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Igualdade na política pode levar mais de um século

Apesar de avanços, se comparada à participação de homens brancos, cis ou héteros, ainda é pouco comum no Brasil a participação de mulheres e pessoas da comunidade LGBT+ na política. Segundo o relatório Desigualdade de Gênero e Raça na Política Brasileira lançado no dia 25 de  julho pela Oxfam Brasil, instituição independente e sem fins lucrativos que atua com o objetivo de diminuir as desigualdades, em parceria do Instituto Alziras, revelou que a igualdade de gênero e raça no campo da política pode demorar mais de um século.  O estudo foi feito a partir de comparação entre os perfis das pessoas candidatas e eleitas para o poder executivo e legislativo municipal entre 2016 e 2020 com divisão por gênero e raça. Mas há esperança, como no caso da vereadora mais votada do Brasil em 2020, Érika Hilton (PSOL), entrevistada recentemente pelo ZONACURVA, que foi a primeira mulher trans a ocupar assento na Câmara Municipal da cidade de São Paulo em tantos anos de República. Algo semelhante ocorreu em Belo Horizonte onde Duda Salabert também foi a vereadora mais votada da história do município e a primeira mulher trans eleita para um mandato na Câmara da capital mineira.  Representatividade feminina O relatório mostra que o percentual de candidaturas femininas teve pouco aumento entre as duas últimas eleições municipais. Apenas 13,6% das candidaturas à prefeitura em 2020 foram de mulheres, com uma variação positiva de meio ponto percentual em relação a 2016. Já nas câmaras municipais, elas representaram 35% das candidaturas no mesmo ano. Na capital paulista, por exemplo, existem apenas 13 vereadoras contra 42 vereadores, o que equivale a 24% do total. Apesar disso, é a maior bancada feminina já eleita na cidade. A Oxfam atribui o aumento no executivo das cidades à política de cotas vigente desde 2009, que obriga os partidos a manterem pelo menos 30% da legenda com candidaturas de cada sexo.   Comparativo dos candidatos à prefeitura Tanto em 2016 quanto em 2020, os locais com menor quantidade de candidaturas femininas concorrendo à prefeitura foram as regiões Sul e Sudeste.  Segundo o documento, apesar de pequeno, a quantidade de candidatas negras no executivo é proporcional ao porte dos municípios. Em quatro anos, sua presença aumentou 4% nos municípios de forma geral e 23% nas metrópoles. Em relação às candidaturas à prefeitura dentro dos partidos, as mulheres ocupam menos de 20% em quase todos, com exceção do PSTU (38%), UP (27%) e PMB (24%). No entanto, esses partidos, somados, disputam eleições em apenas 2% dos municípios.  No Brasil, de 2016 para 2020, a parcela de prefeitas aumentou de 11,5% para apenas 12,1%.  Para cada prefeita mulher, há 9 prefeitos homens. Caso o ritmo permaneça o mesmo, conseguiremos alcançar igualdade de gênero nas prefeituras brasileiras apenas em 2166.   Comparativo dos candidatos à vereança No legislativo dos municípios, os piores índices de participação de mulheres nas câmaras de vereadores pertencem aos Estados do Rio de Janeiro (9,7%) e Espírito Santo (10,5%), enquanto o Rio Grande do Norte tem o maior (21,7%). Com relação às vereadoras negras, o melhor percentual é no Norte e Nordeste e os piores se encontram no Sul e Sudeste. Por outro lado, em 2020, a maior parte das candidaturas foram de pessoas negras, com 51,5%. Em 4.983 cidades, as mulheres negras ocupam menos de 20% das cadeiras nas câmaras municipais, e em 57% delas, elas não ocupam assento algum. Em contrapartida, vereadoras negras ficaram entre as 10 mais votadas em 11 capitais.     Representatividade indígena Prefeitura Apesar do aumento de 32% entre 2016 e 2020, o número de candidaturas de indígenas é ainda menor. Em relação à proporção, o PT é o partido com maior quantidade tanto em 2016 quanto em 2020, com 14%.  Em todo o Brasil, existem apenas 8 prefeituras gerenciadas por eles, sendo que 4 delas estão na região Norte. Os partidos com maior proporção de indígenas são o PP e PSD, que juntos elegeram metade deles, cada um com 25%. Câmara dos vereadores No legislativo municipal, o panorama é um pouco melhor, se comparado com o executivo. Nas eleições de 2016, as candidaturas indígenas aumentaram em 32%. Enquanto o índice de candidatos indígenas do gênero masculino cresceu 21%, as candidaturas de mulheres indígenas subiram 60%.  Entretanto, a taxa de crescimento entre os eleitos avançou apenas 5%. Os representantes indígenas no legislativo municipal estão concentrados principalmente nos Estados do Norte e do Centro-Oeste. O Rio de Janeiro foi o único estado onde não houve indígenas eleitos. O PT também lidera em assentos na câmara, com 12,4% deles, junto ao MDB, que também possui 12,4%. Representatividade LGBT+ De acordo com o relatório, existe maior dificuldade em fazer análises aprofundadas sobre a participação LGBT+ na disputa eleitoral devido à falta de coleta de informações sobre orientação sexual pelo Tribunal Superior Eleitoral (TSE).  Os partidos e os tribunais eleitorais fizeram a atualização de seus cadastros com a autodeclaração relacionada à orientação sexual e identidade de gênero a partir de marcadores não binários. Além disso, apesar de candidaturas trans poderem usar o nome social no registro em 2020, o sistema do tribunal apresenta falhas, pois mostra que pessoas cisgêneras também o fizeram.  Nessa área, a representatividade partidária também é baixa. Infelizmente não é de se surpreender que o Brasil, país onde mais mata pessoas dessa comunidade em todo o globo, onde personalidades políticas como Érika Hilton (PSOL), Duda Salabert (PDT) e Filipa Brunelli (PT) sofrem constante ameaça à vida, demandando reforço na segurança, tenha tão pouca representação da mesma no campo político.   Executivo municipal Foram identificadas somente 10 candidaturas LGBT+ para o poder executivo em 2020, sendo 6 para o cargo de prefeito e 4 para vice. 100% delas são de partidos de esquerda, com 8 do PSTU e 2 do PSOL. Com relação à cor, 6 eram brancas, 3 negras e 1 indígena. No que diz respeito às candidatas trans, foram identificadas apenas duas.   Legislativo municipal Foram identificadas 546 candidaturas LGBT+ para o legislativo municipal, com a eleição de 97 destas. Dos

Política no TikTok

Ive Brussel – No dia 25 de fevereiro, o CONVERSA AO VIVO ZONACURVA contou com a convidada Ive Brussel, que é advogada e comunicadora digital. Com mais de 250 mil seguidores na rede social TikTok, Ive consegue alto engajamento com seus vídeos em que analisa assuntos políticos pelo prisma da esquerda. Participaram da entrevista o editor ZonaCurva Fernando do Valle e Luis Lopes do Portal Vishows. Ela brinca que chegou na plataforma influenciada pelos filhos e que lá “era tudo mato”. Ive explica que começou a produzir conteúdo para se divertir em cima dos trend topics (assuntos mais comentados) e dublagens (populares nessa plataforma digital). Mas, foi após ser inspirada por outras duas mulheres tiktokers como Bruna Volpi (@bruna.volpi) e Natlhalia Camarco (@nathaliacamarco) que ela decidiu adaptar o seu conteúdo e passou a desabafar sobre a conjuntura política. Ive conta que o TikTok é uma das poucas plataformas em que há a possibilidade do usuário baixar o vídeo e compartilhá-lo em outras redes sociais e pelo whatsapp e isso colabora muito no engajamento. Ela lembra que foi em julho de 2020 que ela teve o seu primeiro vídeo viralizado. No vídeo, Ive mostrava sua indignação sobre as ameaças de Bolsonaro a um jornalista, quando o político foi perguntado sobre os depósitos em dinheiro vivo de Fabrício Queiroz na conta de Michelle, sua esposa. Ao não conseguir explicar o caso de corrupção, Bolsonaro gritava como um sociopata que tinha “vontade de encher sua boca de porrada”. Os depósitos continuam sem esclarecimento. Indagada sobre como irá atuar nas eleições deste ano, Ive afirma que não pretende apoiar abertamente um determinado candidato porque um dos seus principais objetivos é furar as bolhas digitais e “virar votos” para os candidatos de esquerda. Segundo a comunicadora digital, é necessário que a esquerda pare de cair em armadilhas da direita e não polemize sobre assuntos de interesse desse campo político. Pois, com isso, os progressistas não colaboram na propagação de mentiras e notícias falsas. Mônica Iozzi discute política com humor em seu novo programa Comunicação: o uatizapi, sozinho, não muda o mundo  

A valorização da mulher numa campanha eleitoral mais preocupada com o passado

por Carlos Castilho Independente de qual seja o resultado das eleições deste ano, dois fenômenos já deixaram a sua marca: a valorização da mulher como protagonista politico e a preocupação de todos os partidos em buscar no passado a solução para os dilemas atuais, ignorando as mudanças que o futuro já está delineando. O eleitorado feminino se tornou o grande objetivo de todos os candidatos, de Bolsonaro até o PSTU, na reta final da campanha eleitoral. É um passo muito importante para a superação do machismo político, mas também é essencial constatar que os partidos e candidatos resolveram correr atrás das mulheres porque dependem hoje do voto delas, mais do que em qualquer eleição anterior. Outra coisa que impressiona quem acompanhou a atual campanha é a preocupante unanimidade dos partidos e candidatos em buscar no passado as soluções para os problemas atuais, bem como a insistência em propostas pontuais ignorando olimpicamente o contexto socioeconômico global marcado pela transição para uma era digital. Jair Bolsonaro apostou num retorno ao século XIX em matéria de autoritarismo, machismo, patriarcalismo, como fórmulas para acabar com o feminismo, com a rebeldia juvenil, a crise causada pelo desemprego, a violência urbana e a insegurança social gerada pelas consequências das inovações tecnológicas. Geraldo Alkmin e os demais candidatos de centro direita basearam suas campanhas presidenciais na glorificação de realizações passadas, como se elas pudessem ser repetidas indefinidamente numa realidade social que muda a cada semana. O Partido dos Trabalhadores (PT), uma sigla que 40% dos brasileiros associam à uma vaga ideia de renovação, propõe uma volta aos bons tempos dos governos de Lula, por meio do slogan “vamos ser felizes outra vez”. Para quem está desempregado ou teve a renda familiar reduzida em até 50% por conta da precarização do trabalho, a promessa de uma volta aos bons tempos é altamente sedutora, mas oculta um embuste. A politica de redistribuição de renda adotada por Lula entre 2002 e 2010 dificilmente produzirá os mesmos resultados porque a conjuntura mundial e nacional mudou. Além disso, o PT também mudou depois de usufruir a comodidade do poder e hoje está mais parecido com os demais partidos do que com a ideia de renovação política que sustentou a explosão de esperanças em 2002. Os dilemas ignorados Os dois fenômenos destacados no início deste texto sinalizam desafios enormes para o período pós-eleitoral e que terão de ser enfrentados sem os holofotes de uma campanha marcada por uma sucessão quase diária de pesquisas de intenção de voto. Os dois fenômenos destacados no início deste texto sinalizam desafios enormes para o período pós-eleitoral e que terão de ser enfrentados sem os holofotes de uma campanha marcada por uma sucessão quase diária de pesquisas de intenção de voto. A valorização eleitoral das mulheres as coloca diante do dilema de assumir um discurso próprio depois da votação. Até agora as candidatas inscritas pelos diferentes partidos adotaram, ao pé da letra, o discurso masculino na hora de se apresentar ao eleitorado. É um desafio enorme porque ainda não existe uma cultura política feminina, que priorize, sem dependências, o universo social das mulheres. Marina Silva deixou-se envolver pela cultura politica masculina, perdendo a imagem de mulher não contaminada pela politicagem tradicional e que seduziu tantos eleitores e eleitoras nos pleitos presidenciais de 2010 e 2014. A primeira ministra britânica Thereza May e a alemã Angela Merkel, fazem o gênero masculinizado na politica e pouco agregam à diversificação de gêneros no exercício do poder. Jacinda Ardern, a primeira ministra da Nova Zelândia, talvez seja um raro exemplo de comportamento público capaz de gerar novas perspectivas para o desenvolvimento da cultura politica feminina. O outro fenômeno que marca a atual campanha eleitoral brasileira é a omissão de partidos e candidatos no enfrentamento dos desafios que a era digital já está colocando para todos nós. O caso do desemprego é emblemático. Todos os candidatos presidenciais prometem criar novos empregos em massa. Henrique Meirelles diz ter uma fórmula para criar 10 milhões de novas vagas de trabalho, ignorando o fato de que o desemprego hoje deixou de ser apenas o resultado de uma gestão econômica desastrosa para se tornar a consequência da introdução de tecnologias baseadas na automação eletrônica. A substituição da mão de obra baseada na atividade física é inevitável numa economia começa a ser movida por robôs computadorizados e funcionando em rede pela internet. É um embuste prometer a devolução de empregos, quando tudo aponta na direção de uma mão de obra qualificada tecnologicamente. Nenhum candidato ousou penetrar no complexo terreno da reeducação de trabalhadores, um processo que onde o estado tem um papel fundamental já que as empresas só pensam em racionalizar a produção para sobreviver na transição de modelos de negócio. A obsessão pelo imediatismo Segurança, educação e saúde são outros temas onde os candidatos simplesmente ignoraram a realidade para alimentar, entre os eleitores, a ilusão de soluções rápidas. Todos eles preferiram o mantra da compra de armamentos, contratações e racionalização gerencial dos efetivos policiais, ignorando que a desigualdade social e econômica gera uma desproporção exponencial entre a proliferação de delinquentes e o aprimoramento do aparelho repressivo. A questão da segurança pública pode ser reduzida a uma equação bem conhecida dos policiais. É impossível colocar um guarda em cada esquina, 24 horas por dia, porque isto acabaria com o orçamento municipal ou estadual. Para sentir-se mais segura, a população teria que pagar impostos muito mais elevados e mesmo assim seria utópico pensar numa segurança total, num país onde a desigualdade social e econômica funciona como uma máquina de produzir delinquentes. O que a polícia pode fazer é identificar os chefes dos grupos criminosos e prendê-los. A população é que tem meios para prevenir e neutralizar a delinquência de rua, o assaltante de ocasião, sem que isto signifique legalizar a justiça com as próprias mãos. O medo de discutir temas complexos com o eleitorado levou os partidos e candidatos e evitar o debate sobre a necessidade do envolvimento direto da população na busca de soluções também para educação