Unasul: golpeada a proposta de um bloco na América Latina

por Elaine Tavares A generosa ideia de Hugo Chávez, inspirada em Bolívar, de criação da União das Nações Sul-americanas (UNASUL) está se esboroando. Com a decisão de Argentina, Brasil, Chile, Colômbia, Peru e Paraguai de saírem da organização, a construção de um bloco de poder autônomo e soberano perde força. E, perdendo força, cresce o poder dos Estados Unidos sobre os países do sul, voltando, mais uma vez, a proposta de recolonização da “américa baixa”. Tudo isso com o apoio incondicional das classes dominantes de cada país, sempre dispostas a trair os interesses da maioria da população em nome de ganhos pessoais e/ou de seus parceiros. Não é sem razão que países como Brasil e Paraguai sofreram golpes, e a Argentina tenha se rendido outra vez ao neoliberalismo. Colômbia, Peru e Chile  sempre foram países parceiros dos EUA e só estavam na Unasul enquanto foi benéfico para eles no campo econômico e comercial. Agora, com o ataque sistemático ao governo de Nicolás Maduro, os governos desses países resolveram assumir o lado dos EUA e buscam enfraquecer a proposta da construção de uma América Latina forte. Setembro de 1815 – Simón Bolívar está na Jamaica, exilado, depois de ter tentado – e fracassado – libertar a Venezuela do domínio espanhol. Ele pensa sobre o destino de todos os viventes dessa grande América, então ainda sob o jugo da colônia. É quando escreve sua famosa Carta da Jamaica, na qual propõe a ideia da união de todo o continente: “É uma ideia grandiosa e pretender formar de todo o mundo novo uma só nação, com um só vínculo, que ligue suas partes entre si e com o todo. Já que têm uma mesma origem, uma mesma língua, mesmos costumes e uma religião, deveria, por conseguinte, ter um só governo que confederasse os diferentes Estados que haverão de formar-se”. E acrescenta: “Eu desejo mais do que qualquer outro ver formar na América, a mais grande nação do mundo, menos por sua extensão e riquezas, que por sua liberdade e glória…” Depois dessa missiva, na qual os sonhos são explicitados, Simón volta para a América do Sul e recomeça sua luta. A independência vira uma realidade. Então, ele decide chamar, em 1826, todos os dirigentes das novas repúblicas que se formam depois das lutas de libertação para um Congresso, no Panamá, no qual proporia a construção real de uma confederação hispano-americana. Na frente de seu tempo, Bolívar sabia que só juntos, os novos países da recém-liberta colônia, poderiam ser soberanos e livres. Nesse congresso estiveram presentes os representantes do México, da Federação Centro-Americana, da Grã-Colômbia (Colômbia, Venezuela e Equador) e do Peru (incluindo então, a Bolívia). Outros se fizeram ausentes: Argentina, Chile, Paraguai, Uruguai, Brasil, Estados Unidos da América e Haiti. A proposta estava a frente do tempo e procurar fortalecer o continente frente às ações imperialistas da Europa e dos Estados Unidos. O congresso propunha a união de todos esses países num grande bloco, a Pátria Grande, para manutenção da paz, segurança coletiva, defesa recíproca e mútua ajuda contra qualquer agressão externa, garantia da independência política e da integridade territorial dos estados membros, solução pacífica das controvérsias internacionais, quaisquer que fossem suas naturezas e origens e codificação do Direito Internacional. A ideia era ter uma Assembleia Geral permanente, que se reuniria de dois em dois anos, funcionando como hoje funciona a OEA (Organização dos Estados Americanos) e o objetivo único era a manutenção da paz e da soberania das nações livres. O Brasil, como governo, sempre esteve fora do debate da soberania da Pátria Grande. Quando as guerras de independência foram travadas na parte espanhola, o Brasil seguia firme com a monarquia e só foi abalado bem mais tarde pela revolução farroupilha, que durou 10 anos, mas acabou sem vitória da república. Ainda que tivéssemos gente brasileira lutando nas guerras de libertação, como foi o caso de Abreu e Lima, esse foi um tema que não chegou à maioria das gentes que vivia na parte portuguesa. Quando Bolívar chamou o Congresso Anfictiônico do Panamá, procurou convidar o Brasil, afinal, era quase um continente incrustrado na América Latina. Só que o Brasil não compareceu. Mas, é bom lembrar que se a monarquia não queria saber de libertação ou união, o povo brasileiro queria. Tanto que em 1817, quando os irmãos hispânicos lutavam por independência explodiu em Pernambuco um movimento republicano, tentando acender uma labareda nacional. Foi aplastado. E foi dali que saiu Abreu e Lima.  No artigo “O Brasil e o Congresso Anfictionico do Panamá”, o professor de Relações Internacionais da UNB,  José Carlos Brandi Aleixo, aponta que outros políticos brasileiros também se manifestaram pela ideia de uma união de nações nos anos que se seguiram a independência. Araújo Carneiro, Almirante Rodrigo Pinto Guedes, Silvestre Pinheiro Ferreira, José Bonifácio de Andrade e Silva foram alguns que se preocuparam com a defesa nacional e a necessidade de unir forças com os países vizinhos para enfrentar a Europa e o império nascente que representava os Estados Unidos. Em 1822 José Bonifácio escrevia: “…. o mesmo Senhor [ Príncipe D. Pedro ], como Regente do Brasil, não deseja nem pode adotar outro sistema que não o Americano, e se acha convencido de que os interesses de todos os Governos da América, sejam quais forem, devem se considerar homogêneos, e derivados todos do mesmo princípio, ou seja: uma justa e firme repulsa contra as imperiosas pretensões da Europa”. Por isso havia uma pré-disposição no Brasil ao chamado de Bolívar. Toda a diplomacia agia no sentido de garantir a participação no Congresso e Dom Pedro I chegou a destacar o Visconde de Inhambuque de Cima ( Pereira da Cunha) para representar o Brasil. Todavia, o Brasil acabou não indo. Muitas podem ter sido as razões. Há quem diga que foi porque o debate estaria centrado nas repúblicas, e o Brasil seguia monárquico. Havia disputa entre Brasil e Argentina pelo Uruguai e os governos talvez temessem essa discussão. O fato é que ficou de fora e não absorveu toda a riqueza do debate