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A TV pode ter sido decisiva no fracasso do golpe bolsonarista dia 8

O golpe de estado de extrema direita previsto para o domingo dia 8 de janeiro pode ter sido abortado por algo que não estava nos cálculos dos conspiradores: o papel das redes de televisão com a transmissão ao vivo a invasão da Praça dos Três Poderes e a posterior depredação da sede do Supremo Tribunal Federal, do Congresso e do Palácio do Planalto. Tudo indica que o ataque aos três prédios públicos mais importantes do país visava criar o caos político e com isto justificar uma intervenção militar a pretexto de restabelecer a ordem. Mas o objetivo acabou frustrado quando milhões de brasileiros testemunharam ao vivo, pela TV, a irracionalidade da ação dos bolsonaristas de extrema direita, que rapidamente perderam eventuais simpatias de quem assistia tudo à distância. A participação da televisão no desfecho dos acontecimentos ainda é um tema que merece maior detalhamento para identificar se foi algo pensado politicamente ou foi fruto do entusiasmo jornalístico em testemunhar cenas que a maioria das pessoas achavam improváveis de acontecer. O fato é que a TV Globo, por exemplo, ao interromper sua programação normal no canal aberto tomou uma decisão que além de política tinha também desdobramentos comerciais, porque os espaços publicitários foram adiados por várias horas. Outra decisão crucial foi a de formar uma rede entre o canal aberto e o fechado (Globo News) para aumentar a audiência. A emissora também convocou quase todos os seus jornalistas especializados em política para incorporar-se à cobertura, contactando fontes nos diversos níveis do aparato governamental, para explicar e complementar o que estava sendo mostrado ao vivo. Simbolismos políticos A TV Globo também tomou uma decisão carregada de simbolismo político de instruir repórteres, apresentadores e comentaristas para que eles tratassem como terroristas, golpistas e vândalos os participantes da invasão da Praça dos Três Poderes em Brasília. Este é o tipo de classificação que só pode ter sido decidida nos mais altos escalões da empresa pois as redações nunca tiveram a autonomia suficiente para acrescentar adjetivos à protagonistas de eventos políticos. Outras emissoras também adotaram o mesmo enfoque dos participantes da tentativa de golpe de estado com gradações e adjetivos diferentes, como foi o caso da CNN e da Bandeirantes. As exceções foram a SBT, Record e Jovem Pan que mantiveram sua orientação bolsonarista e rotularam a depredação como um protesto e seus autores como manifestantes, seguidores do ex-presidente, derrotado nas eleições presidenciais de outubro do ano passado. Caso estudos mais aprofundados venham a comprovar esta hipótese sobre a influência da transmissão ao vivo pela TV e do posicionamento das emissoras no tratamento dos participantes do ataque a prédios públicos em Brasília, no dia 8, estaremos diante de um caso inédito em que a comunicação e o jornalismo podem ter evitado um golpe de estado usando a informação visual como arma principal. O possível papel estratégico do audiovisual sinaliza uma mudança nos comportamentos políticos uma vez que a imagem, em tempo real, apela mais às emoções do que à reflexão. Até agora a imprensa escrita tinha um papel predominante porque os principais atores políticos priorizavam a racionalidade e a lógica nas ações de grande envergadura. Já se sabia que uma imagem apela mais para o emocional do que para o racional, mais para os impactos informativos do que para a reflexão analítica. Mas o que a cobertura televisiva dos eventos de domingo, 8 de janeiro, pode estar nos mostrando é a importância de entender como imagens impactantes sobre questões complexas podem acabar gerando mudanças de percepções individuais e coletivas em tempo curtíssima, sem o recurso a reflexão analítica. As armadilhas políticas das fake news O ecossistema informativo nacional no governo Lula Resumo da ópera golpista no Brasil

Resumo da ópera golpista no Brasil

Golpe Brasil – Nunca uma ação terrorista foi tão anunciada como a que aconteceu neste domingo em Brasília. Desde há semanas, as redes bolsonaristas mostravam a organização da marcha até a capital federal com o intuito de tomar o Congresso, o STF e o Planalto. Vídeos, material de propaganda, lives, tudo circulando sem qualquer pejo. Os acampamentos em frente aos quartéis serviram como incubadoras de todo o furdúncio. Foi uma grande ingenuidade pensar que ali estavam apenas os velhos e as tias do uatizapi. Quem acompanha as redes sabe que desde o resultado das eleições, a extrema direita está organizando esse povo e preparando a estrada do golpe. Não é um movimento espontâneo. Tudo muito bem articulado e financiado. Mais de 100 ônibus chegaram à Brasília em tempo recorde. Milhares de pessoas uniformizadas com a camisa da seleção foram organizadas e conduzidas pela Polícia Militar de Brasília para a Esplanada dos Ministérios no que eles chamaram de “Greve Geral”. Apesar do pedido de reforço da segurança do Congresso e do STF, que pressentiu o perigo, o governo do Distrito Federal não mobilizou as tropas para a proteção do patrimônio público e, apesar dos bolsonaristas não serem muito numerosos, em pouco tempo, eles tomaram os três principais pontos da capital numa ação rápida e sem qualquer bloqueio. Havia pouquíssimos policiais acompanhando a caminhada e as seguranças locais não tiveram como segurar a turba que quebrou as vidraças, entrou nos locais e promoveu uma destruição insana. Gente defecou sobre as mesas, obras de arte foram danificadas e até portas foram arrancadas. A invasão durou horas, sem que o governador do DF tomasse qualquer atitude, portanto, ficou absolutamente claro que a ação foi permitida. Basta lembrar que, em outros momentos da história, com muito mais gente na Esplanada, o contingente de segurança sempre foi grande e a repressão duríssima. Desta vez, não. Os bolsonaristas chegaram a atacar policiais e jogaram dentro do espelho de água os carros da segurança do Congresso. Uma festa. Bolsonaro e o Secretário de Segurança do DF acompanharam tudo de Orlando, juntos. É importante ressaltar que não houve incompetência. Foi uma inação deliberada, preparada, planejada. Por outro lado, o governo federal também foi incompetente em não definir um plano de defesa para esse dia. Deixar na mão do inimigo foi um erro. Havia quer tido um plano B. Depois de toda a destruição feita, a polícia chegou e foi dispersando os bolsonaristas. Até agora 300 pessoas foram presas. Há informes de que os financiadores do ônibus já foram identificados, mas nenhum foi preso. Há focos de atos terroristas em frente a algumas refinarias no Paraná e em outros lugares do país há trancamento de vias, inclusive a Marginal Tietê, uma das principais vias de São Paulo, sem que a polícia tome qualquer atitude. Há também um chamamento para os caminhoneiros pararem o país. A organização segue firme e sistemática, sem que os incitadores do golpe sejam cerceados. Divulgadores de mentiras e incitadores do caos seguem transmitindo sem problemas. O ministro Alexandre de Moraes ordenou o desmonte dos acampamentos bolsonaristas em todo o país. Em Brasília, os acampados estão saindo tranquilamente com suas malas e travesseiros, dando risada e sem qualquer intimidação. Os mesmos que ontem destruíram o Congresso, o STF e o Planalto. A Polícia apenas acompanha, quando não interage de maneira simpática. Algo impensável numa manifestação de trabalhadores, por exemplo. Também o Exército, em Brasília, protege os acampados com carros blindados. Agora, no rescaldo da ação terrorista é que vai ser possível ver de que material é feito o governo eleito. Vai atuar com energia contra os terroristas? Vai atacar os peixes graúdos? Sim, porque essa turba está sendo financiada e organizada por gente grande. A mão da justiça chegará neles? O que fará com relação as Forças Armadas? Continuará deixando o caso nas mãos do STF? O que aconteceu neste domingo é um entre tantos eventos que vem se repetindo desde o golpe contra a Dilma em 2016. Como Lula vai enfrentar o núcleo desta trama que são as Forças Armadas? Este é o ponto central, como alerta o professor Nildo Ouriques. Segundo ele, há que colocar na reserva todos os generais que conspiram, à luz do dia, contra o país. Movimentos sociais e partidos de esquerda foram às ruas ontem (segunda-feira) em todo o país em defesa da democracia.   O universo paralelo do fanatismo bolsonarista   A TV pode ter sido decisiva no fracasso do golpe bolsonarista dia 8   Vamos falar de golpe?    

Ainda falta o terceiro turno

A campanha bolsonarista foi abertamente criminosa. Perdeu, mas ficou impune. E seguiu naturalizando esse privilégio, nos posteriores deboches à norma constitucional. Como previsto, a sucessão de golpes que pariu o governo Bolsonaro tornou-o tão ilegítimo que o deslocou para fora do regime da legalidade. Assim termina o mandato. Talvez (ainda) não haja muito a fazer na seara governamental, pois o Congresso aliou-se ao banditismo. Individualmente, porém, a história é bem outra. O caminhoneiro que expõe crianças, o policial prevaricador, o líder dos piquetes, o jurista mentiroso, a deputada pistoleira, todos podem e devem ter punição imediata. Não há controvérsias, brechas legais ou direitos a preservar. São criminosos notórios, em atividades documentadas, de ampla repercussão pública. Assim como os hábitos ilícitos durante a Campanha de Bolsonaro e todo seu governo, o vandalismo fascista aproveita a cumplicidade e a omissão das cúpulas judiciárias. A anistia é um projeto institucional. Ou acreditamos realmente que nossos heróis togados não conseguem identificar os organizadores dos ataques? Que não têm prerrogativa para meter nazistas na cadeia? Um ano atrás alertei que as autoridades atiçavam o golpismo fingindo combatê-lo. Agora fingem surpresa diante dos ataques mais previsíveis do universo. Não basta liberar estradas, recolher pistolas, abrir sindicâncias, bloquear contas digitais. Não estamos lidando com ameaças ou tentativas, e sim com delitos flagrantes. Perdoar delinquentes é o exato oposto da pacificação. É um desatino incendiário que alimenta a instabilidade social e convida o golpismo a alargar seus limites. Enquanto nos contentamos em tirar bodes da sala, os facínoras ganham adeptos e melhoram sua organização. Hoje voltam para casa. Amanhã saem armados. E depois? Sem uma ação imediata e rigorosa do Judiciário, a posse de Lula ocorrerá no meio de batalhas campais. E ele presidirá um país à beira da guerra civil. A esquerda otimista ri dos patetas, mas continua com medo de sair à rua usando roupa vermelha. Sonha com a Bolívia de Arce e periga despertar no Chile de Allende. O que falta é pressão de democratas corajosos. Menos chororô perplexo e mais atitude efetiva. As instituições precisam responder para quem, afinal, estão funcionando. Vai ter golpe? Pós-democracia La vai o Brasil descendo a ladeira

O universo paralelo do fanatismo bolsonarista

Fanatismo – Quem entra num grupo de discussão bolsonarista se depara com um torvelinho de alucinações. As mensagens que chegam tratam dos temas mais esdrúxulos. Há alertas sobre alienígenas do bem que estão na terra para guiar os humanos para a luz. Existem denúncias contra o Papa Francisco, que seria pedófilo e comedor de fetos. Há denúncias contra Obama que seria responsável pelo tráfico de crianças. Tem mensagens motivacionais com o nome de Jesus. Há denúncias de satanismo praticado por gente de esquerda. Há teorias de que figuras como John Kennedy Júnior estaria vivo e pronto para assumir a presidência dos Estados Unidos, bem como estariam vivos também a Princesa Diana, Elvis Presley e Michael Jackson. Também há a teoria dos clones segundo a qual vários governantes mundiais já estariam mortos e no seu lugar estariam clones, como era o caso da Rainha Elisabeth e agora do presidente Putin. O grupo acolhe canais no Youtube de figuras absolutamente alucinadas como é o caso de um rapaz chamado Luciano Cesa. Ele, que se diz “artista musical” e discípulo do Senhor Deus, fala com tamanha propriedade sobre essas teorias todas, como se verdades absolutas fossem. E faz previsões e prognósticos verdadeiramente delirantes. A criatura tem mais de 300 mil seguidores. Durante a operação da Nasa para mudar a rota de um asteroide, ele divulgava que o asteroide iria cair sobre a terra e que havia uma luta desesperada dos Estados Unidos para impedir isso. Orientava as pessoas a fazerem estoque de alimentos e aguardarem em casa o desfecho, pois podia dar errado e o mundo ser destruído. E pasmem. As pessoas viveram aquele episódio aterrorizadas, mandando mensagens, chamando filhos e pais para perto, porque tudo podia se acabar. Então, fizeram estoques de comida. Agora, durante as eleições, anunciavam a vitória estrondosa de Bolsonaro porque deus estava no comando. Quando os números começaram a virar, as mensagens que chegavam eram de que o Exército Brasileiro estava interceptando estradas digitais que vinham dos Estados Unidos com hackers de esquerda tentando fraudar os resultados. E as mensagens vinham com gráficos e tudo mais. Também parece que estava havendo alguma interferência de alienígenas do mal. Então, vencidas as eleições pelo satanismo do PT, as mensagens que circulam são de que é preciso ir para a rua para fazer valer o artigo 142 da Constituição, que segundo eles, autoriza as Forças Armadas a tomar o poder. São milhares de mensagens chegando e circulando numa velocidade estonteante. Como os bloqueios foram desarticulados, começaram a surgir áudios dos filhos de Bolsonaro (verdadeiros ou não, não se sabe) orientando o pessoal a se reunir em frente aos quartéis. Segundo os áudios não é para falar em Bolsonaro, apenas pedir a “intervenção federal”.  Por quê? Ninguém sabe ao certo. O argumento é que o Lula é ladrão e satânico e por isso tem de ser impedido de chegar à presidência. Assim,  lá foi a turba fanática para frente dos quartéis. Em alguns lugares, o número foi expressivo, mas na maioria o grupo foi pequeno. Nos atos, as  cenas são delirantes. Alguém sobe num carro e fala ao povo: “Temos a informação de que o exército tem provas da fraude nas eleições”. Gritaria geral, palmas, rezas e lágrimas. As pessoas acreditam piamente em tudo que qualquer um diz ao microfone. Em outra manifestação, alguém anuncia que o ministro Alexandre de Moraes acabou de ser preso. De novo, a histeria, os gritos, lágrimas e palmas. São informações absolutamente mentirosas que apenas servem para manter o grupo unido e em ação. A fala do presidente Bolsonaro, que não reconhece a eleição nem a vitória de Lula, é interpretada como um apoio seguro aos atos anti-Constituição e de fanatismo. E todos seguem firmes. A segunda fala do presidente, vestido de camiseta à moda Zelenski, pedindo que eles saiam das estradas, também foi interpretada como falsa. Os gurus dos grupos dizem que aquele que falou é um clone, que Bolsonaro está preso, sendo obrigado a falar o que “eles” querem. A última agora é a chamada para matar o presidente eleito. Como nada deu certo, a única coisa que resta é eliminar o Lula para que ele não assuma. Até mesmo o famoso piloto de Fórmula 1, Nelson Piquet, esteve nos atos golpistas e declarou que quer ver Lula no cemitério. E a considerar o nível de alienação dos fanáticos que estão hipnotizadas por essa enxurrada de absurdos, é preciso ficar bem alerta. Porque certamente não faltará quem decida cumprir a tarefa. Tudo isso acontece sob o beneplácito do judiciário, bem como de parte da polícia militar. Durante os bloqueios policiais, ajudaram a romper cercas, fizeram continência para os golpistas e deram proteção. Sob o argumento da liberdade de expressão, essas figuras grotescas que disseminam mentiras seguem pregando e incitando os grupos. A incitação à violência e à morte segue firme nos grupos e nos uatizapis familiares. Mesmo que tudo siga aparentemente normal no país, os ataques fanáticos seguirão.  Um grupo de teatro infantil foi impedido de se apresentar por conta de uma ação violenta que destruiu o palco enquanto as crianças choravam em desespero. E por aí vai. Caso não haja uma ação efetiva por parte do judiciário, isso não vai parar e qualquer um que não esteja com Bolsonaro é inimigo mortal. Na hora, a pessoa vira petista, satânico, pedófilo, traficante de crianças, comedor de fetos e aliado dos alienígenas do mal. Portanto, alvos. Os tempos são turvos. Bolsonarismo em xeque Dois toques sobre a eleição no Brasil Evento debate a estratégia da extrema direita nas redes sociais

Evento debate a estratégia da extrema direita nas redes sociais

A Fundação Fernando Henrique Cardoso (FHC) realizou no dia 19 de julho um webinar sobre “A força da extrema direita nas redes sociais: ideologia e estratégia” para entender como opera o bolsonarismo. Para debater a respeito, convidaram dois pesquisadores que coordenam o Observatório da Extrema Direita (OED): Guilherme Casarões, doutor e mestre em ciência política pela Universidade de São Paulo (USP), e Isabela Kalil, mestre e doutora em antropologia social pela USP. O evento foi mediado por Sérgio Fausto, cientista político e diretor geral da Fundação FHC. Nossa repórter Letícia Coimbra participou do evento e nos conta o que de melhor rolou no papo.  Internet amplificou o alcance da extrema direita Abrindo os trabalhos, Isabela Kalil, uma das maiores estudiosas do bolsonarismo no país, afirmou que a internet não criou pessoas de extrema direita. Segundo ela, essas pessoas já conviviam conosco, mas as redes sociais abriram a possibilidade de que certas atitudes e discursos ganhassem visibilidade. “Essas práticas não são novas, mas ganham um meio de se amplificar”, afirmou.  Segundo Guilherme, a extrema direita tem conexões por todo o mundo e considera que, no Brasil, Olavo de Carvalho foi o maior influenciador da sua articulação, quando ainda em 2013, fazia transmissões no Google Hangouts com Bia Kicis, Allan dos Santos, família Bolsonaro e outras figuras desse campo no país. Grupos bolsonaristas Guilherme Casarões separa o bolsonarismo em três categorias: Grupos de interesse (não são necessariamente nativos das redes, mas usam as plataformas): evangélicos, armamentistas, empresários e médicos; Criadores de narrativas que sustentam a extrema direita: ultracatólicos, jornalistas e influenciadores; Tropa de choque (disseminam as ideias): vaporwave (memes com estética retrô e futurista), gamers, cidadãos de bem e robôs do Bolsonaro. De acordo com ele, os grupos agem no movimento em quatro etapas: emulação: reprodução de ideias da extrema direita global; adaptação: traduzir para a realidade brasileira; coordenação: articulação entre os membros dos grupos; legitimação: adesão de seguidores, corroboração interna e validação externa (com grupos da extrema direita estrangeira intensificando o movimento). Um dos exemplos citados pelo pesquisador é o caso do grupo dos armamentistas, que reproduzem discursos como o de Marjorie Taylor-Greene, política e teórica da conspiração da extrema direita que atua na Geórgia, nos Estados Unidos, coordenado por olavistas, influenciadores e jornalistas. Esse grupo também se legitima através da ocupação de espaços políticos no governo e no legislativo. Como exemplo de armamentista é citado o deputado Daniel Silveira, que foi preso por ordem do STF. Como age a extrema direita brasileira Segundo Kalil, a manifestação do dia 15 de março de 2020, que pedia o fechamento do Congresso Nacional, inaugurou a sequência de atos antidemocráticos e “o uso de uma tecnologia política”. A pesquisadora explica que devido à pandemia, a estratégia foi transportada para a internet e desembocou em evento negacionista em relação à pandemia. Ela diz que os bolsonaristas falam em códigos nas redes, usando, por exemplo, o artigo 142 para se referir  indiretamente à intervenção militar. Além disso, para entrar nos trending topics do Twitter, tendem a usar termos em inglês ou antigos, como, por exemplo, a hashtag #bolsonaroday porque têm maior chance de ficar nos assuntos mais comentados da plataforma. Isabela Kalil lembra de pesquisa da Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FespSP), realizada em parceria com a Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), que mostrou que 55% dos compartilhamentos dessa hashtag foram feitos por usuários com comportamento inautêntico, ou seja, por robôs (máquinas) e ciborgues (robôs administrados por seres humanos). A pesquisadora ressalta que robôs não votam, mas podem influenciar a opinião pública. Casarões diz que o grupo olavista abriu caminho no serviço digital e que a extrema direita se utiliza de pessoas que nasceram na era digital para montar sua estratégia, se valendo de uma comunicação simples e direta, enquanto a esquerda brasileira tem um vocabulário academicista, que torna mais difícil o entendimento da população. Kalil destacou que a direita não tem medo de errar, e o efeito que estão colhendo agora é fruto de pelo menos uma década de empenho.   Mais audiência para o bolsonarismo A pesquisadora afirmou também que a esquerda tende a se comunicar com a própria bolha, enquanto a extrema direita tende a falar para a oposição. Ela explica que, para os bolsonaristas, é rotineiro e comum o que eles dizem, e por isso não se dão tanta relevância. Segundo ela, os progressistas tendem a repercutir e compartilhar esses absurdos, dando audiência e em alguns casos aumentando a popularidade da extrema direita. “A verdade é que o campo progressista trabalha de graça para a extrema direita, o tempo todo”, afirma Isabela Kalil. Sobre o que compartilhar ou não, Kalil explica que se a insanidade foi proferida por alguém que ocupa um cargo elevado como Bolsonaro, não adianta evitar repercutir, porque ele já tem muito destaque. Mas, no caso de influenciadores médios ou pessoas anônimas, é importante não repassar porque aumenta a visibilidade da pessoa em questão. Presença da extrema direita nas redes independe do resultado eleitoral “Bolsonaro é uma figura sebastianista que representa o movimento, mesmo fora do governo, não sairá dos holofotes”. Como referência, Guilherme Casarões cita o movimento conservador nos EUA, e afirmou que apesar de Trump não estar mais na presidência, o trumpismo se enraizou na sociedade. Se mesmo em democracias consolidadas, a extrema direita tem o seu lugar, no Brasil, não será diferente e que o lugar ocupado pode ser ainda maior. Isabela Kalil acredita que o movimento veio para ficar, principalmente no meio digital. Ela diz que o número de ultradireitistas usando a internet representa pouco em comparação com a população em geral, mas eles podem influenciar a opinião pública sem que percebam. A pesquisadora usou como exemplo a desconfiança do sistema eleitoral mesmo entre as pessoas moderadas, que podem se sentir desmotivadas a votar devido a isso.  “Por que eu vou sair da minha casa e votar se é tudo fake, manipulado?”, disse. Segundo ela, esse movimento de Bolsonaro descredibilizar as urnas eletrônicas e todo o processo eleitoral

Doença mental sob o desgoverno Bolsonaro

Me refiro ao desequilíbrio mental em brasileiros dignos, estudiosos, necessários para o desenvolvimento econômico e cultural em nosso país. Acompanhem, por favor, e vão notar que não exagero No momento em que escrevo, percebo mais uma trágica semelhança entre o golpe militar de 1964 e o fascismo em 2021 da presidência do Brasil. Eu me refiro ao desequilíbrio mental em brasileiros dignos, estudiosos, necessários para o desenvolvimento econômico e cultural em nosso país. De modo mais preciso, há uma relação direta entre Bolsonaro e ditadura militar, entre fascismo e doença mental em pessoas do Brasil. Acompanhem, por favor, e vão notar que não exagero. Em primeiro de abril de 1964, assim encontrei Ivan, amigo de adolescência. Ele era o meu amigo mais velho, e isso quer dizer: ele está sobre a cama, no 1º de abril de 64, agitado, movendo-se de um lado para outro do seu leito de capim seco. E me diz e geme: – Tem umas cobrinhas subindo pelas minhas costas. E bate com as mãos, para retirá-las. E mais se agita: – Eles vêm me pegar. Eles vão me levar. – Eles quem, Ivan? – Eles, eles – e eles se confundem às cobrinhas, que lhe sobem pelas costas. Este Ivan não é mais Ivanovitch Correia da Silva. O Ivan de antes era um jovem de 19 anos, estudante de Química. Passava o dia todo a estudar, todos os dias. Com um método sui generis, como ele gostava de dizer. Entre uma fórmula e outra me recebia na única mesa da sua casa. E se punha a contar anedotas, a contar casos de meninos suburbanos, espertos, anárquicos, galhofeiros. E sorria, e ria, e gargalhava, porque ao contar, ele era público e personagem, e de tanto narrar histórias de meninos moleques deixava na gente a impressão de ser um deles. Como um Chaplin que fosse Carlito. Se na vida da gente houver algo que nos perca, que mergulhe no abismo a natureza que já se acha perdida, ele contava, e contava a rir, a soltar altíssimas gargalhadas o caso que foi a sua perdição: – Na greve dos estudantes da Faculdade de Direito, eu fui lá para prestar solidariedade aos estudantes. Eu estava só no meio da massa, assistindo à manifestação. Aí chegou o fotógrafo da revista O Cruzeiro. Quando ele apontou o flash, eu me joguei na frente dos estudantes. Olha aqui a foto. E mostrava uma página em que ele aparecia de braços abertos, destacado, em queda, como um jogador de futebol em um brilhante jogada, em voo sobre as palavras de ordem “viva Cuba, yankees go home, reforma agrária na lei ou na marra”. Sorrindo em queda livre o meu amigo na página da revista O Cruzeiro. Por isso ele gargalhava antes do golpe, porque saíra em edição nacional da revista. Por isso no primeiro de abril de 1964, ele se diz, esta é a lógica: “Umas cobrinhas atrás de mim… Eles vêm me pegar! As cobrinhas estão subindo em mim. Mãe, me tira essas cobrinhas!” Assim foi. Perdemos Ivanovitch desde primeiro de abril de 1964. Eu pensava que a loucura em um amigo antes era coisa do passado. A gente é assim, tem sempre a esperança ingênua de que o trágico é passado. “Já passou, já passou, não dói mais”, não é? Mas eis que recebo em 28 de outubro de 2021 esta mensagem: “Conversei ontem, pelo telefone, com nosso amigo X. Ele não está nada bem. Ele ficou insistindo o tempo todo que ia ser preso. Que existem pessoas na porta, de tocaia, esperando para arrastá-lo até a prisão. Que vai ser preso, torturado e morto. Eu perguntei que crime ele havia cometido para ser preso. Mas ele me respondeu algo confuso, sem sentido algum. Depois, conversei longamente com a sua companheira. Então ela me disse que ele cria essas histórias fora da realidade. É uma situação desesperadora”. Notam a semelhança entre os dois casos? Com Ivan, os militares viriam buscá-lo. Com o amigo X. os fascistas agora vêm pegá-lo, porque é um homem de opiniões de esquerda. Ele é um mestre, doutor, professor universitário, portanto apto a perseguições dos fascistas. E tais casos de doença mental não são particulares. Especialistas afirmam que a pandemia da covid-19 deu origem a outra pandemia, a dos transtornos e doenças mentais. Mas há uma clara relação entre doença, desgraça e governo fascista, que se espalha até mesmo por territórios antes sagrados dos indígenas brasileiros, segundo relatório do Cimi (Conselho Indigenista Missionário): “Em muitas aldeias, a pandemia levou as vidas de anciões e anciãs que eram verdadeiros guardiões da cultura, da história e dos saberes de seus povos, representando uma perda cultural inestimável. A responsabilidade principal está no âmbito federal, com um presidente que faz discursos dizendo que os indígenas têm que melhorar de vida a qualquer custo, que defende liberar garimpo, exploração econômica”. Pandemias e negacionismo do vírus pela presidência, com seus ataques à ciência e aos direitos humanos, perseguições a mestres e cientistas, muitas vezes acendem o medo, a ansiedade e comportamentos problemáticos. Quando o medo assume o controle, tanto o sistema nervoso quanto a parte emocional do cérebro ficam sobrecarregados, falam especialistas. Se uma pessoa possui doença mental ou histórico de ansiedade e depressão, pode piorar e se intensificar em momentos como este do Brasil de hoje. Agora, compreendem o que pude ver. Ivan em 1964, quando a extrema direita tomava o poder, o amigo X hoje, quando os valores do fascismo voltam, perseguem e destroem. A história não se repete, mas seus pesadelos são semelhantes. A pedra da loucura só está na cabeça do outro?   Governar pelo medo Ricardo Lísias e a catástrofe em curso no Brasil

Bolsonarismo em xeque

O CONVERSA AO VIVO ZONA CURVA do dia 9 de setembro (quinta) contou com a participação da pesquisadora, professora e antropóloga da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Letícia Cesarino. Ela conversou com Fernando do Valle (editor  Zonacurva) e Luís Lopes (editor Vishows) sobre bolsonarismo, a maneira pela qual esse grupo utiliza as redes digitais pra propagar seu discurso extremista e os descaminhos do atual cenário político brasileiro. Cesarino comentou a intensificação do caos político causado pelas manifestações antidemocráticas do presidente no dia 7 de setembro. Segundo ela, a convocação foi uma forma de manter a base aliada de Bolsonaro mobilizada. A antropóloga analisou também a ambiguidade, sempre presente nos discursos do presidente, e as estratégias escolhidas para se manter no poder. Segundo nossa entrevistada, foi previsível a suposta mudança de postura de Bolsonaro depois da pressão contra os discursos de viés inconstitucional que Bolsonaro proferiu tanto em Brasília como em São Paulo. Após ser criticado por lideranças políticas sobre a explícita ameaça golpista de Bolsonaro, o site do governo publicou uma nota, assinada pelo presidente e, pasmem, escrita pelo ex-presidente Michel Temer afirmando nunca ter tido “nenhuma intenção de agredir quaisquer dos Poderes” e que a culpa foi “do calor do momento”. Após quase 3 anos de governo, Cesarino explicou que as estratégias da direita bolsonarista estão ficando ultrapassadas, o que pode diminuir sua eficácia: “As táticas começam a ficar batidas e repetitivas. O próprio ecossistema deles já demonstra sinais de exaustão, observada no comportamento dos próprios seguidores”, afirmou a pesquisadora que já analisou grupos de whatsapp e telegram de “fãs” do presidente. A antropóloga também considera que a base aliada de Bolsonaro se apoia em narrativas superficiais na tentativa de desvincular os graves problemas socioeconômicos de qualquer responsabilidade do mandatário do governo central. Na tática falsamente antissistema do presidente, a culpa é sempre dos outros, podem ser comunistas, governadores, petistas e até do próprio povo. Com isso, o presidente, que pouco trabalha, segue levando no bico seus seguidores. Acerca do desenvolvimento das relações sociais e políticas através das redes, a antropóloga projeta uma rearticulação de posições radicalizadas no futuro, já que a extinção da mediação é pouco provável. “De um lado, temos o especialista tecnocrático que não está disposto a ouvir os leigos. No outro extremo, existe o populismo sem freios. Acredito que, com o tempo, haverá um meio termo nisso”, disse ela. Cesarino explicou ainda que a estruturação das redes sociais avança constantemente de forma sistemática para aumentar o tempo de tela do usuário e sua passividade, o que diminui a capacidade de tecer pensamento crítico. Segundo ela, grupos bolsonaristas se adequam facilmente a esse sistema midiático e o usam a seu favor. “Hoje, as notícias falsas fazem parte da estrutura da internet”, afirmou. Ao utilizar métodos imediatistas e simplistas, que apelam ao lado emocional das pessoas, os bolsonaristas recortam a realidade a seu bel prazer nas redes para torná-la favorável ao governo. “Eles ignoram a existência de estatística e amostragem, isso não funciona naquele ambiente”, completa. Com colaboração de Carolina Raciunas. https://urutaurpg.com.br/siteluis/extrema-direita-nas-redes/ O universo paralelo do fanatismo bolsonarista Mil dias de destruição e mortes

Brasil: segue o “bonde” da destruição

7 de setembro – O presidente do país segue governando na lógica do factoide, imitando seu ídolo Donald Trump. Parece não ter se dado conta do que aconteceu lá na matriz que tanto ama. A tática do factoide não deu certo. Trump foi derrotado fragorosamente. Por aqui, os marqueteiros do presidente continuam incentivando a mesma toada que, ao que parece, só serve mesmo para animar a sua plateia cativa. Foi o que se viu. As chamadas “lideranças” dos atos que visavam invadir o STF e cortar a cabeça do ministro Alexandre Moraes foram presas, responderão na justiça, e provavelmente serão abandonadas para que se virem como possam. Milhares foram para Brasília armados da esperança de que os comunistas finalmente seriam eliminados – física e politicamente. Eram de impressionar os áudios e vídeos, que circulavam pela rede bolsonarista, sobre estocar comida, remédio, água e trancar as janelas porque a coisa seria estrondosa. Não foi. O que se viu foi um discurso pífio, tentando reanimar a claque para outro “amanhã”. O golpe seria adiado e fora só um susto no ministro, o qual não será mais obedecido “sob hipótese alguma”. Os seguidores mais renitentes voltaram para casa ainda sob o efeito da catarse, prontos para a nova investida que virá quando o presidente chamar. Outros voltaram desiludidos. Esperavam o apocalipse, ainda que no momento em que a polícia atuou, muito gentilmente, aliás, queriam que gravassem vídeos desesperados em meio à correria, gritando que era um absurdo a polícia tentar impedi-los de chegar ao STF. Estranha gente que pede ditadura e sequer entende o que isso possa significar. O Brasil esperou o desenrolar dos fatos. Uns com medo, outros comendo pipoca em frente à televisão e uma grande parte em luta, nos atos de protesto contra a carestia da vida e a falta de um governo para enfrentar os grandes dramas nacionais como a fome e as crises hídrica e energética. As redes de televisão deram visibilidade para as manifestações dos dois lados e foi possível avaliar com bastante informação as duas frentes de batalha. Os atos pró-governo foram grandes em São Paulo e Brasília, mas também deixaram claro sobre quem são esses aliados, na sua maioria uma classe média alta que sequer consegue enxergar os efeitos desse governo sobre si mesma. Por outro lado, nas colunas dos protestos estavam os trabalhadores organizados, a juventude, os estudantes, os sem-terra, os sem-teto, enfim, os que sempre estiveram na luta. A luta de classes bem demarcada nas ruas. O chefe de governo, que tem mais de 100 pedidos de impedimento no Congresso, fez o que sabe fazer. Esticou a corda mais um pouco. Até agora tem nadado de braçada, sem que nada ou ninguém o obstaculize. As chamadas instituições democráticas fazem ouvidos moucos aos seus ataques à Constituição e permitem que a roda da economia siga girando em favor da classe dominante. Os trabalhadores vão sendo acossados, as privatizações seguem, o agro comanda e tudo parece bem. O judiciário fisga peixinhos enquanto o líder do cardume segue tranquilo. Nada lhe toca. A fascistização do governo é pop nas altas rodas. O sete de setembro foi uma patacoada. Mostrou que o governo perdeu apoio e apenas mantém seu reduto inicial formado por ultraconservadores e reacionários de carteirinha, bem como outros que ingenuamente acreditam nas mentiras disseminadas à exaustão sobre o comunismo e blá, blá, blá. Mas, ainda assim, é uma parcela barulhenta e em sistemático estado de agitação. As forças de esquerda, as institucionalizadas, agiram com timidez. Como sempre, são os trabalhadores os que se movem para além dos líderes. Esses sabem que muito pouco têm a perder indo para a luta nas ruas. E, por isso, vão. A aprovação do presidente despenca. Mas ele tem cartas na manga, não nos enganemos. Enquanto a burguesia nacional não se descolar dele, ele seguirá esticando a corda para garantir mais um mandato. A turma do andar de cima ainda está ganhando muita grana e vê passar no Congresso Nacional muitas de suas pautas que vão contra trabalhadores. Para eles tá suave. A batalha real será mesmo nas ruas. E os trabalhadores organizados devem dar o tom. Adeus 2021, sem saudade https://urutaurpg.com.br/siteluis/em-1970-os-tupamaros-de-mujica-contra-dan-mitrione-o-mestre-da-tortura/