Zona Curva

Vladimir Herzog

Relatório da FENAJ alerta para as ameaças á liberdade de imprensa no Brasil

Sem dúvida, a liberdade de imprensa não é assunto resolvido no Brasil. Segundo o relatório Ataques ao Jornalismo e ao seu Direito à Informação da Federação Nacional de Jornalistas (Fenaj) e do Observatório da Ética Jornalística OBJETHOS  houve 430 ataques à imprensa só em 2021. Censura e descredibilização são as duas estratégias mais utilizadas para hostilizar jornalistas, seguidas por agressões verbais/ataques virtuais, intimidações/ameaças e agressões físicas. Dos 430 ataques, 147 partiram do presidente Bolsonaro, fazendo dele o responsável pelo maior número de agressões a jornalistas no período. Desde a ascensão de Bolsonaro a certo protagonismo no cenário político em meados de 2017, o número de casos de jornalistas atacados cresce a cada ano. O coordenador do Observatório de Liberdade de Imprensa do Conselho Federal da Ordem dos Advogados do Brasil, Pierpaolo Cruz Bottini, conforme divulgou o relatório, relatou que a intimidação de jornalistas, o estímulo ao ódio e a aceitação de atitudes agressivas são formas de limitar a circulação de informações e conhecimento, itens essenciais para a construção da democracia. Os ataques aos jornalistas viraram corriqueiros, o que contribui para a banalização e normalização desses assédios. Segundo a Organização Internacional do Trabalho, toda pessoa deve ter direito ao trabalho decente, o que deveria ser assegurado por condições de liberdade, equidade, segurança e dignidade humana. Uma jornada de trabalho digna abarca remuneração e jornada adequadas, estabilidade, segurança física, equilíbrio com a vida familiar e proteção social. Todavia, isso não está garantido para os trabalhadores do âmbito jornalístico, ainda segundo o relatório da Fenaj: os profissionais são mal remunerados, são expostos a riscos de violência dentro e fora das redes digitais, trabalham em ambientes inseguros e se sentem exaustos. O Observatório de Jornalistas Assassinados da Unesco afirma que, entre de 2016 e 2020, cerca de 400 profissionais foram mortos por causa do seu trabalho ou enquanto exerciam sua profissão. A liberdade de imprensa é um direito previsto na Declaração Universal dos Direitos Humanos, de 1948, mais precisamente no artigo 19, que diz: “todo ser humano tem direito à liberdade de opinião e expressão; esse direito inclui a liberdade de, sem interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras”. E também na Constituição Brasileira, presente no artigo 5°. Dia da Liberdade de Imprensa no Brasil Todo dia 7 de junho é o Dia da Liberdade de Imprensa no Brasil, a data foi instituída em plena ditadura. Foi em 1977 durante o governo de Ernesto Geisel que mais de 3 mil jornalistas assinaram um manifesto exigindo o fim da censura e a liberdade de imprensa. Dois anos antes morria Vladimir Herzog, executado no porão do DOPS, em 1975. Saiba mais no texto Zonacurva sobre Herzog: A morte de Vladimir Herzog e o Brasil que não queremos Foi um ato de coragem da classe, considerando que a história da censura à imprensa no Brasil começou muito antes de 1964. Durante a Velha República já havia censores nas redações, a Era Vargas instituiu o Departamento de Imprensa e Propaganda (DIP) e só houve permissão para a impressão de jornais ou periódicos no país após a chegada da Família Real em 1808. Karl Marx e a Liberdade de Imprensa

A morte de Vladimir Herzog e o Brasil que não queremos

Bem-vindo ao Fatos da Zona, onde adaptamos icônicos textos do site do Zonacurva Mídia Livre. Explore a extraordinária vida de Vladimir Herzog, ícone da luta pela justiça e liberdade no Brasil durante a ditadura militar. Neste vídeo, mergulhamos nos momentos cruciais de sua trajetória e em seu compromisso incansável com a verdade e a democracia.   por Fernando do Valle Vladimir Herzog – Noite de 24 de outubro de 1975, agentes da ditadura chegam à redação da TV Cultura com a ordem de levar o diretor de jornalismo da TV Cultura, Vladimir Herzog, para depor sobre suas ligações com o PCB – Partido Comunista Brasileiro no II Exército. Iniciou-se ali uma negociação entre os jornalistas da redação e os agentes para que Herzog se apresentasse no dia seguinte. Os policiais aceitaram o acordo e um jornalista comprometeu-se a acompanhar Herzog no outro dia até as instalações militares, esse jornalista inclusive dormiu na casa do diretor da TV Cultura. Se tivesse descumprido esse acordo e escapado na madrugada, Herzog não teria sido torturado até a morte no dia 25 de outubro de 1975, ele tinha apenas 38 anos. A brutal morte do jornalista indignou parte da sociedade civil contra o regime e tornou Herzog símbolo da liberdade de pensamento e de imprensa no país. A nomeação de Herzog como diretor do canal de televisão pública do Estado de São Paulo pelo secretário de Cultura José Mindlin foi aprovada pelos órgãos de segurança do regime militar e pelo governador Paulo Egydio antes de sua contratação. Mesmo assim, a chamada linha dura do governo militar fazia campanha com a conhecida cantilena de “infiltração esquerdista” contra a equipe liderada por Herzog através do jornalista Claudio Marques, do Shopping News, praticamente porta-voz dos setores de informação do governo. LEIA TAMBÉM “10 músicas contra a ditadura militar”  Vladimir Herzog nasceu Vlado Herzog em 27 de junho de 1937 em Osijek, hoje a quarta maior cidade da Croácia e morreu há 40 anos, em 25 de outubro de 1975. O apoio da grande mídia ao golpe de 64 O momento político da morte do jornalista foi marcado por uma disputa pelo poder entre a linha dura do exército e setores da ditadura que pretendiam estabelecer certo diálogo com a sociedade civil. Três meses depois de Herzog, em janeiro de 1976, o metalúrgico Manoel Fiel Filho também foi assassinado pelo governo e o ditador Geisel destituiu o comandante do II Exército, general Ednardo D’Ávila Mello, um dos principais líderes da chamada linha dura entre os militares. Políticos também insuflavam os militares da linha dura para a perseguição aos jornalistas da TV Cultura. O deputado da ARENA (partido do governo), José Maria Marin, que atualmente está preso na Suíça por corrupção como dirigente de futebol, pediu um aparte ao discurso do deputado do mesmo partido, Wadih Helu, futuro presidente do Corinthians, na Assembleia Legislativa de São Paulo e exigiu “providências aos órgãos competentes em relação ao que está acontecendo no canal 2 [TV Cultura…]”, que, segundo ele “sofria infiltração de elementos comunistas”. Este blog já abordou a trajetória da triste figura José Maria Marin. Episódio narrado no livro Bendito Maldito, ótima biografia de Plínio Marcos escrita por Oswaldo Mendes, mostra o nível da truculência dos militares. O diretor Ademar Guerra enfureceu um coronel ao escalar o “subversivo” Plínio como São Francisco de Assis em um teleteatro produzido na TV Cultura. Guerra relembra o tumulto naquele 24 de outubro no departamento de jornalismo da emissora: “o clima era de muito medo”. No meio desse clima de incerteza, ele lembra no livro que “alguém disse que um coronel do 2º Exército tinha telefonado à minha procura”. O diálogo de Guerra com o coronel: – Por que o senhor está fazendo a história de São Francisco? – Porque é uma história bonita, a história de um santo… – Mas é perigoso… – O que há de perigoso na história de um santo, coronel? Quer que eu mande o texto para o senhor ler? – Não quero ler nada, não.  Ademar Guerra escapou da brutalidade que vitimou Herzog. O jornalista Leandro Konder, amigo do jornalista assassinado e também detido pelos militares, não e também foi torturado. Ele relata o sofrimento de Vlado nas mãos dos torturadores do DOI-CODI (Destacamento de Operações de Informações – Centro de Operações de Defesa Interna): “podíamos ouvir nitidamente os gritos, primeiro do interrogador, depois, de Vladimir, e ouvimos quando o interrogador pediu que lhe trouxessem “pimentinha” [máquina de choques elétricos para tortura] e solicitou ajuda de uma equipe de torturadores. Alguém ligou o rádio e os gritos de Vladimir confundiam-se com o som do rádio. Lembro-me bem que durante essa fase, o rádio dava notícia de que Franco [ditador espanhol] havia recebido a extrema-unção, e o fato me ficou gravado, pois naquele mesmo momento Vladimir estava sendo torturado e gritava. A partir de um determinado momento, o som da voz de Vladimir se modificou, como se tivessem introduzido coisa em sua boca; sua voz ficou abafada como se lhe tivessem posto uma mordaça. Mais tarde, os ruídos cessaram” (trecho do depoimento de Leandro Konder no livro “Brasil nunca mais”).   Não satisfeitos, os agentes da ditadura forjaram a cena de um suposto suicídio de Vlado “em um surto de arrependimento”, a foto divulgada pelos órgãos de repressão ainda mostra um bilhete rasgado com “a confissão de seu envolvimento com os comunistas”. Amigos, familiares e a comunidade judaica não aceitaram a inverossímil versão do governo sobre a morte do jornalista, que era judeu, e o enterraram no centro da Sociedade Cemitério Israelita. Pela tradição dos judeus, os suicidas são enterrados em uma área específica. A imprensa alternativa teve papel importante para desmontar a versão oficial do governo. O jornalista Mylton Severiano relata no documentário Resistir é Preciso como ele, Narciso Kalili e Hamilton Almeida Filho produziram uma detalhada matéria de 8 páginas sobre o assassinato de Vlado para o jornal EX-. O título foi retirado do Hino à República: “Liberdade Liberdade abre as asas sobre nós”. A edição de 50 mil exemplares esgotou

A resistência de jornalistas na ditadura

O curta-documentário Imprensa Paulista na Ditadura (1964-1985) dá voz a algumas figuras do jornalismo paulista, como Raimundo Rodrigues Pereira e Bernardo Kucinski, que sofreram nas redações os anos de chumbo da Ditadura Militar. Produzido pelos alunos do curso de comunicação da FITO (Faculdade Instituto Tecnológico de Osasco), o vídeo demonstra o interesse de jovens estudantes na história de resistência de abnegados jornalistas contra o arbítrio e censura do regime de exceção. O esforço dos estudantes nos faz ignorar a locução amadora do vídeo. Entrevistado pelos estudantes, o professor da ECA-USP Bernardo Kucinski é autor de profundo estudo sobre a imprensa alternativa na época. No livro Jornalistas e Revolucionários, Kucinski escreve: “a imprensa alternativa surgiu da articulação de duas forças igualmente compulsivas: o desejo das esquerdas de protagonizar as transformações institucionais que propunham e a busca, por jornalistas e intelectuais, de espaços alternativos à grande imprensa e à universidade. É na dupla oposição ao sistema representado pelo regime militar e às limitações à produção intelectual-jornalística sob o autoritarismo, que se encontra o nexo dessa articulação entre jornalistas, intelectuais e ativistas políticos”.   O apoio da grande mídia ao golpe de 64