Zona Curva

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A face invisível dos rolezinhos

Vendo o quanto tantos ficaram na superfície do fenômeno dos rolezinhos– mobilização de jovens moradores de áreas periféricas em shopping centers do Rio e São Paulo – surfando na crista da onda sem ousar um mergulho mais profundo, vale refletir a questão sob a ótica não apenas do consumo, mas sob as faces políticas da excludente ideologia do Consumo e da crítica à Sociedade do Espetáculo. É inevitável partir da constatação de que a horda excluída também quer fazer valer o direito ao prazer do fascínio produzido em série e poder desfilar o glamour das marcas e seus mil e um acessórios “trade company” nestes templos das mercadorias ou “bunkers” do consumo. Não se dá conta de constituir-se uma espécie de subproduto da sociedade da abundância aparente (a sublimar seu viés proletarizante) – que nos transveste, excita e captura. Não há o que estranhar no dilema de setores da elite nacional frente ao mais anarquista dos atos da contemporaneidade à brasileira. Impossível de camuflar, tal “estratégia de libertação urbana” evidencia uma nova forma da luta de classes, em pura e, ao mesmo tempo, bruta discriminação econômica, social, étnica e até estética. Ao judicializar os encontros dessa juventude, orquestrados via redes sociais, sem identificar como capitalizá-los, criminaliza-se a pobreza. Não é meramente o espaço privado e supostamente público que se pretende interditar à circulação dos coletivos de jovens pobres e negros no universo refrigerado do império da moda: é o próprio território urbano de áreas nobres que se converte em locais de acesso proibido, em evidente segregação social, sob repaginado “apartheid”. Os rolezinhos, do mesmo modo, invertem a seta da gentrificação (enobrecimento) em voga. Contra a mentalidade escravocrata ainda reinante, a “nova senzala” vinda das periferias quer desfrutar o sabor da “coca-cola, subway e Mcs” na Casa Grande. As meninas sacolejam bolsas assinadas por Louis Vuitton. Os garotões trazem gravada a moda surf na camiseta Mahalo e a estampar nos bonés: “fuck you”. Desembolsam suas rendas a caminhar firmes sobre Nikes, Adidas, Asics, Olympikus, indiferentes à farta exploração da mão de obra – na Índia, Paquistão ou China – embutida na produção de tais mercadorias. “Ama teu rótulo como a ti mesmo”, sim, Joyce, diriam em paródia à estipulação cristã. MC Guime, ídolo do funk ostentação, em sua verdadeira ode ao consumo: Mas, ao levar o desejo a sobrevoar as asas da história, o que os “rolezinhos” denotam é uma desesperada e ingênua busca de visibilidade que, afinal, atenta contra a ordem e a assepsia da mentalidade burguesa pretensamente hegemônica, no equívoco de que o acesso ao shopping constitua-se em acesso à cidadania. Criados sob a segurança e a facilidade de encontrar tudo no mesmo lugar, aliando os conceitos de modernidade e progresso, os shoppings converteram-se desde meados dos anos 1980 em locais privilegiados para compras e lazer. O modelo foi importado dos Estados Unidos e implantado nas cidades brasileiras sob os mesmos critérios e contornos da origem. Seus proprietários, geralmente, são grandes grupos de investidores, construtoras ou holdings. O maior é o Aricanduva, em São Paulo, com 425 mil m². No Rio, o Center Norte tem 245.028 m². Na Bahia, o Salvador Shopping tem 82.500 m². Em 2013, as vendas do setor cresceram 10,65% e o faturamento alcançou R$ 119,5 bilhões. Em 2012 havia 495 shopping no país, quando apresentaram uma circulação média de 398 milhões de visitantes mensais. Novos 38 empreendimentos foram inaugurados em 2013, outros 40 estão previstos para 2014, segundo a Associação Brasileira de Shopping Centers. O setor contempla cerca de 900 mil empregos diretos. Sem dispor de capital cultural, acesso a espaços de lazer, oferta de empregos e serviços públicos dignos, notadamente em educação e saúde, isto é, frente à ausência do estado, essa parcela de jovens a irromper em rolés segue entorpecida pelos efeitos sedutores e ilusionistas da publicidade. Todavia, de modo inequívoco, os pobres já estão inseridos na lógica dos centros comerciais: Constituem o corpo de serviçais encarregados da faxina dos corredores, toaletes e na segurança terceirizada. Paciência, Hamlet, agora, “to be or not to be, that is the fashion”. Albenísio Fonseca é jornalista Jovens indignados de Alphaville organizam movimento

Jovens indignados de Alphaville organizam movimento

Com peitos estufados sob camisetas Abercrombie e Hollister, jovens integrantes do movimento Alphaville em Itaquera criam polêmica. Organizado pela elite paulista, a iniciativa tem sido considerada uma reação de jovens bem nascidos aos recentes acontecimentos em shoppings. Leia texto da página do evento organizado pelo movimento em uma rede social:  “No próximo domingo, às 17h, no Shopping Itaquera, Alphaville irá invadir a periferia. Em plenas férias, não conseguimos nem almoçar com a galera no Outback. Temos que reagir! O ponto de encontro será na portaria do Clube Paulistano. Contra a invasão de nossos shoppings pelas classes C, D, E ou Z!” O mentor do Alphaville em Itaquera é P. A. M., de 17 anos, herdeiro de uma rede de franchising de lavanderias e prefere não ser identificado. Na entrevista realizada em restaurante da rua Amauri, ele conta como surgiu a ideia: “Tomava uma caipirinha de kiwi com amigos na piscina do Paulistano e o papo descambou para a situação insustentável que estamos vivendo: você acredita que eu encontrei o filho de meu motorista no corredor do Shopping JK Iguatemi. Constrangedor! Criamos a página em poucos minutos com nossos Iphones 5 .” Na página do evento, foram convidadas 3 mil pessoas e 1,5 mil confirmou presença. P.A.M afirmou que recebeu apoio de parentes, vizinhos e colegas, mas vários de seus amigos não compareceram ao protesto já que estão em viagem de férias em resorts em praias do Nordeste e Punta del Este. Procurado pelo Zonacurva, colunista de revista de circulação semanal que recentemente escreveu que “Miami é a América Latina que deu certo” declarou apoio ao movimento. E completou: “confesso que sinto um certo alívio com a revolta desses jovens idealistas, demorou, mas chegou em boa hora!” Nossa reportagem recebeu autorização para acompanhar o movimento em sua visita ao Shopping Itaquera com a promessa de não fotografarmos a mobilização: Os sapatênis nos pedais aceleravam o comboio de Mercedes, Audis e Range Rovers na avenida Radial Leste e chamava a atenção da população. Na chegada ao shopping, muitos revoltaram-se com a ausência de valet no estacionamento. Pelos corredores, ouviam-se os gritos em coro da manifestação: “AH, URRÚ, Itaquera é nossa”, “Alphaville não é Barueri, não vamos sair daqui”. Os seguranças do shopping ignoraram a manifestação e alguns lojistas declararam sua solidariedade ao movimento. O cordão dos hipócritas