Zona Curva

golpe de 64

Tribunal Regional Federal do RJ deve julgar acusados da morte de Rubens Paiva

O Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF2) determinou ontem o prosseguimento de ação penal contra cinco militares reformados acusados da morte do ex-deputado Rubens Paiva, em janeiro de 1971, nas dependências do Destacamento de Operações de Informações (DOI) do Exército, na Tijuca. Seu corpo nunca foi encontrado. A Justiça negou o habeas corpus impetrado pelos militares, que visava ao trancamento da ação. A defesa dos réus sustentou a prescrição das acusações e que os acusados seriam beneficiados pela Lei da Anistia, de 1979. O relator do caso, desembargador Messod Azulay, entendeu que se trata de um crime permanente, porque o corpo de Rubens Paiva ainda não foi localizado.   Em maio, o Zonacurva relatou em detalhes o processo na Justiça contra os militares acusados do assassinato e ocultação do cadáver do deputado Rubens Paiva. CLIQUE AQUI PARA SABER MAIS. Fonte usada: EBC

Comissão da Verdade suspeita de plano da ditadura para matar Glauber Rocha

Acusado de difundir calúnias contra regime militar no Brasil e classificado como “um dos líderes da esquerda no cinema”, sendo o que “mais atuava na campanha contra o país, na Europa”, o cineasta Glauber Rocha foi vítima de espionagem e perseguição pela ditadura. Na última sexta (16), a Comissão Estadual da Verdade do Rio revelou documentos produzidos pelas Forças Armadas contra o diretor. A entrega do dossiê militar à família foi feita no Parque Lage, na zona sul do Rio de Janeiro, com uma série de atividades que marcaram os 50 anos do filme Deus e o Diabo na Terra do Sol, completados no último dia 10. Oficialmente, Glauber morreu de septicemia, uma infecção, em 22 de agosto de 1981. Em outubro de 1976, Glauber Rocha gravou o velório de seu grande amigo, Di Cavalcanti. Assista ao curta e leia o texto. Produzidos pelo Serviço Nacional de Informação (SNI), os documentos compilam atividades do cineasta, declarações dadas aos jornais fora do país e lista artistas ligados a Glauber e que criticavam o regime militar, como, também o cineasta Luiz Carlos Barreto, apontado como “porta-voz da esquerda cinematográfica nacional”. Um dos documentos lembra que Glauber foi preso, por ter vaiado o presidente Castelo Branco, em 1965 e acusa o diretor de ter “difundido calúnias” ao denunciar a jornais ingleses torturas e perseguições no Brasil pela ditadura. O ator Othon Bastos, um dos personagens principais do filme Deus e o Diabo na Terra do Sol é mencionado no dossiê do SNI como o favorito de Glauber e citado por “conhecido envolvimento político e ideológico”. Presente ao evento na Comissão da Verdade, Bastos disse que ficou surpreso com a revelação. “São tantas pessoas famosas aqui e estou entre um deles, eu não sabia de nada”. A presidenta da Comissão Estadual da Verdade, Nadine Borges, destacou que os documentos encontrados no Arquivo Público do Estado do Rio de Janeiro contém marcas que expressam a intenção dos militares de eliminar Glauber. Ela se referia as palavras “morto”, em lápis, no alto do dossiê, na primeira página. “Recebemos a informação de um agente da repressão que atuou na época, que, em geral, era hábito escrever à mão um indicativo de ordem. Então, isso nos faz pensar que ele estava marcado para morrer. Por sorte, ele se exilou antes”, comentou. A presidenta cobra que o general José Antonio Nogueira Belham, que assina um dos documentos, preste depoimento para esclarecer esse e outros casos. Durante a revelação dos documentos, o cineasta Zelito Viana, parceiro de Glauber no filme o Dragão da Maldade, que venceu o Festival de Cinema de Cannes, e o Terra em Transe, que concorreu no mesmo festival poucos anos antes, lembra os tempos difíceis da ditadura. “Viver era arriscado no Brasil”, ressaltou. Ele levou Terra em Transe clandestinamente para participar do festival no França. Amigo de Glauber, Silvio Tendler destacou que a perseguição a Glauber, que se exilou em 1971, e às pessoas que contestavam o regime prejudicou o Brasil. “Aliás, prejudicou os artistas, os estudantes, os sindicalistas. A ditadura foi um preço muito alto para Nação. Sou de uma geração que desaprendeu a falar e estamos aprendendo a falar depois de velho. Antes, era tudo proibido”. Tendler lembrou também que Glauber foi um artista brilhante, mas não o único alvo da ditadura. “Eu e muito outros fomos perseguidos, como Joaquim Pedro de Andrade, que foi preso, e Olney São Paulo, barbaramente torturado”. No dossiê, estão transcritos ainda trechos de artigos de Glauber. Entre eles, uma justificativa para sua atuação, contra o regime. “O cinema não será para nós uma máscara, porque, o cinema não faz revolução – o cinema é um dos instrumentos revolucionários e para isto deve(-se) criar uma linguagem latino-americana, libertária e revelador”, disse à revista Cine Cubano, em 1971, segundo o SNI. Tribunal Regional Federal do RJ deve julgar acusados da morte de Rubens Paiva Ex-delegado Cláudio Guerra revela envolvimento de coronel da ditadura militar na morte de Zuzu Angel Decisão histórica da Justiça acata denúncia contra militares envolvidos na morte de Rubens Paiva Justiça barra ação contra militares acusados no caso Riocentro Instituto Vladimir Herzog denuncia Bolsonaro na ONU por comemorações do golpe de 64    

PIF-PAF tentou curar a ressaca do golpe de 64

Bem-vindo ao Fatos da Zona, onde adaptamos os textos mais acessados do site do Zonacurva Mídia Livre para o audiovisual. ASSISTA:     Em 1964, um mês e meio depois do golpe militar, nascia o PIF-PAF, o pequeno jornal criado por Millôr Fernandes que mostrou novos caminhos para o jornalismo combativo e independente que foi feito mais tarde (e sempre). Charges, tiradas demolidoras, textos de diversos estilos e tamanhos, muitas mulheres (e políticos) de biquíni, embalados por um humor cáustico, foram as armas usadas para a certeira crítica política e comportamental da época. Os leitores aprovaram e já no primeiro número, ele vendeu 40 mil exemplares. Infelizmente, PIF-PAF durou apenas 4 meses e 8 edições. Apesar da boa aceitação dos leitores, a publicação foi fechada por um misto de perseguições políticas e má administração. O jornal PIF-PAF nasceu de uma seção fixa da revista O Cruzeiro, uma das revistas mais lidas da história da imprensa brasileira, que chegou a vender mais de 700 mil exemplares em 1954 no suicido de Getúlio Vargas. Na época, o Brasil tinha cerca de 45 milhões de habitantes. Millôr começou a trabalhar por lá como contínuo com apenas 15 anos, em 1938. Mais tarde, passou a escrever na seção da revista com o codinome de Emmanuel Vão Gôgo e dividia o espaço com Péricles Maranhão, criador do personagem Amigo da Onça, e outros como Borjalo, Ziraldo e Fortuna. Depois de perder o emprego na revista O Cruzeiro por pressões da Igreja Católica por produzir o trabalho satírico A verdadeira história do Paraíso, o humorista e jornalista Millôr conseguiu um empréstimo junto ao banqueiro José Luís de Magalhães Lins, do Banco Nacional, para fundar o PIF-PAF. A trupe do jornal contava com cartunistas como Jaguar, Ziraldo, Claudius, Fortuna e textos de Sérgio Porto, Rubem Braga, Antônio Maria, além de outros colaboradores. O argentino nascido na Áustria, Eugênio Hirsch, foi o responsável pelas inovações gráficas. Millôr explica como funcionava a folha salarial da redação: “ninguém ganhava nada, tudo era sem fins lucrativos”. O jornalista Bernardo Kucinski, em seu livro Jornalistas e revolucionários: nos tempos da imprensa alternativa, explica que essa “precariedade se tornaria marca registrada da imprensa alternativa. Os humoristas entregavam suas colaborações, mas não trabalhavam na revista. Millôr Fernandes, com a experiência de O Cruzeiro, produzia tudo”. 20 frases de Millôr Fernandes O texto da página relata que “Carlota se excedeu nas críticas à ocupante do cargo, apesar de anteriormente tanto tê-la ajudado na posse… Miss Castelinho agrediu-a na presença de inúmeras testemunhas”. Na foto a seguir, os políticos tomam um drinque já “que as brigas entre amigas antigas e verdadeiras não duram muito”. [Carlos Lacerda e o governador mineiro, Magalhães Pinto, forneceram forte apoio ao golpe militar] Millôr explica a perseguição sofrida pelo poder: “o PIF-PAF Paf  foi fechado por um conluio entre o governo federal e o governo estadual aqui [no antigo estado da Guanabara], que naquela época era o Carlos Lacerda…. não tive forças para lutar, eles começaram a apreender um número, depois devolveram o número, depois o oitavo número eles apreenderam todo e eu não tinha mais dinheiro para fazer”. O jornal deixou uma dívida de 21 mil cruzeiros para Millôr, que a quitou após dois anos.   “Não tenho procurado outra coisa senão ser livre. Livre das pressões terríveis da vida econômica, das pressões terríveis dos conflitos humanos, livre para o exercício total da vida física e mental. Livre das ideias feitas e mastigadas, tenho como Shaw [Bernard], uma insopitável desconfiança de qualquer idéia que já venha sendo proclamada por mais de dez anos…” MILLÔR FERNANDES

Ex-delegado Cláudio Guerra revela envolvimento de coronel da ditadura militar na morte de Zuzu Angel

Em depoimento prestado à Comissão Nacional da Verdade nesta quarta-feira (23 de julho), o ex-delegado do DOPS do Espírito Santo, Cláudio Guerra, afirmou que o coronel Freddie Perdigão Pereira provocou o acidente que resultou na morte da estilista Zuzu Angel, em 1976. O crime complementa o currículo de algoz a serviço do regime militar de Pereira. O coronel atuou no DOI-CODI de São Paulo e na Casa da Morte de Petrópolis e ainda coordenou o atentado no Riocentro. No ano passado, o ex-soldado do Exército Valdemar Martins de Oliveira revelou em depoimento à Comissão da Verdade do Estado de São Paulo que o coronel executou o casal João Antonio dos Santos Abi Eçab, 25 anos, e Catarina Abi Eçab, 21 anos, militantes da Ação Libertadora Nacional (ALN), em 1968. Infelizmente, o militar não responderá por seus crimes, ele morreu em 1998. Estilista conhecida, Zuzu Angel era mãe de Stuart Angel, membro do MR8, que lutou contra o regime militar, e foi preso em 14 de maio de 1971. Seu corpo nunca foi encontrado. Zuzu mobilizou a opinião pública nacional e estrangeira em busca de seu filho e foi vítima de um acidente na madrugada de 14 de abril de 1976, na Estrada da Gávea, no Rio de Janeiro. O regime militar sempre foi acusado de ter forjado o acidente. O delegado Cláudio Guerra foi indiciado, entre outros, pelo Ministério Público pelo envolvimento no atentado do Riocentro, infelizmente a Justiça Federal barrou ação contra os acusados. SAIBA MAIS SOBRE O CASO RIOCENTRO.  Segundo Guerra, ele e Perdigão eram confidentes e frequentavam a casa um do outro. “Um dia ele me disse que havia planejado simular o acidente dela e estava preocupado, pois achava que havia sido fotografado na cena do crime pela perícia”, afirmou o delegado no depoimento à Comissão Nacional da Verdade. Em seu depoimento, Guerra afirmou que incinerou os corpos de 12 militantes políticos e que assassinou e incinerou em seguida um tenente de nome Odilon, numa queima de arquivo determinada pelo SNI (Serviço Nacional de Informações). O ex-delegado contou também que executou três militantes em São Paulo, um em Recife e “dois ou três” no Rio. Claudio Guerra forneceu a foto para a Comissão que comprova a presença do coronel Perdigão na perícia, ele está indicado pela seta: “Se cumprisse pena por tudo o que fiz nunca iria sair da cadeia”, afirmou Cláudio Guerra. Guerra foi condenado e cumpriu pena por três tentativas de homicídio, resultantes de um atentado à bomba do qual participou nos anos 80 no Espírito Santo. Na cadeia, tornou-se pastor da Assembleia de Deus e afirma querer fazer sua parte “para que uma página triste de nossa história seja passada a limpo”. Em 2012, Guerra relatou sua história como agente da repressão a Rogério Medeiros e Marcelo Netto no livro Memórias de uma Guerra Suja. – Fonte usada: Comissão Nacional da Verdade. Documentário Pastor Cláudio escancara a violência da Ditadura Relatório da Comissão da Verdade pode revelar localização do corpo de Stuart Angel

Decisão histórica da Justiça acata denúncia contra militares envolvidos na morte de Rubens Paiva

A Justiça Federal aceitou na segunda (dia 26 de maio) denúncia contra cinco militares reformados pela morte do deputado Rubens Beirodt Paiva pelos crimes de homicídio, ocultação de cadáver, associação criminosa armada e fraude processual. José Antonio Nogueira Belham, Rubens Paim Sampaio, Jurandyr Ochsendorf e Souza, Jacy Ochsendorf e Souza e Raymundo Ronaldo Campos serão os primeiros militares a irem a julgamento por crimes cometidos durante o regime militar. A decisão cria um clima de esperança pela revogação da lei de anistia de 1979 e, com isso, militares e agentes do Estado possam responder na Justiça pelos crimes cometidos entre 1964 e 1979. Em janeiro de 1971, o engenheiro e ex-deputado Rubens Paiva foi preso e torturado no Destacamento de Operações e Informações (DOI) no bairro da Tijuca, no Rio de Janeiro, e seu corpo nunca foi encontrado. Deputado pelo PTB, Paiva teve seu mandato cassado em 1964. Um mês antes de morrer em circunstâncias até o momento ainda não esclarecidas, o coronel reformado Paulo Malhães, de 76 anos, revelou à Comissão da Verdade do Rio (CEV) que foi um dos líderes da equipe encarregada de desenterrar os restos mortais de Paiva em 1973 da praia do Recreio dos Bandeirantes, dois anos após sua morte. Ainda segundo Malhães, que trabalhou no CIE (Centro de Informações do Exército), a operação foi necessária porque alguns agentes do DOI ameaçavam divulgar a localização da ossada. A operação foi uma ordem do gabinete do ministro do Exército na época e futuro presidente, Ernesto Geisel. O coronel falou que não soube para onde foi levado o corpo, mas que acreditava que a ossada foi jogada em um rio ou no mar. Depois dessa afirmação, Malhães voltou atrás e negou a operação em depoimento à Comissão Nacional da Verdade. Malhães foi morto em sua fazenda em Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense em abril. Sua esposa, Cristina afirmou que pouco antes de morrer, o coronel lhe contou que o corpo de Paiva foi mesmo jogado em um rio, provavelmente o rio Itaipava, que fica próximo à Casa da Morte, centro de torturas e assassinatos na cidade de Petrópolis (RJ). Malhães ainda revelou detalhes das torturas praticadas na Casa da Morte. Para evitar o risco de identificação, as arcadas dentárias e os dedos das mãos eram retirados. Em seguida, o corpo era embalado em saco impermeável e jogado no rio, com pedras de peso calculado para evitar que descesse ao fundo ou flutuasse. Além disso, o ventre da vítima era cortado para impedir que o corpo inchasse e emergisse. Assim, seguiria o curso do rio até desaparecer. Coronel desmonta a farsa da morte de Rubens Paiva em combate Em fevereiro, em depoimento à Comissão Estadual da Verdade do Rio, o coronel reformado Raymundo Ronaldo Campos (um dos cinco militares denunciados pelo Ministério Público Federal) admitiu que o Exército montou uma farsa para esconder a morte de Rubens Paiva. Campos revelou que ele e outros dois militares teriam recebido ordens de seus superiores para atirar na lataria de um Fusca e incendiá-lo em seguida, no Alto da Boa Vista, no Rio. A montagem era para sustentar a versão oficial de que, ao ser transportado por militares, o ex-deputado foi sequestrado por terroristas, que atearam fogo no carro. Assista ao vídeo da TV Carta de alguns trechos do depoimento de Malhães à Comissão Nacional da Verdade: Fontes usadas: Revista Carta Capital e Blog do Mário Magalhães.

Derrota da emenda das Diretas Já! amplia consciência

A rejeição da emenda Dante de Oliveira, no início da madrugada de 26 de abril de 1984, pela ausência de parlamentares e voto contrário de deputados do PDS, deixaria entrever situações bastante sui generis para os milhões de brasileiros que, nas capitais estaduais e municípios por todo o país, empenharam-se na luta pela aprovação da emenda que restabeleceria o direito de eleger o presidente da República ainda naquele ano. A eleição para a presidência estava programada, mas seria realizada de modo indireto, através de Colégio Eleitoral. Para que o pleito transcorresse pelo voto popular, ou seja, de forma direta, era necessária a aprovação da emenda constitucional proposta pelo deputado Dante de Oliveira (PMDB – MT). A última eleição direta para presidente fora em 1960. A cor amarela simbolizava a campanha iniciada em 1983. Após duas décadas de intimidação pela repressão, o movimento das Diretas Já ressuscitava a esperança e a coragem da população. A reivindicação sinalizava mudanças não só políticas, mas econômicas e sociais. Dois comícios marcariam o processo: na Candelária, no Rio de Janeiro, em 10 de abril, com um milhão de presentes e, em São Paulo, dia 16, aos gritos de “Diretas Já!”, mais de 1,5 milhão de pessoas lota o Vale do Anhangabaú, na capital paulista. Em Salvador, ocorrera em janeiro com 15 mil pessoas na praça Castro Alves. Entre as figuras de destaque do movimento, o deputado Ulysses Guimarães (PMDB-SP) chegou a ser apelidado de “o Senhor Diretas”. Outros nomes emblemáticos foram a cantora Fafá de Belém (pela interpretação magistral do Hino Nacional) e o apresentador Osmar Santos. Leia texto sobre o comício no Anhangabaú Na noite de 25 de abril de 1984, o Congresso Nacional se reúne para votar a emenda que tornaria possível a eleição direta ainda naquele ano. A população não pode acompanhar a votação dentro do plenário. Temendo manifestações, o governo João Baptista Figueiredo reforça a segurança ao redor do Congresso Nacional. Tanques, metralhadoras e muitos homens deixavam claro que a proposta não interessava ao regime. A expectativa era grande. Mas os 298 votos favoráveis seriam “subtraídos” por 112 deputados que não compareceram e frente aos apenas 65 contrários e três abstenções. Para a aprovação da emenda eram necessários 2/3 a favor ou 320 votos. Uma derrota por 22 votos. As estruturas psíquicas de uma nação são capazes de resistir a golpes bem mais duros. Sobrevivem durante muitos anos, mesmo depois de mudanças infraestruturais profundas. Trata-se de uma agonia lenta para a qual não existe golpe de misericórdia capaz de destruí-las. Preservam-se, ainda que nos mais obscuros recantos do inconsciente coletivo. Fortes o suficiente para enfrentar ou empreender revoluções sociais e combater privilégios voltados a atender interesses de grupos, contra a maioria da população brasileira.   A nacionalidade é uma vinculação existencial inevitável. Não se trata de um ardil ou um álibi. Como hoje, obscuros legisladores nos leva(va)m de roldão – e então, já durante 20 anos após o golpe de 64 – sem se darem conta de que o desejo dos novos oráculos – aos milhões agora – são imediatos e práticos. A solidariedade (mais correto afirmar a cumplicidade) estabelecida em busca de eleições Diretas Já, se traduziria no plano da sublimação por um busca comum de novos valores. A luta, não só continua. Ela é contínua. Derrotava-se uma emenda, mas não a consciência do eleitor. Vale lembrar o quanto as ações de entidades, organizações e comunidades, através de comitês organizados por todo o país, surpreenderam pela decidida forma com que compareceram aos eventos programados a favor da causa legítima, o direito de cada cidadão votar para eleger o seu mandatário máximo. O certo é que ali se tornou impossível aos que detinham o poder manter o povo brasileiro sob a acusação de subversão e à imposição de tirânicas leis de segurança e emergência, em meio a uma economia que asfixiava a todos os setores, indistintamente. O pleito seria consumado em janeiro de 1985 no colégio eleitoral. Tancredo Neves (PMDB) derrotaria Paulo Maluf (PDS) e um novo pesadelo atravessaria a noite no Brasil, mas aí já é outro capítulo da história. Matéria da TV Brasil sobre a rejeição da emenda das Diretas Já!:   Henfil e as Diretas JÁ!

Rubem Fonseca e o silêncio que não apaga o passado

Como o escritor Rubem Fonseca sente verdadeira ojeriza por entrevistas, sempre pairou a desconfiança de que a causa dessa aversão advém da tentativa de esconder seu convívio nos anos 60 com algumas figuras de destaque da ditadura militar. Fonseca participou da direção do IPÊS (Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais), que organizou a base ideológica para o golpe de 64, e foi próximo do general Golbery do Couto e Silva, uma espécie de eminência parda do regime de exceção. Em entrevista a revista Bravo! em 2009, o jurista Candido Mendes declarou: “Eu me lembro do fascínio do general Golbery com o José Rubem… Ele admirava o José Rubem por sua capacidade, sua implacabilidade de raciocínio”. Através de Golbery, Fonseca conheceu seu primeiro editor, o ex-camisa verde (apelido dos integralistas), Gumercindo Rocha Dorea, diretor da Editora GRD, que publicou os dois primeiros livros de Rubem: Os Prisioneiros (1963) e Coleira do Cão (1965). Não é possível mais defender o silêncio do escritor que, sem dúvida, teve papel primordial na literatura brasileira das últimas décadas, como apenas uma característica de sua personalidade. Alguns até comparam o silêncio de Rubem ao de outro escritor que também influenciou toda uma geração de escribas, o vampiro de Curitiba Dalton Trevisan, que também rechaça qualquer investida da imprensa. No caso de Trevisan, talvez aí sim seja uma característica pessoal como até indica seu apelido. Já Rubem, nos últimos anos, tem falado e mostrado sua verve em eventos tanto no exterior como em algumas ainda raras ocasiões no país. Assista aos dois vídeos de aparições públicas do escritor no texto Zonacurva sobre seu último livro, Amálgama. Rubem Fonseca no IPÊS O IPÊS (Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais) surgiu em novembro de 1961, apenas dois meses após a renúncia de Jânio Quadros, pelas mãos de Golbery e Figueiredo, entre outros militares, empresários e políticos. O instituto apresentava-se como uma “agremiação apartidária com objetivos essencialmente educacionais e cívicos e orientado por dirigentes de empresas que participam com convicção democrática e como patriotas”. De acordo com o historiador uruguaio René Armand Dreifuss em seu livro 1964: a conquista do Estado, Ação Política, Poder e Golpe de Classe, Rubem Fonseca teve como sua principal função no IPÊS a de supervisionar a unificação ideológica e editorial dos materiais de divulgação do instituto. Ao seu lado, trabalhavam o poeta e jornalista Odylo Costa Filho, a escritora Raquel de Queiroz e o jornalista Wilson Figueiredo. O material produzido pelo IPÊS, em especial seus curtos filmes que eram exibidos em cinemas e na televisão, foi um dos responsáveis por criar um clima de pânico, principalmente entre a classe média, do “verdadeiro descalabro que ameaçava nossa democracia“. Em conjunto com o IPÊS, atuava o IBAD (Instituto Brasileiro de Ação Democrática) que também reunia em seus quadros intelectuais orgânicos que representavam os interesses do grande empresariado e, em especial, do capital norte-americano. Podemos dizer que ambos constituíram uma verdadeira organização composta por intelectuais, empresários e militares em defesa dos interesses da elite brasileira e seus aliados. Segundo o livro A ditadura envergonhada, do jornalista Elio Gaspari, o IPÊS funcionava no 27º andar do moderno edifício Avenida Central, no centro da capital fluminense. Em incrível coincidência, por lá também atuava o escritório da agência de notícias cubana Prensa Latina. O  democrático prédio ainda abrigava duas bases de operações clandestinas: uma do Partido Comunista Brasileiro (PCB) e outra de radicais de direita. O documentário O dia que durou 21 anos, de Camilo Tavares, lançado no ano passado, coloca de forma muito clara a participação dos Estados Unidos na criação do IBAD e do IPÊS. Lincoln Gordon, embaixador norte-americano no Brasil no período pré-golpe, aconselha o presidente John Kennedy a ajudar com alguns milhões de dólares os institutos. Kennedy questiona se isso seria realmente necessário. Gordon é categórico: “nós não podemos correr riscos”. Plínio de Arruda Sampaio, deputado federal no período que precedeu o golpe, lembra no filme que foi procurado por uma pessoa ligada ao IPÊS, que lhe ofereceu certa quantia para que ele defendesse a democracia, Plínio refutou: “mas eu já defendo a democracia, para isso, não preciso de dinheiro”. Leia texto sobre o documentário O dia que durou 21 anos A jornalista Regina Coelho abordou a relação de Rubem Fonseca com o IPÊS na matéria O homem em questão publicada no jornal Correio da Manhã no final dos anos 60. O telefonema da jornalista irritou Rubem Fonseca, que se negou a responder qualquer pergunta. O papo acabou se tornando um áspero diálogo entre os dois: “Se você entrevistasse o Carlos Drummond de Andrade seria importante o que ele faz ou o que ele é”. Regina Coelho rebate: “segundo Sartre, o homem é aquilo que ele faz”. “E nós somos esta espécie de conjunto desorganizado em termos de função na vida, não tenho nada a dizer”. Silêncio. Regina pergunta: “Isto vai atrapalhar o seu trabalho?” “Claro que vai, mas profissionalmente a gente se vira, não precisa ficar com complexo de culpa, bem, você estragou o meu dia, não quero ser rude, não devia ter atendido o telefone, interprete como quiser, arranje outro entrevistado”.  Em 1994, José Rubem publicou um artigo no jornal Folha de São Paulo em que afirma que sua participação no IPÊS foi uma decorrência de sua atividade empresarial como executivo da Light e nega ter colaborado com a ditadura. Leia trecho: “No ato de fundação do IPÊS a Assembleia Geral me escolheu como um dos diretores do Instituto. Toda a direção era composta de empresários que continuavam trabalhando em suas companhias e não recebiam remuneração pela sua colaboração. À medida em que crescia a rejeição ao governo João Goulart na classe média, em setores empresariais, eclesiásticos, militares e também na mídia, no IPÊS se desenvolveram duas tendências. Uma, fiel aos princípios que haviam inspirado a fundação do Instituto, manteve-se favorável a que as reformas de base por ele defendidas fossem implantadas através de ampla discussão com a sociedade civil, o governo e o parlamento; a outra passou a julgar a derrubada do governo João Goulart como única solução para os problemas

O Brasil despertou no movimento das Diretas Já!

Diretas Já – Depois de duas décadas de arbítrios do regime militar, o movimento das Diretas Já acordou o povo brasileiro para a urgência da participação política. Entre o final de 1983 e o início de 1984, vários comícios mobilizaram o país pelas eleições diretas para presidente da República. Em 16 de abril de 1984, o comício das Diretas Já no Vale do Anhangabaú, na cidade de São Paulo, reuniu 1,5 milhão de pessoas em uma das maiores concentrações populares da História do Brasil. O comício reuniu no mesmo palanque políticos como Lula, Fernando Henrique, Brizola, Miguel Arraes, Mário Covas, Franco Montoro (governador de São Paulo à época) e muitos outros. Do meio artístico, as atrizes Eva Wilma e Fernanda Montenegro, o cantor Walter Franco e a cantora símbolo da campanha das Diretas, Fafá de Belém, marcaram presença. A adesão à campanha pelas Diretas crescia em todo o país, o que levou o presidente Figueiredo a encaminhar um projeto ao Congresso em que o governo aceitava as eleições diretas para presidente, mas somente para o pleito de 88. O país não realizava uma eleição direta para a presidência da República desde 3 de outubro de 1960, quando foi eleito Jânio Quadros. Com a promulgação pelo presidente Castelo Branco do Ato Institucional nº 2, em 27 de outubro de 1965, o presidente e vice-presidente da República passaram a ser eleitos por maioria absoluta dos membros do Congresso Nacional. Em março de 1983, o deputado federal Dante de Oliveira (PMDB-MT) apresentou ao Congresso Nacional uma emenda constitucional que propunha o fim do Colégio Eleitoral e o retorno das eleições diretas para presidente e vice-presidente para as eleições previstas para 1985. No aniversário de São Paulo em 1984, no dia 25 de janeiro, uma multidão já tinha tomado a Praça da Sé em outro comício. Alinhada com a ditadura militar, a direção da Rede Globo censurou a cobertura do ato e tentou confundir os telespectadores como se a maciça presença popular na praça fosse para apenas celebrar o aniversário da cidade. O ex-vice-presidente das Organizações Globo, José Bonifácio de Oliveira Sobrinho, Boni, disse em entrevista ao jornalista Roberto Dávila em 2005 que a ordem de censurar a cobertura do comício veio diretamente de Roberto Marinho, fundador da emissora. O jornalista Ricardo Kotscho, que cobriu o comício pelo Jornal Folha de São Paulo, declarou em entrevista à Revista dos Bancários em 2003 que “foi o povo que acabou fazendo a cabeça da Globo”.  Em texto Zonacurva, nosso colaborador Otávio de Carvalho lembra o Comício da Praça da Sé. A liderança do ‘ex-conservador’ Teotônio Vilela Um dos fundadores da UDN (União Democrática Nacional), partido conservador criado como opositor ao governo Getúlio Vargas, o político alagoano Teotônio Vilela tornou-se uma das figuras simbólicas da luta pela redemocratização do país. Filho de um rico proprietário rural, Vilela foi um dos idealizadores do Projeto Brasil em abril de 1978 que continha, entre várias reivindicações, a restauração do habeas corpus por crimes políticos (extinto em 1968 pelo AI-5), o pluripartidarismo (na época, apenas o MDB e a ARENA atuavam na legalidade, Teotônio foi eleito senador pelo último em 74), o fim da censura à imprensa e eleições diretas para presidente e governadores. Em 1979, ano da posse do general Figueiredo na presidência, Teotônio troca a ARENA pelo MDB. Em 82, ano em que Teotônio inicia sua luta contra um câncer, o político esteve presente ao lado de Lula nas assembleias no estádio de Vila Euclides, em São Bernardo do Campo. Chegou a presidir o PMDB em julho de 1983 e impulsionou a campanha das Diretas, até morrer no dia 27 de novembro de 1983. O jornalista e desenhista Henfil retratou Teotônio em charge que acabou batizando o movimento pela democratização de Diretas Já!: Saiba mais sobre o genial Henfil Fafá de Belém interpreta “Menestrel das Alagoas”, composta por Milton Nascimento e Fernando Brant em homenagem a Teotônio Vilela: Mais Fafá de Belém: desta vez, a cantora debate com João Batista de Andrade o movimento das Diretas Já! no programa Metrópolis da TV Cultura:  Fonte usada: CPDOC-FGV. Henfil e as Diretas JÁ!  

Julinho da Adelaide driblou a censura nos anos 70

Com o sucesso da música Apesar de você, em 1970, as canções de Chico Buarque passaram a sofrer uma espécie de censura prévia. Os integrantes do governo militar não se perdoaram por liberar a música e proibiram sua execução nas rádios. Irritada, a cúpula do regime considerou a letra uma ofensa ao presidente Médici, o evidente você. Acuado, Chico passou a assinar algumas músicas como Julinho da Adelaide. Julinho/Chico escreveu músicas como Jorge Maravilha, Milagre Brasileiro e Acorda Amor, aprovadas pela censura sem nenhum impedimento. Em Jorge Maravilha, Chico cantava: “você não gosta de mim, mas sua filha gosta”, o que gerou a especulação de que Amália Lucy, fã declarada dele e filha de outro presidente militar, o general Geisel, tinha sido a homenageada da canção. Chico sempre negou que tenha composto a música para Amália. Chico começou a contar para o público em suas apresentações que Julinho da Adelaide era um “compositor de morro carioca que vivia mais nas páginas policiais e que de repente passou para as páginas das crônicas musicais”. Imagens da ditadura e Apesar de você (considerada pelo governo da época um ataque direto ao presidente Médici): Será que a filha de Geisel gostou de “Jorge Maravilha”? Julinho da Adelaide concedeu uma entrevista ao jornalista e escritor Mario Prata, que a publicou no jornal Última Hora. Leia a entrevista completa em que Julinho declarou: “embora eu não seja cantor, um dia eu pretendo gravar um disco. Você vê, gente que não canta bem como o Chico Buarque, o Vinícius de Moraes, o Antonio Carlos Jobim, estão cantando”. Mario Prata comenta a entrevista histórica com Julinho em 1998: “Julinho, ao contrário do Chico, não era tímido. Mas, como o criador, a criatura também bebia e fumava. Falava pelos cotovelos. Era metido a entender de tudo. Falou até de meningite nessa sua única entrevista a um jornalista brasileiro. Sim, diz a lenda que Julinho, depois, já no ostracismo, teria dado um depoimento ao brasilianista de Berkeley, Matthew Shirts. Mas nunca ninguém teve acesso a esse material. Há também boatos que a Rádio Club de Uchôa, interior de São Paulo, teria uma gravação inédita. Adelaide, pouco antes de morrer, ainda criando palavras cruzadas para o Jornal do Brasil, afirmava que o único depoimento gravado do filho havia sido este, em setembro de 1974, na rua Buri, para o jornal Última Hora. Para mim, o que ficou, depois de quase 25 anos, foi o privilégio de ver o Chico em um total e super empolgado momento de criação. Até então, o Julinho era apenas um pseudônimo pra driblar a censura. Ali, naquela sala, criou vida. Baixou o santo mesmo. Não tínhamos nem trinta anos, a idade confessa, na época, do Julinho.” LEIA TAMBÉM “HENFIL E AS DIRETAS JÁ” O militante Chico Buarque O trecho acima mostra a combatividade de Chico na época. Francisco Buarque de Hollanda ou Chico Buarque, como é conhecido, talvez, seja o representante-mor de toda uma época da música brasileira. Filho de um grande historiador brasileiro (Sérgio Buarque de Hollanda) e de uma pianista amadora, desde cedo teve o passado, presente e futuro ligados à música como forma de mensagem e ideologia para si e para quem quisesse ouvi-lo. Autor de clássicos odiados pelos homens fardados, Chico era, talvez, o principal combatente com lápis e papel do regime militar. Além da militância política, a arte e, em particular a música, foi uma grande arma no combate à política repressora do Estado brasileiro. O endurecimento do regime que veio com o Ato Institucional número 5, o AI-5, em dezembro de 1968, levou Chico Buarque a mudar para a Itália, onde chegou a realizar espetáculos com Toquinho. Se tornou amigo do compositor italiano Lucio Dalla, e verteu a música “Gesù Bambino”, de Dalla, para o português em “Minha História” (1970). Chico compôs outras tantas músicas consideradas verdadeiros hinos de resistência à ditadura militar: “Mulheres de Atenas”: música composta por Chico Buarque e Augusto Boal em 1976 para a peça Mulheres de Atenas de Boal. “Cálice”: composta em parceria com Gilberto Gil em 1973, a música foi censurada e seu título pode ser lido também como Cale-se, clara referência à censura e repressão vivida no país na época. “Vai Passar”: composta por Chico Buarque e Francis Hime em 1979, a música foi o hino da Campanha das Diretas, em 1984. “Meu Caro Amigo”: também composta por Chico em parceria com Francis Hime, é uma carta em forma de música e foi composta para o amigo de Chico, o dramaturgo Augusto Boal, exilado em Lisboa. Nela, Chico retrata a situação em que se encontrava o Brasil. Miúcha interpreta Milagre Brasileiro de “Julinho da Adelaide”: https://www.youtube.com/watch?v=sO43EW7falc A resistência de Gal Costa à ditadura civil-militar

Protesto com samba na DEScomemoração do golpe de 64

O bloco carnavalesco Cordão da Mentira irá desfilar em DEScomemoração aos 50 anos do golpe militar de 64. Com intervenções artísticas e sambas de autoria própria, o Cordão volta às ruas no dia 1º de abril (terça) a partir de 17h30 em frente ao Memorial de Resistência, no Largo General Osório, na cidade de São Paulo. O bloco realizou seu primeiro desfile em 1º de abril de 2012. O mote do desfile deste ano é “64 +50: Quando vai acabar a ditadura civil-militar?” em que o Cordão promete samba, batucada e escracho popular nas ruas do centro de São Paulo. Dentre as paradas escolhidas, a Praça da República e a rua Maria Antônia, palcos  de protestos e conflitos durante a regime militar. Assista ao vídeo-convite do Cordão da Mentira: Acesse a página do facebook do bloco. As ruas são pra lutar e quem não luta dança!