação de grave vulnerabilidade.  Um caso que tomou grande proporção nacional foi o da Rosângela Sibele, que furtou dois pacotes de macarrão instantâneo, duas garrafas de refrigerante, um pacote de suco em pó e foi presa em São Paulo. O Tribunal de Justiça de São Paulo chegou a negar o pedido de habeas corpus de Rosângela duas vezes. O caso foi levado até o Superior Tribunal de Justiça (STJ), que decidiu arquivar o processo, considerando o furto dos produtos, que totalizaram R$ 21, insignificante. Alguns comerciantes tentam evitar o furto de alimentos como no açougue do supermercado Extra, no Jardim Ângela, zona sul de São Paulo, que só entrega bandejas vazias aos clientes após a pesagem, a carne mesmo só após os pagamentos. A medida comprova também como a grande maioria dos brasileiros teve que cortar a carne de seu cardápio devido aos altos preços.  O mesmo aconteceu em um mercado da rede Dia, no bairro de Campos Elíseos, que trancou embalagens de carnes, assim como fazem com itens de maior valor como cigarros e bebidas alcoólicas, a atitude também foi tomada em apenas uma unidade.  Comida no prato ou no tanque de combustível? O aumento da fome e a ascensão dos novos bilionários A dura realidade brasileira Governo Bolsonaro agrava o fosso da desigualdade Desigualdade social: Ricos ganham 36 vezes mais que os pobres no Brasil, segundo IBGE https://urutaurpg.com.br/siteluis/a-desumanizacao-do-trabalhador/ Quem não paga imposto no Brasil?    

Fome per capita do Brasil e Jonathan Swift

Mas a média per capita jamais explicará por que se temos dois frangos para dois homens, portanto, a média de 1 para cada homem, um deles pode comer dois frangos, enquanto o outro apenas saliva Fome Brasil – O estímulo para esta coluna veio da notícia da Folha de São Paulo: “Produção de comida per capita sobe no país, mas fome avança mesmo na fartura”. Parece mais um dos paradoxos sociais que a matemática não explica. Ora, se temos mais comida no país, o natural seria menos fome para o povo. Mas a média per capita jamais explicará por que se temos dois frangos para dois homens, portanto, a média de 1 para cada homem, um deles pode comer dois frangos, enquanto o outro apenas saliva. Assim é no mundo capitalista. Mas os economistas ao modo de Guedes, ou os fascistas à moda Bolsonaro, fazem de conta que de nada sabem. E gargalham. Podem até dizer, “lá vêm esses comunistas com mania de distribuição de riqueza…”. E depois, quem sabe se os necessitados de comida não ganhem uma imunidade de rebanho, isto é, depois de multidões morrerem, os sobreviventes se acostumem ao regime de ossos e lixo. Claro, até onde houver carniça para todos miseráveis. Em segundo lugar, o título acima gera outro paradoxo: para haver divisão de coisas por cabeça, é preciso que haja um número de coisas para a divisão. E como vamos medir o que não se mede, mas apenas se sente como uma atração animal, primária, fundamental? Ninguém pode falar, “no tempo em que eu tinha fome 90 ou fome 100”. Mas bem podemos falar em números para a fome, quando medimos as desgraças associadas a ela. Falemos, portanto, em desnutrição ou mortalidade infantil. Falemos em números de pelagra, de tuberculose, de raquitismo. Ai teremos tristes números para contar. Ainda assim, que estranho, os economistas não falem em “raquitismo per capita”, ou em destruição de pessoas por cabeça. O que, para os economistas de salão, de Posto Shell, faz sentido. Diabo de falar de miséria da gentalha, rá-rá-rá-rá. Então vamos à razão do nome destas linhas. O Swift lá de cima não é a carne enlatada Swift, apesar da vinculação à carne impossível nos dias de hoje. O título no alto se refere ao imortal escritor Jonathan Swift, que tem sofrido, à semelhança de outros grandes autores satíricos, um amaciamento, uma domesticação póstuma como escritor para crianças. Ele é, para a maioria do mundo, o autor de As Viagens de Gulliver, um livro que se tornou cômico, engraçado, fantasioso, sobre os anõezinhos de Lillipute. Ora, esse livro recontado para crianças e adolescentes (e todo inferno do mundo existe para os clássicos “recontados”, infantilizados) é, em si, no original, uma sátira à sociedade inglesa e a todas as sociedades. O livro fala, por exemplo, da cobrança de impostos sobre os vícios e desvarios, mas recomenda que o bom senso e a boa índole não deveriam ser taxados, porque não valeriam o custo da arrecadação. E agora atingimos o cerne de Swift e da fome do povo brasileiro. O gênio do escritor irlandês possui uma das mais ferozes sátiras contra a degradação e miséria do povo em qualquer parte do mundo. Mas como se falasse somente para os pobres da Irlanda, em “Uma Modesta Proposta” ele sugere, com o ar mais sério, o que seria uma bela fórmula para reduzir a pobreza, O caso não é de vômito, é de verdade crua contra o sistema que mata ou fere a dignidade dos pobres. No texto, fala a santa ira de Swift: “É motivo de melancolia para aqueles que passeiam por esta grande cidade, ou que viajam pelo campo, verem nas ruas, nas estradas, e às portas das barracas, uma multidão de pedintes do sexo feminino, seguidas por três, quatro, ou seis crianças, todas em farrapos, a importunarem cada passante pedindo esmola.   Foi-me garantido por um muito sábio americano do meu conhecimento, em Londres, que uma criança jovem e saudável, bem alimentada, com um ano de idade, é do mais delicioso, o alimento mais nutriente e completo – seja estufada, grelhada, assada, ou cozida. E não tenho qualquer dúvida de que poderá igualmente ser servida de fricassé ou num ragu. Uma criança dará duas doses numa festa de amigos; e se for a família a jantar sozinha, os quartos da frente, ou de trás, proporcionarão um prato razoável. Se temperada com um pouco de sal ou pimenta e cozida, estará ainda bem conservada no quarto dia, especialmente no Inverno. Fiz as contas e, em média, um recém-nascido pesará 12 libras e, se aceitavelmente tratado, durante um ano solar aumentará para 28 libras. Concedo que esta comida venha a ser de certo modo cara e, portanto, estará muito adequada aos senhores – e dado que estes já devoraram a maior parte dos pais, poderão ter direito de preferência sobre os filhos. Também já calculei as despesas para alimentar cada filho dos pedintes (em cuja lista incluo todos os que vivem em barracas, trabalhadores rurais, e quatro-quintos dos lavradores) que será de cerca de dois xelins por ano, trapos incluídos. E creio que não incomodará nenhum cavalheiro pagar dez xelins por uma boa carcaça de criança gorda, a qual, como já disse, dará quatro pratos de carne, excelente e nutritiva, quando tiver apenas um amigo particular ou a sua própria família a jantar consigo. Assim o proprietário rural aprenderá a ser um bom senhor, aumentando a sua popularidade entre os seus rendeiros; a mãe terá uns oito xelins de lucro líquido e estará apta a trabalhar até produzir outra criança. Quanto à nossa cidade de Dublin, podem destinar-se a este propósito as secções mais convenientes, e os talhantes podem ficar descansados que não terão falta de clientela. Embora eu antes recomende que se comprem as crianças vivas, e sejam temperadas ainda quentes da faca, como o fazemos com os porcos. Os procriadores constantes, além do ganho de oito xelins esterlinos por ano pela venda de cada filho, ficarão livres

Tá osso!

“Coitado, morrera na areia do rio, onde haviam descansado, à beira de uma poça: a fome apertara demais os retirantes e por ali não existia sinal de comida” (Graciliano Ramos em Vidas Secas)   A fome não é um evento natural, um lance do acaso, não é incidental, alhures: a fome é um projeto de governo, uma estratégia propositada de poder, de aprofundamento das desigualdades sociais, pelas classes dominantes (empresariais, políticas, jus-midiáticas) para dominação, contenção e controle social privilegiando um sistema/modelo de uma economia agroexportadora, exploratória, offshore. É a mesma simetria do planejamento oitocentista reservado aos escravos e imigrantes pela mercantilização coagida e exploração da força de trabalho. A alimentação está diretamente relacionada à qualidade de vida, ao direito básico elementar de bem-estar de todo cidadão, como a saúde, trabalho, moradia, liberdade, segurança em caso de invalidez, velhice etc., enfim, tantos outros direitos e garantias sociais retirados do dia a dia dos trabalhadores. A ponte para o atraso – As políticas de segurança alimentar vêm sofrendo um gravíssimo desmantelamento a partir da austeridade fiscal clientelista e o descaso das políticas de combate à fome a partir da gestão de Michel Temer, que assumiu a presidência após a articulação de um golpe, intensificado pelo execrável governo Bolsonaro. Hoje cerca de 20 milhões de brasileiros passam fome e 120 milhões convivem com alguma insegurança alimentar. Segundo recente relatório da ONU para a Agricultura e Alimentação aponta que, de 2018 a 2020, mais de 23% da população brasileira tiveram “falta moderada ou severa” de alimentos. Com isso, 49,6 milhões de pessoas, incluídas as crianças, deixaram de comer por falta de dinheiro ou reduziram de forma relevante a quantidade e qualidade de alimentos ingeridos. Os cortes orçamentários na Segurança Alimentar e Nutricional do Plano Plurianual (PPA) em 2017 durante o governo Temer (em comparação com 2014) foi de 76%, valores que diminuíram de R$ 478 milhões para R$ 294 milhões. Já o Programa de Aquisição de Alimentos (PAA), uma das principais políticas públicas de fortalecimento da agricultura familiar no Brasil, sofreu uma redução de 40% no orçamento. De acordo com a Articulação no Semiárido Brasileiro (ASA) o número de pessoas atendidas diminuiu de 91,7 mil para 41,3 mil, uma redução de 55% no número de famílias alcançadas. É criminosa a redução orçamentária de programas e metas do Plano Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (PLANSAN) 2014/2018, senão vejamos:   Programas e metas, com base em dados do Conselho Nacional de Segurança Alimentar (CONSEA)    Ano 2014 (R$) Ano 2018(R$) Redução(%) Distribuição de alimentos para grupos populacionais tradicionais (cestas básicas) 82 milhões 27,4 milhões 67% Apoio ao desenvolvimento sustentável das comunidades quilombolas, povos               indígenas, povos e comunidades tradicionais 6 milhões 0  (zero) 100% Assistência Técnica e Extensão Rural para famílias assentadas e extrativistas (ATES) 357 milhões 19,7 milhões 94% Programa de Aquisição de Alimentos (PAA) 1,3 bilhões 431 milhões 67% Programa ‘Água para Todos” (cisternas) 248,8 milhões 40,8 milhões 94% Assistência Técnica e Extensão Rural para famílias assentadas e extrativistas (ATES) 357 milhões 19,7 milhões 94%   A ponte para a tragédia  –  Em seu primeiro dia de governo, o presidente Jair Bolsonaro já demonstrava as atrocidades e violências pretendidas ao  editar a Medida Provisória 870, alterando as atribuições e a estrutura dos ministérios e dos órgãos ligados à Presidência da República. Por meio dela, a Lei Orgânica de Segurança Alimentar e Nutricional (Losan, Lei 11.346/2006) sofreu alterações profundas, tendo como consequência prática a extinção do Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA – órgão de assessoramento com a competência institucional de apresentar proposições e exercer o controle social na formulação, execução e monitoramento das políticas de segurança alimentar e nutricional). O atual governo de ocupação militar tem seguido a mesma orientação de desmonte e entrega do Estado pela especulação, agiotagem e favorecimento do mercado financeiro rentista através de nítida configuração fascista de destruição de direitos trabalhistas e previdenciários, aniquilamento das garantias sociais, precarização das relações de trabalho, com impactos diretos na renda de famílias, onde a perversidade, a morte e o desamparo são a tônica deste nefasto governo. É uma política de Estado criminoso onde a ausência de vontade política e vagabundagem explícita levam à indexação da economia ao dólar, decorrente dos privilégios ofertados à agroexportação e ao mercado financeiro, determinando a inflação de alimentos. Com isso, milhões de brasileiros deixam de se alimentar, comprometendo, sobretudo, a vida de milhões de crianças. A insegurança alimentar atinge hoje um quarto (1/4) dos brasileiros. O Brasil ainda enfrentou no ano de 2020 o aumento de 14,09% no preço dos alimentos, 10 (dez) pontos percentuais acima da inflação no período, conforme o Índice de Preços ao Consumidor. Segundo estudos do Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos (Dieese), a desvalorização do real é decorrente do fomento, dos privilégios à exportação e das indústrias de ultraprocessados, criando uma economia voltada ao mercado e ao lucro, em detrimento da geração de empregos, renda e do combate ao aumento da pobreza. Tais medidas, além de incentivarem o desmatamento e a contaminação por agrotóxicos, criam um ambiente favorável a conflitos pela terra e ataques às populações tradicionais e aos agricultores familiares. Durante a pandemia, enquanto inúmeros países seguraram os estoques de suas produções, o Brasil continuou exportando, colocando em riscos seus trabalhadores e não fazendo um estoque regulatório. Somente no período de abril/2020 a abril/2021, o preço das commodities agrícolas utilizadas na indústria de alimentos variou de 20% a 100%, segundo a Associação Brasileira da Indústria de Alimentos (Abia). De acordo com o levantamento, insumos como milho, soja e arroz subiram 84%, 79% e 59%, respectivamente, ao longo do período analisado. Já o trigo e o leite tiveram alta de 37%, enquanto o café 36% e o açúcar 40%. Hoje temos um governo inepto e irresponsável que extinguiu o Conselho Nacional de Segurança Alimentar e Nutricional (CONSEA) e não promove as reuniões da Câmara Interministerial de Segurança Alimentar (CAISAN), órgão que tem a responsabilidade de atuar na elaboração de políticas, planos e monitoramentos alimentar. A fome e o morticínio são uma política macabra de Estado criminoso, infame e